Sem medo

TSE cassará Dilma se constatar irregularidades, diz Gilmar Mendes

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8 de novembro de 2015, 12h03

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o ministro do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral Gilmar Mendes afirmou que esta corte não terá problemas em cassar o mandato da presidente Dilma Rousseff se constatar irregularidades na campanha eleitoral de 2014.

Em outra frente, o ministro disse que a operação "lava jato" deve investigar se Dilma não sabia ou esteve envolvida nos esquemas de corrupção da Petrobras, uma vez que foi integrante do conselho de administração da estatal e ministra de Minas e Energia.

Além disso, o ministro declarou não ver problema no fato de sua colega de TSE Maria Thereza de Assis Moura ser a relatora da ação que pede impugnação do mandato de Dilma, e opinou que o sistema presidencialista está esgotado no Brasil.

Leia abaixo a íntegra da entrevista: 

Folha de S.Paulo – Dilma tem condições de chegar ao fim do mandato?
Gilmar Mendes –
Temos muitas discussões abertas, como o impeachment, processos na Justiça Eleitoral, mas estamos numa situação muito difícil. É preciso encontrar o encaminhamento institucional e não podemos esquecer que, ao lado da grave crise política temos a crise econômica, que exige medidas de quem tem legitimidade, credibilidade e autoridade. Esses são elementos que estão em falta no mercado político.

Folha de S.Paulo – Renúncia seria o caminho?
Gilmar Mendes –
Não vou emitir juízo de valor, mas estou convencido de que é muito difícil chegarmos a 2018 com esse quadro de definhamento econômico.

Folha de S.Paulo – As investigações de corrupção chegando perto do ex-presidente Lula agravam o cenário?
Gilmar Mendes –
Não se estrutura um sistema dessa dimensão sem a participação de atores políticos importantes. Tanto é que eu brinquei: esse enredo não entra na Sapucaí, é preciso que ele seja completado. Todos nós que temos experiência na vida pública não imaginamos que um deputado vá à Petrobras e consiga levantar recursos. É preciso outro tipo de arranjo.

Folha de S.Paulo – Dois delatores disseram acreditar que Lula e Dilma sabiam do esquema…
Gilmar Mendes – Não vou fazer juízo, mas não acredito que isso nasceu por ação espontânea de parlamentares que foram à Petrobras, Eletrobras, Eletronuclear e decidiram fazer lá um tipo de partido.

Folha de S.Paulo – O presidente da Câmara é investigado por manter contas no exterior. Diante dessa situação, Eduardo Cunha deveria se afastar do cargo?
Gilmar Mendes –
A gente tende a falar mal dos nossos políticos, mas, ao longo dos anos, logramos desenvolver uma classe política muito hábil, que propiciou desdobramentos históricos interessantes, como a transição do regime militar para o modelo de 1988. Espero que o segmento político se inspire nesses exemplos para encaminhar soluções adequadas.

Folha de S.Paulo – Se o Supremo aceitar a denúncia, Cunha deveria se afastar automaticamente?
Gilmar Mendes
– Não gostaria de emitir juízo de valor.

Folha de S.Paulo – Alguns deputados questionam a legitimidade de Cunha para avaliar um pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Gilmar Mendes –
É uma questão interna do Congresso. Mas, por esse argumento, quem ainda poderia tomar alguma decisão? O que se diz é que não há nenhuma prova contra a presidente, mas nós sabemos que isso não se desenvolveu por geração espontânea, e ela estava em funções-chave desde o Ministério de Minas e Energia, Casa Civil e Presidência. Tem ela também condições de continuar a governar?

Folha de S.Paulo – O PT apresentou um parecer do jurista Dalmo Dallari em que ele diz que o TSE não tem competência para cassar mandato de presidente. O senhor concorda?
Gilmar Mendes –
Eu acho que nem o Dalmo nem o PT acreditam nesse parecer. Isso não tem o menor cabimento. Nunca se questionou a competência da Justiça Eleitoral. É como dizer que o presidente não esteja submetido às regras básicas de uma campanha limpa.

Folha de S.Paulo – O senhor reclamou que o TSE estava muito acostumado a chancelar coisas do Executivo. Isso mudou?
Gilmar Mendes –
O tribunal foi vacilante na campanha presidencial de 2014. O abuso geral da campanha era muito difícil de ser coibido, aumento de Bolsa Família em março, quem impugna esse tipo de questão? O Ministério Público talvez pudesse ter sido ator mais presente. Pelo menos na Justiça Eleitoral, parecia meio cooptado. Acredito que já vivemos um novo momento.

Folha de S.Paulo – Não teria problema de enfrentar cassação de presidente?
Gilmar Mendes –
Não. Não é nada desejável, mas, se houver elementos, o tribunal poderá se pronunciar sobre isso, como tem se pronunciado em outros casos de senador, deputado, prefeito e vereador.

Folha de S.Paulo – Como o senhor recebeu a decisão de que a ministra Maria Thereza de Assis Moura foi mantida na relatoria de uma das ações de cassação?
Gilmar Mendes –
É uma decisão normal, uma das possibilidades. O processo estará em boas mãos.

Folha de S.Paulo – Mas o fato de a ministra ter votado pelo arquivamento da ação não terá influência no andamento do processo?
Gilmar Mendes –
Acho que o tribunal superou esse entendimento [arquivamento] de maneira expressiva, 5 votos a 2, e certamente ela terá que conduzir o processo sob as diretrizes estabelecidas pelo plenário. E existem muitos elementos que vão permitir uma adequada avaliação sobre o pedido. O importante é que, tendo em vista os fortes indícios, o TSE optou por abir a ação.

Folha de S.Paulo – No Congresso do IDP, os juristas vão discutir questões estruturantes do constitucionalismo brasileiro. O senhor acredita que o desgaste pelo qual passa a presidente Dilma também é motivado pela crise do presidencialismo?
Gilmar Mendes –
É inequívoco que esse, como se diz politicamente, presidencialismo de coalizão, essa junção de base, se exauriu. Basta ver a multiplicação de partidos e a dificuldade de se somar apoio com alguma consistência programática. As negociações se sucedem e parece que é um quadro em que os agrupamentos políticos continuam insaciáveis.

Folha de S.Paulo – O senhor defende o parlamentarismo?
Gilmar Mendes –
Chegamos hoje a um quadro de comprometimento da governabilidade e precisamos reagir. Temos que ver qual é o modelo, a saída. Veja que fizemos tentativas de intervenção judicial com questão da fidelidade partidária, com a questão do financiamento. A prova de que chegamos ao fundo do poço é o estado de não governabilidade que nos encontramos.

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