Direito Civil Atual

Cultura jurídica nacional é resgatada na Faculdade de Direito do Recife

Autor

  • Humberto João Carneiro Filho

    é doutorando em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco professor de Direito Civil da Faculdade de Direito do Recife (UFPE) coordenador do Projeto Memória Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife e Defensor do Vínculo no Tribunal Regional Eclesiástico e de Apelação de Olinda e Recife.

19 de dezembro de 2016, 7h01

Em nossa primeira contribuição para a Coluna Direito Civil Atual, apresentamos uma iniciativa de conservação e divulgação do patrimônio de parcela da cultura jurídica brasileira executada na Faculdade de Direito do Recife da Universidade Federal de Pernambuco, Instituição que integra e é uma das fundadoras da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo. Cuida-se do Projeto Memória Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife (FDR).

Considerando a secular tradição da Faculdade de Direito do Recife na formação de juristas e intelectuais no Brasil, assim como o acervo bibliográfico de obras raras de sua preciosa Biblioteca, desde o início do presente ano, o citado projeto vem sendo desenvolvido, visando a integrar o ensino, a pesquisa e a extensão por meio de atividades que culminem na preservação e divulgação da memória institucional e acadêmica da FDR constantes da Coleção Especial da Biblioteca do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

O projeto é coordenado por este colunista, contando ainda com a importante colaboração de estudantes bolsistas e voluntários dos Cursos de Direito e de História da UFPE, além de servidores técnico-administrativos responsáveis pelo apoio às diversas atividades desenvolvidas.

O projeto intenciona contribuir para a divulgação de obras produzidas desde o século XIX no âmbito do Curso Jurídico de Olinda (até 1854) e da Faculdade de Direito do Recife, realizando, assim, o resgate de uma importante parcela da tradição (ou tradições) e cultura jurídica nacionais influenciadas em maior ou menor grau pelas ideias que permeavam a Faculdade.

Como a proposta central do projeto é a conservação da memória jurídica da FDR, algumas etapas são necessárias para a execução de seus objetivos, sobretudo pelo fato de que a maior parte das obras sofre um processo intenso de degradação devido ao tempo e às suas condições de seu secular armazenamento. A complexidade das tarefas que conduzem ao resultado final (divulgação das obras digitalizadas em plataforma em sítio da internet[1]) exige o manejo de cada obra em diversas fases, quais sejam: pesquisa e seleção de títulos na Biblioteca de Obras Raras da Faculdade — considerando a relevância de seu autor — higienização e tratamento das obras selecionadas, acondicionamento e catalogação, e, por fim, a digitalização e disponibilização dos títulos em plataforma digital.

A etapa da pesquisa, que leva em consideração a necessidade de situar cada autor no momento histórico em que a obra foi produzida, procura evidenciar influências culturais e intelectuais que auxiliem a compreensão do relevo de cada trabalho. Com o avançar do processo de pesquisa, ocorre a seleção das obras (livros, folhetos e compêndios) que sertão digitalizados. O procedimento de higienização e de acondicionamento das obras é etapa técnica supervisionada pelo Laboratório de Restauro de Obras Raras da Faculdade de Direito do Recife, antecedendo a digitalização e que possui por desígnio principal retardar os efeitos deletérios causados às obras pelo tempo, por micro-organismos e pelo clima.

Tendo como fonte basilar o trabalho de Clóvis Beviláqua, História da Faculdade de Direito do Recife[2], o projeto já conseguiu mapear uma gama de obras inicialmente utilizadas pelos lentes da FDR no século XIX que produziram seus próprios manuais, compêndios, preleções etc, seguindo, inicialmente, as diretrizes dos Estatutos do Visconde de Cachoeira de 1825.

O resgate realizado pelo projeto já inclui obras de renomados juristas do século XIX, por vezes, os primeiros compendiadores das matérias de Direito tratadas nas disciplinas (então denominadas “cadeiras”) cujos trabalhos são reflexo da necessidade formação de uma identidade e pensamento jurídicos “nacionais”. Na disciplina de Direito Privado, o projeto já dispõe no seu acervo já digitalizado obras como: Resumo das Lições de Legislação Comparada sobre o Direito Privado (1893), de Clóvis Beviláqua; O Casamento Civil e o Casamento Religioso (1859), de Brás Florentino Henriques de Souza.

Na área de Direito Comercial, encontram-se disponíveis os trabalhos: Compêndio de Teoria e Prática do Processo Civil comparado com o Comercial e de Hermenêutica Jurídica (Edições de 1898 e 1910), Compêndio de Teoria e Prática do Processo Civil comparado com o Comercial (1872), de Francisco de Paula Baptista.

Para a cadeira de Direito Romano já foram digitalizados e disponibilizados: Elementos de Direito Romano (1883), de Barros Guimarães e o Curso Elementar de Direito Romano (1888), por Pinto Junior. E, em História do Direito, o Compêndio de História Geral do Direito (1898), de Izidoro Martins Junior.

Estando ainda no primeiro ano de sua execução, o Projeto Memória Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife procura atentar para a necessária indissociabilidade entre o ensino, a pesquisa e a extensão. Muitas das vezes, na prática docente e ações diversas, os resultados e discussões resultantes das pesquisas e trabalhos realizados no âmbito do Projeto são compartilhados com os discentes da própria universidade e público externo, como pesquisadores interessados na História do Direito no Brasil e da própria Faculdade de Direito do Recife.

Com o propósito de divulgar o resultado parcial de seus trabalhos, o Projeto promoveu a exposição Ensino Compendiário no Curso Jurídico Pernambucano Oitocentista no mês de agosto de 2016, por ocasião do aniversário da Criação dos Cursos Jurídicos e em parceria com a Escola Superior de Advocacia da Seccional de Pernambuco da OAB, apresentando ao público em geral algumas das obras selecionadas, higienizadas, digitalizadas e acondicionadas no contexto das atividades do projeto.

Outro exemplo das ações já realizadas pelo projeto é a manutenção de página eletrônica, ainda em construção e constante atualização, para divulgação dos citados produtos das tarefas desenvolvidas. É possível acessar o acervo das obras raras já digitalizadas pelo projeto, seus sumários – que facilitam o acesso do pesquisador ao conteúdo da obra – e conferir biografias de alguns de seus autores. Como já esboçado, o sítio eletrônico mostra-se como um importante aliado dos pesquisadores que estudam sobretudo a questão do resgate das ideias jurídicas do século XIX, bem como, para além do domínio do Direito, os que têm interesse na História do Brasil no século XIX.

A iniciativa procura, assim, situar-se no contexto da universalização do acesso à histórica produção intelectual da Faculdade de Direito do Recife, colaborando para a conservação do seu acervo histórico, patrimônio de todos os brasileiros. Aos pesquisadores e público em geral interessados, lançamos o convite para que visitem o site do projeto, ainda em construção, no endereço www.ufpe.br/memoriafdr. As críticas, sugestões e pedidos de informações complementares são bem-vindos e podem ser encaminhados para o e-mail [email protected].

*Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Porto, Girona, UFMG, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC, UFBA e UFMT).


[1] http://www.ufpe.br/memoriafdr
[2] BEVILAQUA, Clóvis. História da Faculdade de Direito do Recife. 3. ed. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2012. 682 p.

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    é doutorando em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, professor de Direito Civil da Faculdade de Direito do Recife (UFPE), coordenador do Projeto Memória Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife e Defensor do Vínculo no Tribunal Regional Eclesiástico e de Apelação de Olinda e Recife.

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