Esfera cível

Citar suspeita de ilícitos em petição não ofende moral de advogado

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28 de novembro de 2015, 5h51

O Estatuto da Advocacia confere imunidade profissional aos atos e manifestações processuais do advogado. Por isso, não é qualquer expressão ou palavra colocada numa petição que terá o poder de ofender a outra parte. Com este fundamento, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul rejeitou apelação a um profissional que teve negado um pedido de reparação moral movido contra uma colega. Ele entendeu que foi chamado de estelionatário no curso de uma ação judicial, o que seria calúnia.

Nos dois graus de jurisdição, ficou demonstrado que as expressões utilizadas pela advogada demandada não tiveram o propósito de caluniá-lo, a ponto de produzir dano moral indenizável. Ou seja, as suas palavras não ultrapassaram o limite da defesa dos seus clientes. “Ainda que efetivamente as expressões não fossem as mais adequadas a serem utilizadas, o fato é que havia indícios do envolvimento do autor com atitudes ilícitas, não restando suficientemente esclarecido o seu envolvimento com estas”, observou, na sentença, a juíza Carla Patrícia Della Giustina, da 7ª Vara Cível do Foro da Capital gaúcha.

O relator da Apelação na 6ª Câmara Cível do TJ-RS, juiz convocado Sylvio da Silva Tavares, disse que disputas que envolvem crimes contra a honra dependem, salvo excepcionalidades, do que acontece na esfera penal. Ou seja, se houvesse indícios de calúnia (conduta tipificada no artigo 138 do Código Penal que consiste em imputar falso crime a outrem), a parte ofendida deveria ter apresentado queixa-crime à polícia ou acionado o Ministério Público.

“Entretanto, no caso dos autos, sequer há notícia de registro de ocorrência contra a ré acerca dos fatos ocorridos, restando evidente que a parte autora buscou a reparação no cível sem adiantar-se na reparação penal que lhe seria essencial. Desinteressando-se a parte autora pela repercussão principal que se daria na esfera criminal, tenho que não se legitima a reparação na esfera cível, impondo-se a manutenção da sentença de improcedência”, registrou Tavares. O acórdão foi lavrado na sessão de 19 de novembro.

Ação indenizatória
O advogado ajuizou ação ordinária com pedido de danos morais contra uma colega porque esta o teria caluniado nos autos de um litígio contratual que tramitou na 14ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, em que o autor figurou como demandado. As petições, segundo a inicial, reputavam condutas como “envolvimento fraudulento”; “simulou falsa aparência ao fingir ser quem não é”; e “foram enganados”.

Para o advogado, as expressões ditas caluniosas remeteram ao crime de estelionato. Afirmou que o ataque à sua honestidade é muito mais prejudicial do que se fosse contra quem não depende do bom nome para trabalhar.

Citada pela 7ª Vara Cível do Foro Central, a advogada ré disse que uma das partes daquele processo contou à polícia que foi ludibriada. Este, sem a sua autorização, cedeu a terceiros o pretenso crédito da pessoa jurídica perante a Petrobras no referido processo. Disse que o Ministério Público, embora tenha mandado arquivar o inquérito policial, não atestou a lisura das negociações, nem a inexistência de intenção fraudulenta. Isso porque o MP constatou “indícios de negociações confusas, no limite da tipicidade”. Ressaltou que as alegações da petição inicial traduziram fielmente o narrado pelos seus clientes — tanto que o autor interpôs reconvenção contra eles, também baseado na ofensa moral.

Naquela ação originária, em sentença proferida em sede de reconvenção, a reportagem apurou que o juiz Dilso Domingos Pereira havia considerado descabidas as alegações do advogado, quase beirando a má-fé. Afinal, o advogado que pediu a reconvenção, de fato, assinara o termo de cessão sem deter poderes específicos para tanto, destacou na sentença.

Segundo o julgador, naquela ocasião, a calúnia não pode ser confundida com alegações de direito, principalmente quando estes fatos são discutidos nos autos. “No contrário, toda ação improcedente que discute simulação, por si só, ensejaria o recebimento de indenização por danos morais, o que não se pode admitir. De qualquer forma, não é o caso dos autos”, concluiu.

Clique aqui para ler a sentença do processo que deu causa à indenizatória.
Clique aqui para ler a sentença que negou a reparação moral.
Clique aqui para ler o acórdão que manteve a sentença de improcedência.

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