Separação de poderes

Distância de Berlim faz bem à corte constitucional alemã, diz ministra

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16 de agosto de 2016, 17h21

Os ministros do Supremo Tribunal Federal brasileiro ficariam felizes em integrar o Tribunal Federal Constitucional alemão, na opinião da ministra Sibylle Kessal-Wuf, juíza da corte. É que o parente alemão do STF é composto por dois senados que julgam 7 mil processos cada anualmente, enquanto a corte constitucional brasileira já julga mais de 100 mil processos por ano.

A ministra falou em palestra nesta terça-feira (16/8), na 1ª Turma do Supremo, respondendo a pergunta do ministro Dias Toffoli sobre a organização da corte constitucional da Alemanha. Ela brincou sobre a demanda pelos serviços de seu tribunal, e também sobre os cinco ou dez minutos que tinha para falar sobre o assunto, “que tomaria uma hora”.

Sibylle Kessal-Wuf está no Brasil para um ciclo de palestras organizado Rede de Pesquisa Direito Civil Contemporâneo, capitaneado pelo professor Otavio Luiz Rodrigues Junior. Brasília foi o último capítulo da viagem, que durou duas semanas e passou por São Paulo e Curitiba. A palestra será publicada na revista da Rede de Pesquisa Direito Civil Contemporâneo.

De fato, a estrutura do Tribunal Federal Constitucional alemão, BverfG, na sigla em alemão, não se parece em quase nada com a do Supremo. A principal diferença é a localização: a corte não fica em Berlim, capital da Alemanha, mas na cidade de Karlsruhe, a 750 km de distância.

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Distância afasta tribunal de órgãos que são por ele controlados, diz ministra.
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O espírito dessa decisão, comentou Sibylle, é afastar o órgão de controle dos órgãos controlados. “Mesmo quando a capital era em Bonn, não ficávamos em Bonn. Somos o órgão constitucional que controla os outros órgãos constitucionais, então o órgão que controla fica longe dos órgãos controlados. A distância só faz bem”, comentou a ministra.

Ela evitou recomendar o modelo para o Brasil, já que esta é apenas a segunda vez que vem ao país. E brincou: “750 km é uma distância enorme na Alemanha, mas vejo que é apenas um passeio de fim de semana para os brasileiros”. O ministro Toffoli respondeu: “Talvez fosse o caso de voltarmos para o Rio de Janeiro”, onde o Supremo ficou sediado de sua fundação, em 1891, até 1960, quando foi transferido para Brasília, que substituiu o Rio como Distrito Federal.

As diferenças não param aí. O Tribunal Federal Constitucional da Alemanha é composto por 16 juízes eleitos para mandatos de dez anos, sem reeleição. Eles se dividem em três grupos: juízes de carreira, caso da ministra Sibylle; juízes professores, que são os oriundos da academia ou advogados – embora não haja advogados na composição atual; e “colegas com experiência política”, explicou a ministra Kassal-Wuf.

Esses 16 juízes se dividem em dois senados de mesma hierarquia, mas competências diferentes. O 1º Senado julga reclamações constitucionais e o 2º Senado, conflitos federais administrativos. A ministra Sibylle integra o 2º Senado, e afirma que o 1º tem, evidentemente, muito mais casos para julgar, e por isso parte de sua competência é delegada ao senado da ministra. Exemplo é a matéria penal.

O plenário só se reúne se ambos são provocados a decidir sobre a mesma matéria de fundo constitucional.

Além dos senados, o tribunal se divide em três câmaras de três juízes. Portanto, um juiz ocupa duas câmaras simultaneamente. “No momento, isso recai sobre os meus ombros. Mas tudo bem, todo mundo passa por isso”, explica Sibylle.

Filtros
O ministro Luís Roberto Barroso, também presente à mesa em que estava a ministra, mostrou curiosidade sobre o sistema de filtros do Tribunal Federal Constitucional alemão. Ele queria saber como a corte faz para escolher o que julga.

É um tema de interesse do ministro. Ele tem proposto algumas soluções para o julgamento de recursos com repercussão geral pelo Supremo, porque o tribunal tem mais de 700 processos recursos extraordinários pendentes de julgamento e tem julgado em torno de 30 por ano.

O problema é que, depois que o STF reconhece repercussão geral sobre uma matéria, todos os recursos que tratam dela ficam parados esperando um posicionamento do Supremo. E por isso a ideia do ministro Barroso é que o tribunal só discuta se um caso tem ou não repercussão geral uma vez por semestre, com um limite de reconhecimentos por período, e marcando data para o julgamento.

Ele não contou de sua ideia para a ministra Sibylle, mas ela explicou que, no caso alemão, os requisitos para admissibilidade de uma reclamação constitucional “são de natureza formal”. Primeiro, o tribunal analisa se o processo passou por todas as instâncias. Depois, “exigimos regras rigorosas de fundamentação”, explica a ministra. “Não basta dizer que uma decisão ou uma lei é inconstitucional, é preciso trazer argumentos e demonstrar como aquela situação viola a jurisprudência. Com isso, um terço dos casos já não são admitidos pelo tribunal”, conta.

O último quesito é ter passado pelo crivo das câmaras. Se o caso é menos complexo, ou se há consenso entre os três juízes que integram o colegiado, ele não sobe para os senados.

Barroso quis saber se a decisão sobre admissibilidade são fundamentadas ou são “só sim ou não”. A ministra Sibylle explicou que “em poucos casos” há fundamentação extensa. Na maioria das vezes, apenas dizem que tal processo não será julgado por não ter condições de ser admitido.

Quando a matéria é de grande interesse social ou político, explica a ministra, o tribunal diz que não julgará a matéria por questões formais de admissibilidade, e não relacionadas ao mérito.

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