Silêncio estratégico

Defensor que deixa de fazer perguntas a suspeito não abandona causa

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26 de abril de 2016, 9h09

Não ocorre abandono de causa quando a defesa se recusa a fazer algumas perguntas durante audiência, acreditando que suas prerrogativas e os direitos do suspeito foram violados, pois a estratégia de atuação é livre. Assim entendeu o desembargador federal Paulo Fontes, da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ao conceder liminar suspendendo decisões judiciais proferidas contra um defensor federal em Guarulhos (SP).

João Paulo Rodrigues de Castro havia sido multado em 100 salários mínimos (R$ 88 mil) porque, ao participar de uma audiência de custódia no fórum da Justiça Federal do município, afirmou que não perguntaria se o suspeito sofreu violência policial durante a prisão em flagrante. Esse tipo de audiência é uma oportunidade para o preso relatar eventuais maus-tratos, mas o defensor reclamou de que em nenhum momento conseguiu conversar com o representado em ambiente reservado, sem que policiais pudessem ouvir a conversa.

Para o juiz responsável pela audiência, a conduta gerou abandono indireto da causa. Ele não só fixou multa de 50 salários mínimos como determinou que Castro fosse investigado pela Corregedoria da Defensoria Pública da União e também pelo Ministério Público Federal, sob suspeita de improbidade administrativa. A decisão foi duplicada porque o defensor tinha outra audiência de custódia marcada para o mesmo dia.

O defensor-chefe da DPU em Guarulhos, Caio Cezar de Figueiredo Paiva, apresentou mandado de segurança no TRF-3 contra as medidas. Segundo ele, o juiz desprezou o trabalho da Defensoria, destituiu Castro de forma arbitrária e atingiu de forma grave “uma das prerrogativas mais caras para qualquer instituição do sistema de Justiça: a independência funcional”.

Paiva apontou que o defensor só se negou a fazer perguntas sobre violência policial e em nenhum momento se recusou a participar da audiência de custódia — estava, inclusive, preparado para pedir a liberdade do suspeito. Disse ainda que a concessão de liminar era importante para evitar novos casos semelhantes e prevenir danos imediatos ao defensor público.

Estratégia legítima
O desembargador federal Paulo Fontes, relator do caso no tribunal, concluiu que houve “aparente exagero” nas medidas aplicadas, por constatar que não houve abandono de causa. “A decisão de recusar-se a fazer reperguntas nas audiências de custódia, por entender que estava insuficientemente informado a respeito do caso, era em princípio medida ao alcance do defensor público e mesmo estratégia processual legítima, quiçá para a arguição de futura nulidade”, afirmou.

O relator suspendeu os efeitos da decisão e reconduziu Castro ao patrocínio das duas causas. Para o defensor-chefe da DPU, a liminar já é relevante por reconhecer a independência funcional dos defensores. 

Clique aqui para ler a decisão.
0007061-28.2016.4.03.0000

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