Opinião

Precisamos de uma reformulação total do sistema de Justiça Tributária

Autor

5 de agosto de 2016, 14h04

Na última reunião de Conselho do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), em junho, com a presença do ministro Fabio Medina Osório, Advogado Geral da União, surgiu a ideia de se organizar um seminário para discutir o funcionamento da Justiça Tributária, sob a ótica da advocacia, em vista dos inúmeros e recorrentes episódios que demonstraram, tristemente, o esgotamento do sistema.

Estando presentes os presidentes das mais relevantes entidades da advocacia, a exemplo do presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), José Horácio H. Rezende Ribeiro, e do presidente do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), Carlos José Santos da Silva, dentre outros importantes conselheiros do MDA, a ideia do seminário foi prontamente acolhida e, com o apoio e a realização da AGU em sua sede em São Paulo. Participarão também institucionalmente do evento, em meados de setembro, a Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo e a Fiesp.

Dentre as diversas propostas e sugestões que serão levadas nesse seminário, o MDA irá apresentar a sua proposta para reformulação completa da Justiça Tributária, levando em conta as seguintes premissas : (a) o modelo atual se esgotou; (b) o que ambas as partes em conflitos fiscais (Fisco e contribuintes) devem almejar é um julgamento em tempo razoável e técnico; e não apenas a suspensão da exigibilidade da cobrança durante o tempo de pendência do julgamento; (c) o modelo atual, por ser extremamente moroso, invariavelmente faz com que os débitos fiscais aumentem em proporções impagáveis, em virtude do descasamento entre o momento da decisão final e os fatos geradores, forçando os contribuintes a aderirem a programas de parcelamentos/anistias; (d) em virtude da razão anterior, há um empobrecimento geral das discussões em matéria tributária perante os Tribunais do Poder Judiciário, de vez que na Justiça se exige a garantia prévia para suspensão das cobranças; e (e) apenas em casos excepcionais é concedida medida judicial que suspenda a cobrança perante a Justiça comum, gerando instabilidade, incerteza e insegurança nas diversas etapas do processo judicial.

Assim sendo, a proposta do MDA, levando em conta todo esse contexto, é a seguinte: criação de uma instância única de julgamento administrativo, no plano federal (modelo esse que poderá ser repetido nos planos estaduais e municipais), em que seja garantida a ampla defesa e o contraditório, a possibilidade de sustentação oral, a realização de perícias técnicas, com pautas de julgamento publicadas nos meios oficiais com antecedência e ampla publicidade, acervo acessível a todos de jurisprudência e regras claras sobre funcionamento do órgão administrativo judicante.

Por se concentrar a jurisdição administrativa em apenas uma instância, em julgamento sem grau de recurso, admitir-se-á aos contribuintes que se saírem vencidos e que desejarem levar a respectiva discussão ao Poder Judiciário a suspensão automática da cobrança tributária (vale dizer, a suspensão automática da exigibilidade do crédito tributário) até a prolação da sentença de primeira instância, sem necessidade de oferecimento de garantias ou mesmo a concessão de medidas liminares, até essa etapa.

Em paralelo, e assim como se dá em relação às Varas Especializadas em Direito Penal, promover-se-á, a partir dessa proposta, a criação de Varas Especializadas em Direito Tributário nas capitais e nos grandes centros econômicos do país, de modo a propiciar que os juízes federais sejam ainda mais familiarizados com questões relativas a planejamento tributário, aproveitamento de ágio interno, “transfer pricing”, repatriação de capitais, emissões de CNDs, causas de exclusão de programas de parcelamento/anistia, operações societárias com impactos fiscais, créditos de PIS/COFINS, matérias relativas a IRPJ, CSLL, IOF, CIDE, contribuições previdenciárias e outros temas muito específicos que dizem respeito às questões tributárias.

No entendimento do MDA, apenas com o encurtamento das instâncias decisórias e a segurança garantida no sentido de que, até a sentença de primeiro grau, nenhum contribuinte será obrigado a garantir o juízo ou mesmo ficar à mercê da concessão de medidas (precárias) em caráter liminar, é que se promoverá a grande mudança na Justiça Tributária brasileira, integrando-se o modelo de jurisdição administrativa com a jurisdição própria do Poder Judiciário.

Já é sabido que mudanças paliativas de regimentos internos, ampliação do número de integrantes de Turmas julgadoras ou mesmo a revisão do voto de qualidade são medidas que não trarão grandes resultados ao caos ora instalado.

Só mesmo mudanças estruturantes, permeadas pela ampla transparência e rapidez nos julgamentos, é que poderão realmente resgatar um sistema de contencioso fiscal justo e adequado para os desafios de nossa sociedade moderna e tão complexa.

Por derradeiro, cabe ainda uma última colocação: pouco importa se os julgadores dessa única instância administrativa judicante serão concursados ou se funcionários de carreira das Administrações Tributárias.  No fim do dia, todos nesse modelo serão invariavelmente remunerados pela União, no plano federal, e pelos estados e municípios nos outros planos —entes que são parte no contencioso administrativo tributário.

Assim, sobre a necessidade de concurso público tão propalado por importantes vozes de nosso meio, essa circunstância se revela um falso dilema e desloca o centro da discussão para tema menos relevante.

O centro da discussão é como se obter um modelo justo, rápido, eficaz e seguro, para ambas as partes, prestigiando-se quem tem razão.  E não quem quer ganhar tempo.

Essa será a proposta do MDA no aludido seminário, na convicção sincera de que com essa reformulação resgataremos uma Justiça Tributária à altura de nosso país.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!