Com a divergência

Ministro Gilmar Mendes vota a favor do financiamento eleitoral por empresas

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16 de setembro de 2015, 19h43

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, acompanhou nesta quarta-feira (16/9) a divergência, inaugurada pelo ministro Teori Zavascki, e votou pela total improcedência da ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Conselho Federal da OAB para impedir que pessoas jurídicas façam doações eleitorais e limitar as doações feitas por pessoas físicas.

Em seu voto-vista, Gilmar Mendes falou que os pedidos não encontram “guarida” em dispositivos constitucionais, e que a vedação das contribuições de empresas privadas asfixiaria os partidos que não estão no poder, tornando “virtualmente impossível” a alternância de poder. Ele afirmou também que permitir a doação somente de pessoas naturais, a partir de limite per capita e uniforme, significa criminalizar o processo político-eleitoral no Brasil, além de ser um convite à prática reiterada de crimes de lavagem de dinheiro.

Segundo o ministro, a total proibição não excluiria, por exemplo, a possibilidade de uma empresa dar o dinheiro para uma pessoa para que ela doe ao partido. Seria o que ele chamou de "doações-laranja". Ao mesmo tempo, Gilmar defende defende o fortalecimento das instituições de fiscalização e uma reforma mais ampla do sistema político-partidário, e não apenas do modelo de financiamento, para solucionar casos de corrupção.

Até o momento, cinco votos (ministros Luiz Fux, Marco Aurélio, Dias Toffoli, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski) reconheceram a inconstitucionalidade das doações. O ministro Luís Roberto Barroso afirmou a inconstitucionalidade do atual modelo de financiamento empresarial de campanhas eleitorais, remetendo ao Congresso Nacional a possibilidade de instituir um novo parâmetro normativo que, sem afastar o financiamento eleitoral por pessoas jurídicas, preserve o princípio da isonomia no processo eleitoral.

O ministro falou em seu voto que a restrição levaria a doação das empresas para a clandestinidade por meio do caixa dois. O ministro Marco Aurélio disse que as instituições, caso isso ocorra, poderão atuar para impedir essa ilegalidade.

Gilmar Mendes, vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral, buscou dados das prestações de contas dos partidos nas eleições de 2014 e concluiu que as doações por empresas são bem maiores que as por pessoas físicas. “Doação de pessoa física não é tradição no sistema brasileiro”, disse.

"A relação entre dinheiro e política é complexa, e não há formas universais para a regulação da matéria", disse o ministro Gilmar. Para disciplinar a questão, continuou o minstro, devem ser consideradas questões históricas e culturais de cada país e características de governo e político-partidárias.

“No Brasil, o constituinte resolveu não regular a matéria, deixou para a legislação ordinária”, disse, ressaltando que a Constituição veda aos partidos o recebimento de recursos financeiros de entidades ou governos estrangeiros. “Não há vedação constitucional expressa para doação de empresas”, concluiu.

Projeto de poder
Gilmar Mendes também acusou a OAB, autora da ação de inconstitucionalidade, de se deixar manipular pelos interesses do PT, partido da presidente Dilma Rousseff. Para o ministro, a ação é um primeiro passo para a criação de um modelo de financiamento exclusivamente público.

"Como podemos constatar da análise dos diversos documentos que compõem a própria ação, sua propositura resultou de um esforço conjunto de diversos advogados do Rio de Janeiro em promover a reforma política pela via judicial, uma vez que não haveria consenso entre os parlamentares", afirmou Gilmar. 

E concluiu: "O que houve, portanto, foi a absorção de um projeto de poder, defendido por um partido que já se confundia com o Estado brasileiro, por parte da sociedade civil organizada, no caso, pela OAB. O Conselho Federal da Ordem adotou a proposta e a apresentou ao Supremo".

O que o ministro considerou mais "absurdo de tudo isso" foi que o PT tentou emplacar a tese no Congresso, mas não conseguiu a aceitação dos parlamentares. E a partir daí é que tentaram o Judiciário. "Essa visão autoritária e que pretendia ceifar a concorrência democrática no Brasil, oriunda de um partido político encampada como posição defendida pela sociedade brasileira. E isso foi feito por meio da manipulação da OAB."

Gilmar aproveitou para fazer considerações a respeito da operação "lava jato". Disse que, a partir do que se descobriu na investigação, as empresas privadas são a única saída dos partidos de oposição para se manter competitivos no jogo eleitoral.

"A operação "lava jato" revelou ao país que o partido do poder já independe de doações eleitorais, uma vez que arrecadou somas suficientes ao financiamento de campanhas até 2038", declarou. Sem as empresas, portanto, "os partidos de oposição não teriam a menor chance de competir em níveis razoáveis com o partido que ocupa o governo", concluiu.

Resposta
Depois do voto do ministro Gilmar Mendes, que durou mais de quatro horas, o secretário-geral da OAB, Cláudio Pereira de Souza Neto, pediu a palavra para defender a legitimidade da ação. E afirmou que outras organizações, como a Comissão Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), também apoiam o fim da doação para campanhas políticas feita por empresas.

Souza Neto havia dito que gostaria de esclarecer questões de fato — já que advogados não podem discutir o mérito de votos de ministros. No entanto, quando começou a defender a ação, o ministro Gilmar se mostrou contrariado. 

"Isso é o mérito da ação, está tudo no meu voto", disse. O presidente da corte, ministro Ricardo Lewandowski, manteve a palavra com o representante da OAB: "Vamos dar a palavra ao advogado, vossa excelência falou por quase cinco horas". Gilmar Mendes, então, levantou e deixou a bancada.

Depois da fala de Cláudio de Souza Neto, o ministro Lewandowski agradeceu e encerrou a sessão, que será retomada nesta quinta-feira (17/9).

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