Soberania desrespeitada

MP-SP tenta reverter decisão que anulou condenações pelo massacre do Carandiru

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16 de dezembro de 2016, 18h28

O Ministério Público de São Paulo apresentou, nesta sexta-feira (16/12), dois recursos ao Tribunal de Justiça de São Paulo pedindo a revisão da decisão da corte que anulou as condenações dos 74 policiais militares acusados de serem os responsáveis pelo massacre do Carandiru. Nas peças, pede a admissão dos questionamentos e envio ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça.

Os recursos foram interpostos pelo procurador-geral de Justiça, Gianpaolo Smanio, e pelas procuradoras Jaqueline Mara Lorenzetti Martinelli (do setor de Recursos Extraordinários) e Sandra Jardim (da Procuradoria Criminal). No pedido endereçado ao Supremo, o MP-SP argumenta que a soberania do júri popular foi desrespeitada pelo TJ-SP.

A anulação do júri se deu após recurso dos PMs contra decisão que impunha a eles o cumprimento da pena em regime fechado. Ao retirar a eficácia do entendimento do colegiado, a corte paulista afirmou que o grupo decidiu totalmente contra as provas dos autos. Argumentou também que os PMs não poderiam ser condenados, pois suas condutas não foram individualizadas.

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Em outubro de 1992, a Polícia Militar de São Paulo matou 111 presos no Carandiru.
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No julgamento, o relator do caso e presidente da 4ª Câmara Criminal do TJ-SP, desembargador Ivan Sartori, votou pela absolvição dos réus, mas foi vencido nessa questão. Ex-presidente do TJ-SP, ele entendeu que não houve massacre, pois os policiais, na maioria, agiram em legítima defesa, seguindo ordens de seus superiores na hierarquia militar. 

Já o revisor do caso, desembargador Camilo Léllis, declarou que a ação policial passou do limite. “O excesso não se pode negar: 111 presos mortos, nenhum policial.” Mesmo assim, ele concordou em parte com o relator e disse que, como três PMs foram absolvidos e não há prova clara demonstrando a responsabilidade de cada réu, as condenações foram “contrárias às evidências dos autos”. Por isso, é necessário novo Tribunal do Júri.

Na sessão da 4ª Câmara, o Ministério Público argumentou que todos os acusados concorreram para o cometimento dos homicídios. Já a defesa afirmou que houve confronto e que a acusação não individualizou as condutas dos policiais militares na denúncia e, assim, o veredicto condenatório não poderia prevalecer.

No recurso ao STF, o MP-SP explica que os jurados do julgamento anulado apenas seguiram a versão da acusação. Cita ainda decisões da própria corte sobre a impossibilidade de as decisões do júri serem anuladas. “A Corte Suprema decidiu em diversos precedentes que a apelação nas decisões do júri tem natureza restrita e, por isto, não devolve à Justiça togada o conhecimento integral da causa, mas apenas nos limites dos termos postos no inconformismo.”

“Não pode o Tribunal ad quem substituir-se ao órgão constitucionalmente competente para condenar ou absolver. Em observância à soberania dos veredictos poderá, tão somente, nas hipóteses legais destinadas à garantia dos também constitucionais princípios da segurança jurídica e duplo grau de jurisdição, anular o julgamento, possibilitando nova decisão pelo Tribunal do Júri”, complementa o MP-SP.

STJ
No Recurso Especial dirigido ao STJ, o MP-SP pede que a decisão do TJ-SP seja revertida por ferir o artigo 29 do Código Penal. O dispositivo trata da condenação de réus que tenham concorrido para um homicídio.

O MP-SP ressalta na peça que, ao anular a decisão do júri, a corte paulista não debateu o artigo 29 “à luz da conceituação dos crimes multitudinários e da denúncia por participação englobada”, muito menos discutiu os artigos 155, 167, 182 do Código de Processo Penal, “que admitem a formação da convicção do julgador pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial”.

O órgão também reclama de que a 4ª Câmara não esclareceu quais foram os motivos para afastar a aplicação dos artigos 155, 167, 182 mesmo depois de apresentados Embargos de Declaração. “Não se imputou aos acusados a autoria da execução direta dos homicídios verificados, mas, sim, o concurso no massacre ocorrido”, reafirma o MP-SP.

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