Nova jurisprudência

Em decisão inédita, Marco Aurélio determina domiciliar em caso de extradição

Autor

11 de abril de 2016, 18h44

Uma decisão tomada pelo ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, estabeleceu uma nova jurisprudência para casos de estrangeiros presos que respondem processo de extradição. O julgador determinou que Roberto Oscar Gonzalez, ex-delegado da Polícia Federal da Argentina, passe a esperar seu julgamento em prisão domiciliar, com monitoramento eletrônico.

A conversão da preventiva em domiciliar chama a atenção porque o Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/1980) deixa claro em seu parágrafo único do artigo 84: a prisão perdurará até o julgamento final do Supremo Tribunal Federal, não sendo admitidas a liberdade vigiada, a prisão domiciliar, nem a prisão albergue.

É a segunda vez que um estrangeiro esperando extradição obtém prisão domiciliar. No primeiro caso, de um venezuelano, no entanto, a decisão foi colegiada. A 1ª Turma do STF entendeu ser possível a excepcionalidade por ver como grave a renúncia da Venezuela à Convenção Americana dos Direitos Humanos. No caso do argentino Gonzalez, foi uma decisão monocrática, o que abre precedente na corte para decisões liminares que relaxem prisões temporárias.

O ministro não entrou em detalhes sobre o afastamento do Estatuto do Estrangeiro, mas deixou claro que passa pela prescrição dos crimes dos quais Gonzalez é acusado.

“Como o episódio retratado no processo ocorreu, repita-se, há mais de trinta anos, vem a baila a prescrição da pretensão punitiva, a fragilizar a viabilidade jurídica da extradição e, por conseguinte, a subsistência da prisão”, escreveu o ministro na decisão que determinou o relaxamento da prisão.

Roberto Oscar Gonzalez era procurado por sequestros, roubos e assassinato de opositores políticos da ditadura militar argentina, entre 1976 a 1983. Entre eles o do famoso jornalista e escritor Rodolfo Walsh, um dos casos mais emblemáticos do período. Caso seja extraditado, irá ser julgado por crimes contra a humanidade.

Em setembro, será colhido um interrogatório de Gonzalez e o julgamento do Plenário do Supremo deve ficar para 2017. A defesa do argentino, feita pelo advogado Rodrigo Mariano da Rocha do escritório Mariano da Rocha & Mallmann Advogados Associados, irá apresentar a tese de que o ex-delegado cometeu crimes políticos pelos quais foi anistiado e que já prescreveram. O pedido será para ele receber asilo definitivo no Brasil.

Punição impossível
Em sua decisão, Marco Aurélio ressalta que a legislação brasileira não permite punir Gonazlez. Isso porque ele teria se beneficiado de uma anistia promulgada em 1983. No entanto, depois de alguns governos civis, a norma passou a ser revista e quadros do governo militar passaram a ser julgados e punidos por crimes na ditadura.

Já no Brasil, a anistia se manteve intacta, com muitos casos chegando aos tribunais, mas nunca prosperando. O ministro ressalta esse ponto, afirmando que os mesmos crimes não são puníveis no Brasil. E lembra o texto do Tratado de Extradição firmados entre Brasil e Argentina, que veda a punição para o "o delinquente que já tiver sido ou esteja sendo julgado no Estado requerido, ou tenha sido anistiado, ou indultado no Estado requerente, ou requerido".

Sobre a prescrição, Marco Aurélio lembrou que o tratado de extradição entre Brasil e Argentina determina que o procedimento não será adotado quando a ação ou a pena já estiver prescrita, segundo as leis do Estado requerente ou requerido. “As alegadas torturas e sequestros imputados ao extraditando datam de mais de trinta anos, ou seja, estão há muito prescritas a luz da legislação pátria, considerado o prazo máximo de vinte anos”, disse o ministro. 

Clique aqui para ler a decisão. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!