Excesso de linguagem

Juíza de Roraima ofendida em carta por advogado gaúcho ganha dano moral

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15 de outubro de 2015, 16h49

Embora a sentença de um juiz desagrade alguém, a parte perdedora não tem o direito de criticá-lo de forma exacerbada e excessiva nem de atacá-lo pessoalmente. Afinal, condutas ofensivas e vexatórias, que causam desequilíbrio no bem-estar pessoal, violam a dignidade humana e ensejam, por consequência, o pagamento de dano moral. O entendimento levou a 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a negar apelação de um advogado gaúcho que criticou a decisão de uma juíza de Roraima. Ele foi condenado no primeiro grau a pagar R$ 5 mil de reparação moral por tê-la ofendido por carta, depois que esta manteve a prisão do filho dele.

No primeiro grau, o juiz Daniel Henrique Dummer, da 6ª Vara Cível da Comarca de Caxias do Sul, afirmou que as palavras do advogado têm o nítido propósito de denegrir a imagem da magistrada, na medida em que sugerem que ela atuou de forma parcial, cedendo a pressões externas. ‘‘Também afrontam a dignidade funcional e pessoal da autora, quando se afirma que prestou um ‘desserviço à Justiça e ao Direito’, o que na verdade significa desqualificar o trabalho da autora, rotulando-o de prejudicial à sociedade’’, escreveu na sentença.

Na sua percepção, o advogado, que é experiente no metier, deveria ter contestado a decisão da juíza na via recursal, e não com ataques pessoais. ‘‘Não se trata de afirmar que o Poder Judiciário é imune à crítica, e sim que, da mesma forma que a liberdade de expressão, a independência da função jurisdicional é uma importante manifestação da democracia e do Estado Democrático de Direito, e a sua observância assegura uma sociedade mais justa e livre’’, concluiu. O acórdão que confirmou os exatos termos da sentença foi lavrado na sessão de 29 de julho, à unanimidade.

Prisão equivocada
Todo o imbróglio teve início quando a Justiça comum de Roraima condenou a cinco anos de prisão, sem direito de apelar em liberdade, o filho do advogado gaúcho Edmundo Evelim Coelho, Kelsen Frederico Evelim Coelho. Ele foi sentenciado pelo Juizado Especializado de Violência Doméstica e Familiar da Comarca de Boa Vista. Inconformado com a decisão que negou Habeas Corpus ao filho, Edmundo enviou várias cartas à magistrada, durante dois anos, demonstrando toda a sua insatisfação pelo desfecho da ação criminal.

Em uma das correspondências, o advogado afirmou que a juíza, ao negar o Habeas Corpus, agiu em desacordo com a jurisprudência assentada no Superior Tribunal de Justiça. ‘‘No meu sentir, V. Exa curvou-se, com temor reverencial, à pressão da imprensa local, da família da suposta vítima e da polícia, para dizer o mínimo. Por isso o manteve preso, presumindo-o culpado, ao arrepio da Constituição, que todo o juiz, por força do ofício, tem o dever de, com destemor, curar para que seja cumprida e respeitada em qualquer situação. Inegavelmente, prestou um inestimável desserviço à Justiça e ao Direito”, escreveu o pai o réu.

Sentindo-se assediada e ofendida, a juíza entrou com ação indenizatória contra o advogado, pedindo o pagamento de danos morais. É que tal conduta causou perturbação em sua dignidade, pois violou os incisos V e X da Constituição, que preservam a honra e a imagem do ser humano.

Citado pela 6ª Vara Cível de Caxias do Sul, o advogado apresentou contestação. Alegou ter agido no exercício da livre manifestação do pensamento, garantida pelo artigo 5º, inciso IV,  da Constituição. Disse ainda que a condenação criminal foi injusta, tanto que, posteriormente, a Justiça comum condenou o estado de Roraima a pagar danos morais pela prisão indevida de Kelsen. Em síntese, ficou patente que a decisão da juíza foi equivocada.

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