Ajuste desajustado

Ajuste fiscal deve se adequar às prioridades previstas na Constituição

Autor

  • José Marcos Domingues

    é professor doutor da Universidade Católica de Petrópolis professor titular aposentado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e procurador aposentado do Estado do Rio de Janeiro.

20 de maio de 2015, 6h51

O petrolão chamou a atenção. Desmandos gerenciais; superfaturamentos propineiros; corrupção contumaz; aparelhamento político da Petrobras. Prejuízo avaliado e contabilizado. Dezenas de bilhões. Apenas e tudo isso.

Ponta do iceberg, medida padrão de desvios de gestão e insólita parceria para privatização do público, o petrolão (que terá ido longe demais…) convive com o dia a dia da Administração Pública, onde inúmeros outros crimes de lesa pátria são praticados, alguns detectados, poucos remediados e menos ainda os punidos.

Pois no Brasil falta planejamento (embora “determinante para o setor público” — artigo 174 da Constituição); sobram priorizações imorais e resultados ineficientes desafiam o controle de legitimidade e economicidade das contas públicas (artigos 37 e 70 da CF); a Despesa é incontida e a dívida explode; a poupança é negativa e não gera investimento; ultrapassando os 35% do PIB, a carga tributária é de Primeiro Mundo mas os serviços públicos são de Terceiro; a inflação acumulada passa em dois pontos percentuais o topo da meta de 6,5% ao ano; o PIB involui; a recessão instala-se com forte desemprego; e retrai-se mais a pouca renda já mal distribuída. Educação em baixa; violência em alta. Injustiça social e subdesenvolvimento num país cuja Carta Magna propugna a justiça, a inclusão, o desenvolvimento.

Grassa a irresponsabilidade nos quinze anos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Em outra oportunidade (leia aqui) já se comentou sobre a verdadeira guerra empreendida no país contra o Direito Financeiro. De fato, como pode pretender o Estado aumentar impostos e tarifas para o povo pagar depois de desmandar-se na gestão do dinheiro da própria cidadania?

Não obstante, os expedientes do chamado ajuste fiscal se resumem a ilegítimo arrocho. Quanto à Receita, aumento de preços administrados e de contribuições, majoração de impostos. A Despesa necessária e produtiva não se realiza, como provam a dengue epidêmica, o ensino público desmontado e a imobilidade das pessoas e das mercadorias por insegurança e falta de investimentos em infraestrutura. E quanto à Dívida Pública, a pretexto de controle da inflação expande-se ela a custo de juros exorbitantes que incrementam o déficit público e realimentam a inflação indomada. Como se as lições do passado nada ensinassem.

O que se requer é a adequação de prioridades consoante os valores constitucionais, planejando-se investimentos indutores do desenvolvimento socioeconômico da população a ensejar mais geração e recirculação de riqueza; otimização da estrutura e custeio da Administração Pública para servir; eficiente gestão do gasto público, que deve ser equitativo para ser profícuo; consequente redução e redistribuição da carga tributária, que beira a confiscatoriedade e se realimenta na regressividade fiscal.

A solução de ajuste deveria vir com a pausa nos equívocos, respeitando-se o Direito. Afinal, di-lo o STF, é defeso ao Governo submeter a si a Constituição, que não se pode converter em “promessa inconsequente”, sob pena de “gesto irresponsável de infidelidade governamental” (cf. ADPF 45). Nas palavras do STJ, se não há “recursos suficientes para atender a todas as atribuições” (…) o “não desenvolvimento de determinadas políticas públicas acarreta grave vulneração a direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituição” (REsp 1.389.952).

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