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Advogado precisa se comunicar sem ser rebuscado, diz sócia de banca

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28 de agosto de 2016, 14h11

Ao procurar uma oportunidade de trabalho, o advogado deve se mostrar interessado em aprender sobre as áreas do Direito, mas também em conhecer os detalhes da rotina jurídica (dia a dia dos tribunais, quem são os servidores das varas etc.), além de saber se comunicar, de maneira direta e coerente. A opinião é dos advogados João Dácio Rolim e Manuela Britto Mattos, do escritório Rolim, Viotti & Leite Campos.

"Ainda tem gente com um jeito de escrever muito rebuscado, complexo, frases confusas. A parte técnica você ainda consegue ensinar a pessoa que está em início de carreira, mas quando chega um candidato com uma redação confusa e um jeito de escrever truncado é muito mais difícil trabalhar isso", diz Manuela em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.

"A gente busca sempre uma pessoa interessada, comprometida e que também tenha um mínimo de capacidade de comunicação, inclusive a escrita", complementa Rolim.

Os dois advogados afirmam que, para encontrar essas características, é necessário um criterioso sistema de seleção para não gastarem tempo e dinheiro em uma pessoa que não trará os resultados esperados. "Já entrevistei candidato a advogado júnior que, em vez de te perguntar qual é o trabalho, perguntava onde vou sentar, quantas pessoas vão estar na sala, se podia conhecer a sala de reunião… Como assim? O que é importante para você?", conta Manuela.

Destacam também que a humildade do interessado na vaga conta muito na avaliação. "O advogado tem uma tendência de ser vaidoso por causa dessa independência, dessa criação intelectual, de achar que a solução que eu tenho é a melhor ou que nós somos mais importantes do que o cliente. É o contrário. O advogado está para servir o cliente, dentro de padrões éticos e legais. Tem que encontrar a melhor solução possível para o cliente, mas não pensar que ele é mais importante do que o cliente", diz Rolim.

O advogado lembra que, quando o escritório foi fundado, as contratações eram feitas a partir de indicações de colegas e amigos, mas, com o passar do tempo e o crescimento da banca, mudaram o modelo de seleção. "Hoje a gente mais recebe currículos e seleciona. É uma postura mais passiva. Quando recebemos indicações agora, entra no nosso processo formal, de prova técnica, entrevista e teste psicológico", explica Rolim.

O processo de seleção conta, segundo Manuela, com um profissional de recursos humanos especializado em avaliação psicológica. "A gente primeiro faz uma entrevista e comenta 'este candidato gostei disso, fiquei com dúvida nesse ponto' ou 'esse outro me passou tal imagem, veja o que acha'. É um teste para avaliar o perfil do candidato e decidir. É muito trabalhoso você contratar uma pessoa, mobilizar todos os recursos para dali a um mês ver que não está funcionando", diz a advogada.

"Avaliamos as características. Essa pessoa me parece mais proativa, mais inibida, mais detalhista. Isso ajuda depois o advogado que estiver na equipe na hora de passar tarefa para eles", complementa Rolim.

Conhecimento complementar
Saber de algo fora do mundo do Direito também pode servir para o profissional do Direito como diferenciação na hora de ser contratado ou até de abrir seu escritório. Em outra entrevista, também ao jornal O Estado de S. Paulo, Patrícia Peck, advogada especializada em Direito Digital, destaca que seus conhecimentos em programação a ajudaram a se destacar no mercado e a ficar conhecida por ser uma das primeiras a se especializar em legislação sobre a internet.

"Desde o estágio eu tinha a fama no escritório de ser 'a estagiária que entende de tecnologia' porque tinha um site, sabia programar. Desde a formatura, em 1998, atuo com Direito Digital. Na época da formatura, escrevi uma crônica para concorrer a um prêmio falando que no futuro a faculdade fecharia as portas, porque todas as aulas seriam pela internet. Em 1999, enfrentamos o bug do milênio — então, por causa da crônica e do rótulo de 'advogada que entende de tecnologia', comecei a ser procurada para falar sobre quebras de contratos e outras questões legais relativas ao bug", conta Patrícia.

Ela diz que, quando abriu seu escritório, em 2004, era questionada por colegas por restringir sua área de atuação, mas afirma que, aos poucos, foi formando uma rede de clientes. "Meu primeiros clientes foram gerentes de TI — eu trabalhava com questões de política de privacidade e segurança. Depois vieram os profissionais de Marketing, interessados em fazer campanhas digitais e buscando o amparo legal. Na sequência, entrou o varejo: a princípio eram start-ups, pequenos empreendedores que montavam lojas virtuais. Só depois entraram as grandes redes."

Segundo Patrícia, a vantagem do Direito Digital está na possibilidade de o advogado fazer algo inovador, ser pioneiro. "O Direito Digital é transversal: o profissional precisa de conhecimentos jurídicos e técnicos. E ele pode ser um diferencial para profissionais de todas as outras áreas, você pode acompanhar como se colhe um prova eletrônica, por exemplo, pode trabalhar com Direito trabalhista, Civil, Penal. O advogado também tem que ser curioso, gostar de tecnologia, estudar sempre para acompanhar as mudanças tecnológicas."

Patrícia Peck pondera, ainda, que atualmente é mais fácil entrar na área do Direito Digital do que quando começou e que há mais profissionais no mercado, facilitando a contratação. "Durante as palestras que dava nas empresas, muita gente me pedia indicações de leitura. Meu último slide eram de dicas de leitura, todas em inglês. Quanto me pediam uma referência sobre Direito em português, ela não existia. Ninguém falava no Brasil sobre Direito Digital, embora a gente já tivesse discussões sobre a sociedade desmaterializada, a economia digital."

Desafios existem
Mas o mesmo meio digital que abre oportunidades de trabalho impõe ao advogado dificuldades, pois há cada vez mais informações, enquanto a elaboração das peças esbarra nas limitações humanas. "O crescimento exponencial das informações no meio digital, tais como decisões judiciais, peças processuais, contratos, opiniões e e-mails, dificulta a busca, identificação correta e análise das informações relevantes para as necessidades de um advogado", explica José Paulo Graciotti, sócio da Graciotti Assessoria Empresarial, ao jornal O Estado de S. Paulo.

Graciotti pondera que a internet é uma aliada, mas que precisa haver uma estratégia de "garimpo" de informações. "[O advogado] Deve saber extrair o máximo da tecnologia para encontrar agilmente as informações necessárias à produção de documento jurídico, contando com ajuda de robôs de busca ou softwares de inteligência cognitiva. Também deve saber gerenciar corretamente seu conhecimento estratégico organizando-o e indexando-o para utilização futura. Além de analisar estatisticamente jurisprudências e decisões anteriores de tribunais e magistrados."

E esses conhecimentos, continua Graciotti, devem ser adquiridos paralelamente às atividades no Direito. "Ao longo da carreira, além da própria atualização especifica no Direito, os advogados serão compelidos a se tornarem profissionais com conhecimentos mais abrangentes, principalmente no que se refere à tecnologia e ao mundo digital. Isso é necessário para que não corram o risco de se tornarem profissionais jurássicos."

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