Princípio da legalidade

STF reforma decisão que autorizava adicional por cargo comissionado

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20 de março de 2015, 16h52

Por maioria dos votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal considerou que não é possível a incorporação de quintos por servidores públicos em função do exercício de funções gratificadas entre a edição da Lei 9.624/1998 (2 de abril de 1998) e a Medida Provisória 2.225-45/2001 (4 de setembro de 2001).

Entretanto, ao modular os efeitos da decisão, a corte decidiu que os servidores que já receberam os benefícios com base em decisões administrativas de órgãos públicos não terão que devolver os valores.

A matéria, com repercussão geral reconhecida, alcança mais de 800 casos sobrestados em outras instâncias da Justiça. A estimativa do Ministério do Planejamento é de que a concessão dos adicionais provocaria um impacto de R$ 25 bilhões aos cofres públicos, sendo R$ 17 bilhões só no Executivo.

Decisão do STJ
O recurso extraordinário foi interposto pela União contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça que reafirmou entendimento de que é possível a incorporação dos quintos — valor de um quinto da função comissionada por ano de exercício, até o limite de cinco anos, que se incorporava à remuneração — no caso em questão.

No STF, a União sustentou que não existe direito adquirido a regime jurídico e que o acórdão questionado teria violado os princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse público.

No caso, o servidor efetivo que ocupava cargo comissionado ou função gratificada de direção, chefia ou assessoramento tinha direito ao acréscimo de um quinto ou um décimo do salário a cada ano de exercício até o limite de cinco quintos ou dez décimos, ou seja, até conseguir dobrar o valor recebido.

A AGU demonstrou, contudo, que a concessão de novas parcelas adicionais foi proibida pela MP 1595-14/97, depois convertida na Lei 9.624/1998. Mas diversas ações ajuizadas por servidores reivindicavam, na Justiça, o recebimento dos valores referentes a quintos ou décimos até a publicação da Medida Provisória 2.225-45/2001, que transformou as parcelas já concedidas do benefício em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada.

Segundo a AGU, as ações e as decisões que pediam e determinavam a extensão do benefício por mais quatro anos tentavam utilizar medidas provisórias que apenas regulamentavam o pagamento dos adicionais já concedidos para tentar recriar o benefício, extinto pela MP 1595-14/97. Além disso, elas afrontavam o princípio da separação dos poderes, uma vez que representavam intromissão do Judiciário em tema administrativo do Executivo e a criação de despesas não previstas em orçamento.

Julgamento
O ministro Gilmar Mendes, relator da matéria, votou pelo conhecimento do recurso. Ele foi seguido pelos ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. Nesse ponto, ficaram vencidos os ministros Luiz Fux, Celso de Mello, Rosa Weber e Cármen Lúcia, ao entenderem que o recurso refere-se a matéria infraconstitucional.

Em seguida, o ministro Gilmar Mendes votou pelo provimento do recurso. Para ele, o direito à incorporação de qualquer parcela remuneratória já estava extinto desde a Lei 9.527/1997. “A MP 2.225-45/2001 não veio para extinguir definitivamente o direito à incorporação que teria sido revigorado pela Lei 9.624/1998, como equivocadamente entenderam alguns órgãos públicos, mas apenas e tão somente para transformar em Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada (VPNI) a incorporação das parcelas a que se referem os artigos 3º e 10 da Lei 8.911/1994 e o artigo 3º da Lei 9.624/1998”, destacou.

Ele lembrou que, conforme a Procuradoria Geral da República, “em nenhum momento a MP 2.225 estabeleceu novo marco temporal à aquisição de quintos e décimos, apenas transformou-os em VPNI, deixando transparecer o objetivo de sistematizar a matéria no âmbito da Lei 8.112/1990, a fim de eliminar a profusão de regras sobre o mesmo tema”.

Segundo Gilmar Mendes, o restabelecimento de dispositivos normativos (que permitiam a incorporação dos quintos ou décimos e foram revogados anteriormente) somente seria possível por determinação expressa da lei. “Em outros termos, a repristinação de normas, no ordenamento pátrio, depende de expressa determinação legal, como dispõe o parágrafo 3º do artigo 3º da Lei de Introdução do Código Civil”, disse ao citar que a manifestação da PGR foi nesse sentido. 

De acordo com o ministro, se a MP 2.225/2001 não repristinou expressamente as normas que previam a incorporação de quintos, “não se poderia considerar como devida uma vantagem remuneratória pessoal não prevista no ordenamento jurídico”. Ele salientou que a concessão de vantagem a servidores somente pode ocorrer mediante lei em sentido estrito, com base no princípio da reserva legal.

“Embora a MP tenha se apropriado do conteúdo das normas revogadas, mencionando-as expressamente, não teve por efeito revigorá-las, reinserindo-as no ordenamento jurídico”, avaliou o ministro. Ele destacou que a irretroatividade das leis é princípio geral do ordenamento jurídico brasileiro, cuja finalidade é preservar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, em homenagem ao princípio da segurança jurídica.

Dessa forma, o ministro Gilmar Mendes concluiu que, se não há lei, não é devida a incorporação de quintos e décimos. “Não se pode revigorar algo que já estava extinto por lei, salvo mediante outra lei e de forma expressa, o que não ocorreu”. No mérito, o relator foi seguido por maioria, vencidos os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello, que negaram provimento ao RE. Com informações das Assessorias de Imprensa do STF e da AGU.

RE 638.115, MS 22.423, MS 25.763 e MS 25.845.

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