Canto da Sereia

Medidas contra a corrupção restringem HC, criticam advogados

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18 de abril de 2016, 9h50

A advocacia criminal está preocupada com os rumos que o devido processo legal está tomando no Brasil e com a “sacralização" do combate à corrupção. O intenso uso de delações premiadas, que têm entre em suas cláusulas a obrigação de o delator abrir mão de recursos; os abusos cometidos dentro de fóruns e delegacias, onde os advogados são impedidos até de buscar um café; e as dez medidas contra a corrupção, que foram apresentadas na Câmara dos Deputados no fim de março, foram os temas debatidos por alguns dos principais nomes da advocacia criminal na Associação dos Advogados de São Paulo nesta quinta-feira (15/4).

Felipe Lampe
Apoio da sociedade às medidas contra a corrupção vem de uma “mentalidade francamente punitivista”, disse Toron.

O advogado criminalista Alberto Zacharias Toron afirmou que o Ministério Público não explica devidamente do que as medidas contra a corrupção realmente tratam e que o apoio recebido da sociedade é resultado da “mentalidade francamente punitivista”.

“Precisamos nos atentar aos termos usados nesse projeto”, disse o advogado, explicando que as ideias apresentadas trazem princípios limitadores, principalmente em relação aos recursos, o que pode ser interpretado como cerceamento do Direito de Defesa. “O Ministério Público propõe o estreitamento do Habeas Corpus (HC)”, disse.

Essas pretensas limitações ao HC foram detalhadas por Gamil Föppel, que classificou a ideia do MP como “pacote do processo penal” que busca dar um novo tratamento ao sistema recursal e explicou que apenas uma das medidas trata realmente do combate à corrupção: a que torna a prática crime hediondo. “Não vai haver Habeas Corpus para discutir a nulidade de provas”, disse, complementando que isso pode levar a desconstrução de precedentes. “Se houver nulidade, como questionar isso, a lesão de direito não poderá ser discutida judicialmente”, questionou.

A ilegalidade apontada por Gamil é impossibilidade de impugnar HC, de ofício, por magistrado de outra diferente daquela que deferiu a solicitação. Ele lembra que a maior parte de HCs impetrados nos tribunais superiores não são concedidos, mas os aceitos são de ofício. “O juiz vai continuar com a ação ilegal porque ele não pode fazer de ofício”, questiona.

Moro como exemplo
Para Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, ex-presidente da Aasp e da OAB-SP, é preciso desmistificar que a advocacia “atrapalha” o devido processo legal, como afirma alguns magistrados e é retratado pela imprensa. “A mídia nos vê como coautores do crime”, disse. Ele destaca que essa ideia passa também pelo fato de que a operação “lava jato” tem sido mais célere que o habitual da Justiça brasileira. Isso, segundo o advogado, ganha mais força quando outros juízes se veem como o juiz federal Sergio Moro.

OAB/SP
“A mídia nos vê como coautores do crime”, disse Mariz de Oliveira.

Mariz explica que, ao contrário do exemplo dado pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, Moro é um juiz de primeiro grau, o que dá a entender que o posicionamento mais incisivo é possível a qualquer um. Sobre as delações, ele afirmou que quando as denúncias são obtidas com a prisão preventiva do investigado, a ideia é a mesma usada por militares para combater a oposição na ditadura: “A diferença é que torturado fala mais rápido.”

Os desrespeitos em relação às prerrogativas dos advogados teriam o "consentimento omissivo" de setores da advocacia, segundo o conselheiro federal da Ordem por São Paulo, Guilherme Batochio, que foi presidente nacional de comissão no colegiado sobre o tema. O representante paulista disse estar preocupado com os métodos de Moro e manifestações de apoio ao juiz federal. “Esquecem que os objetivos são alcançados à custa dos direitos da advocacia”, opinou.

Reprodução
“Esquecem que os objetivos são alcançados à custa dos direitos da advocacia”, opinou Guilherme Batochio.

Outro exemplo disso que partiu da advocacia, segundo Batochio, foram as citações de grampos obtidos ilegalmente pela Justiça e as menções à delação premiada do senador Delcídio do Amaral no pedido de impeachment movido pelo Conselho Federal contra a presidente Dilma. "Talvez não se tenha analisado a questão sob a ótica necessária, que diz com as garantias asseguradas no Texto Constitucional". O presidente do Instituto dos Advogados do Brasil, Técio Lins e Silva, ressaltou que o texto do pedido não é o ideal. “É possível usar essa acusação contra qualquer um de nós”, disse.

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