Delação para empresas

AGU e CGU assinam portaria para regulamentar rito para acordo de leniência

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15 de dezembro de 2016, 11h59

A Advocacia-Geral da União e a Controladoria-Geral da União assinaram nesta quinta-feira (15/12) uma portaria interministerial para regulamentar a participação da União em acordos de leniência. A regra prevê a criação de uma comissão de emissários das duas pastas para celebrar os acordos, que serão coordenados pela Secretaria-Executiva da CGU.

De acordo com a AGU, Grace Fernandes Mendonça, a portaria foi assinada para dar rapidez às negociações e para garantir a participação de advogados da União desde o início das tratativas. Ela regulamenta a Lei Anticorrupção, que previu o acordo pela primeira vez na legislação brasileira.

A nova portaria cria também um roteiro para os acordos. Pelo que está previsto na nova regra, a empresa que quiser fazer um acordo deve procurar a CGU, que fica obrigada a informar a AGU assim que receber a proposta de acordo. Depois, é feito um “memorando de entendimentos” e é criada uma comissão de funcionários das duas pastas para tocar as negociações.

O texto prevê que a comissão deve ser formada por no mínimo dois servidores da CGU e um da AGU. Segundo o secretário-executivo da CGU, Wagner Rosário, o rito previsto pela portaria já tem sido obedecido nos acordos em andamento. Quanto às comissões, elas costumam ter dois dois a quatro membros da CGU e um ou dois da AGU, contou.

A CGU informou nesta quinta que há 20 acordos de leniência em andamento, dos quais 12 fazem parte da operação “lava jato”, que investiga corrupção na Petrobras. O ministro-chefe da CGU, Torquato Jardim, disse que há cinco acordos bem encaminhados, mas que ainda são sigilosos.

O anúncio da portaria foi feito nesta quinta, em entrevista coletiva depois da assinatura dos ministros. A nova regra não prevê a participação do Ministério Público Federal e nem do Tribunal de Contas da União, embora eles venham participando ativamente tanto dos acordos de leniência quanto das negociações.

Segundo o ministro Torquato Jardim, a participação deles fazem parte de planos futuros. “A portaria é o primeiro passo. O segundo passo é encontrar uma forma legal e técnica para prever a participação do TCU nos acordos”, disse Torquato. Quanto à participação do MPF, o ministro disse que “está pendente”, pois “há um conceito muito forte de independência funcional”, disse.

A Lei Anticorrupção não prevê a participação de nenhum dos dois órgãos, o que tem causado insegurança às empresas. O caso da SBM Offshore é o maior exemplo: a empresa assinou um acordo com o governo e com os procuradores do MPF que trabalham na “lava jato” e se comprometeu a pagar mais de R$ 1 bilhão à Petrobras. A 5ª Câmara de Revisão do MPF, no entanto, rejeitou o acordo por considerá-lo benéfico demais à companhia.

Torquato Jardim disse que o caso decorreu da estrutura do MPF, que tem total autonomia para regulamentar sua própria atuação. No caso, explicou, o acordo foi assinado por um procurador da República, mas foi rejeitado por uma segunda instância do próprio Ministério Público.

Embora a portaria não preveja a participação do MPF nos acordos, o ministro da CGU explicou que, além da previsão em lei, “a administração pública trabalha com outro fator muito importante, que é o consuetudinário, o hábito. E também é uma questão de cortesia institucional”. Portanto, o compromisso informal é que AGU e CGU sempre informem o Ministério Público de acordos em andamento.

Matéria de lei
O acordo de leniência é o tema que mais tem gerado discussões jurídicas entre as medidas anunciadas recentemente como de combate à corrupção. Especialmente porque o parágrafo 1º do artigo 17 da Lei de Improbidade proíbe a “transação, acordo ou conciliação” nas ações de improbidade administrativa.

Especialistas no assunto também criticam a participação do Ministério Público e do TCU no acordo. O ministro Gilso Dipp, aposentado do Superior Tribunal de Justiça, afirma que não há previsão legal nenhuma para a participação desses órgãos.

“O acordo de leniência quem conduz é o ente lesado. Quem verifica as possibilidades, as vantagens e desvantagens que o acordo tiver é a administração pública e a empresa. Ponto”, afirmou, em entrevista à ConJur.

Uma medida provisória chegou a ser editada para tentar resolver esses problemas, mas caducou sem ser discutida pelo Congresso. Ela revogava o parágrafo 1º do artigo 17 da Lei de Improbidade e previa a participação do MPF e o TCU.

A portaria assinada nesta quinta regulamenta o Decreto 8.420/2015, que regulamentou a Lei Anticorrupção para descrever o Procedimento Administrativo de Responsabilização (PAR) e dizer como devem ser feitos os acordos. E lá diz que os acordos que envolvem a União serão celebrados pela CGU, sem previsão de participação de MPF ou TCU.

Portanto, a nova portaria também não trata da participação desses dois órgãos. Segundo a advogada-geral da União, a regra foi editada para tratar dos papéis de cada um nos acordos. “A ideia é trazer transparência e celeridade a este ambiente. Estamos em diálogos avançados com o TCU, por exemplo. Não pode um órgão sozinho celebrar um acordo que envolva atribuições de outros, até para não haver desentendimentos depois de o trato estar assinado”, explicou na coletiva desta quinta.

No Congresso
O debate sobre o assunto também está no Congresso. O Projeto de Lei 3.636/2015, de autoria do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), prevê justamente a participação do Ministério Público e da advocacia pública, ao lado dos órgãos de controle no Executivo, nos acordos de leniência. E também diz que os acordos, caso envolvam o MP, podem abranger as ações penais e de improbidade referentes às práticas ilegais relatadas pelas empresas nos acordos.

A proposta foi aprovada pelo Senado e ainda está na Câmara. A ministra Grace Mendonça disse nesta quinta que o governo não poderia esperar a tramitação legislativa, que não tem prazo e costuma demorar. “Temos uma lei que está em vigor e precisa ser implementada o quanto antes, não podemos aguardar”, afirmou.

Na Câmara, o texto está numa comissão especial e sob relatoria do líder do governo, o deputado André Moura (PSC-SE). Ele já enviou um primeiro parecer aos colegas, em fevereiro deste ano, mas, depois de reuniões com o governo, disse que prepararia outro, ainda não apresentado.

No texto de fevereiro, Moura foi contra a possibilidade de apenas a primeira empresa que procurar o governo possa assinar o acordo referente a determinado ato de improbidade. Na portaria interministerial desta quinta, a saída foi prever que o acordo pode ser assinado com a primeira companhia que levar informação nova ao governo.

Entretanto, o deputado concordou com a previsão do envolvimento de outros órgãos nas negociações e nas consequências do acordo. “É bem vindo o propósito de estimular a participação de outros órgãos integrantes do aparato repressor estatal na celebração de acordos de leniência regidos pela lei de que se cuida, para evitar que as pessoas jurídicas celebrantes continuem sujeitas a punições oriundas de outras fontes”, escreveu.

Clique aqui para ler a portaria

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