Opinião

Desrespeito à periodicidade de sessões no TJ-SP prejudica jurisdicionados

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25 de setembro de 2015, 6h41

Todos os operadores do direito conhecem e reconhecem a importância do duplo grau de jurisdição, princípio processual que consagra a possibilidade de a parte vencida obter, mediante a interposição de recurso, o reexame da causa. Ao jurisdicionado se assegura o direito ao recurso, que regra geral é examinado por instâncias superiores, em todas as divisões da Justiça, para processos de natureza trabalhista, tributária, penal ou civil.

O julgamento dos recursos, pelos Tribunais, é reflexo natural do direito de ação e do devido processo legal, ambos garantidos pela Constituição Federal, na qual também se assegura a todos a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Para dar concretude a tais preceitos constitucionais, a lei cria os parâmetros de cabimento e processamento dos recursos. No âmbito dos próprios tribunais, seus Regimentos complementam tais regras, para regular, por exemplo, a divisão da competência entre as Câmaras e Turmas, a frequência dos julgamentos, entre outros aspectos.

Fruto desse conjunto de regras, os julgamentos pelos tribunais são, regra geral, colegiados, presenciais e neles se assegura aos advogados das partes a possibilidade de realizar sustentação oral. Em relação ao Tribunal de Justiça de São Paulo, as sessões de julgamento das suas Câmaras Ordinárias devem ocorrer todas as semanas, nas quais os três julgadores designados se reúnem e analisam as causas a eles submetidas (Artigo 116, parágrafo 1º, Regimento Interno).

A lei que regula a atividade do Tribunal de Justiça, portanto, é clara ao prever que as sessões de julgamento serão semanais. Disso decorre o óbvio dever dos desembargadores de reunir-se semanalmente para realizar, em sessões públicas, tais julgamentos. Nas câmaras em que isso ocorre, o que se verifica é que a cada semana há, em média, cerca de dez sustentações orais, além de outros tantos casos com preferência para assistir o julgamento.

Em virtude dos números sempre superlativos da Justiça, em especial em São Paulo, a quantidade de processos sob julgamento é enorme, a rotina de trabalho dos julgadores é sempre muito intensa. E há muitos exemplos de abnegação e trabalho incessante, a merecer os permanentes aplausos dos operadores do direito e da sociedade em geral.

Contudo, há muitos outros exemplos menos gratificantes. E, o que causa preocupação ainda maior, essa rotina exaustiva tem sido invocada pelos magistrados para descumprir a lei, o que é inadmissível.

Referimo-nos, especificamente, ao fato de que diversas câmaras do Tribunal de Justiça de São Paulo não obedecem ao próprio regimento, pois fazem as sessões a cada quinzena ou, em alguns casos, apenas mensalmente. A análise da periodicidade de tais sessões do TJ-SP demonstra que são poucas as câmaras que fazem sessões semanais. Tratando-se especialmente das 40 Câmaras de Direito Privado, cerca de 1/3 delas vem realizando sessões semanais. Nas demais, as sessões se realizam com periodicidade quinzenal e mensal.

A primeira crítica que deve ser feita relaciona-se ao desrespeito à norma regimental em si considerada. Pois, por mais relevantes que possam ser as razões, não se pode aceitar que o Poder Judiciário, cuja função e razão de existir é o de aplicar a lei aos casos concretos e impor o cumprimento do ordenamento jurídico, possa, ele próprio, atuar quotidianamente desrespeitando a lei.

Mas, para além dessa relevante questão, fato é que a redução da periodicidade nos julgamentos vem causando sérios problemas aos jurisdicionados e seus respectivos advogados. Se nas câmaras com julgamentos semanais já há um razoável número de casos com sustentações orais e pedidos de preferência, claro que em sessões quinzenais ou mensais esse problema se agrava muito.

O que se vê são advogados e partes lotando as salas de julgamento, aguardando sua vez por muitas horas. Para os desembargadores, tais sessões mais espaçadas se tornam mais longas, cansativas e não produtivas. Em suma, ainda mais extenuantes. E quanto aos casos sem preferência ou sustentação, que são julgados após tantas horas, o que ocorre são os julgamentos em lista, sem qualquer identificação dos temas, das partes, sem qualquer discussão. Verdadeiros julgamentos monocráticos, mal disfarçados de julgamentos colegiados. Se este é um dado da realidade dos nossos tribunais hoje em dia, impossível não reconhecer o quão triste é essa realidade, que se distancia muito de um padrão mínimo de qualidade dos julgamentos.

Tanto pior se o motivo se relaciona com fatores de comodidade pessoal dos julgadores, como por exemplo, para dispensar os desembargadores que residem fora da sede do tribunal (prática comum e de legalidade duvidosa, em vista da obrigação contida no artigo 35 da LomanN) de se deslocar para São Paulo todas as semanas.

Sabe-se que a quantidade de casos atribuída a cada julgador do TJ-SP é excessiva e que o problema da morosidade do Judiciário é resultado de diversos e complexos fatores. Nem todos de responsabilidade ou sob a esfera de influência do Poder Judiciário. Mas naquilo que lhe compete, é de se esperar que a lei seja cumprida, que seja assegurado o direito de partes e de advogados a sessões de julgamento efetivas, em condições adequadas e que respeitem o devido processo legal. Isso sem falar, naturalmente, no aprimoramento dos mecanismos de gestão dos processos, bem como da estrutura física e de recursos humanos.

A existência de determinação pelo Regimento Interno do TJ-SP — que é elaborado e aprovado pelos próprios desembargadores — não pode ser desconsiderada pelos julgadores, em evidente prejuízo à cidadania. Nem mesmo se o motivo dessa prática fosse a realização de mais julgamentos, ou a diminuição do estoque de causas. A lei existe, deve ser cumprida por todos, como parte do esforço exigido de toda a Sociedade para reduzir o acervo de casos aguardando julgamento e permitir que a duração do processo brasileiro deixe de ser um fator de negativa de justiça ao cidadão.

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