Benefício suspenso

Juiz anula anistia de Carlos Lamarca e pede ressarcimento ao cofres públicos

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17 de maio de 2015, 17h22

A anistia dos artigos 8º e 9º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988  tem caráter político-institucional e, por essa mesma natureza, sua competência de concessão legislativa é exclusiva do poder constituinte originário. Sendo assim, os estados não podem ampliar o benefício previsto na Constituição, por falta de competência, assim como o legislador infraconstitucional federal também não pode fazê-lo.

Esse foi o entendimento aplicado pelo juiz substituto da 21ª Vara Federal do Rio de Janeiro, Guilherme Corrêa de Araújo, ao cancelar as portarias de 2007 do Ministério da Justiça que concederam indenização à família do guerrilheiro Carlos Lamarca, morto em 1971 no combate armado à ditadura militar. 

A decisão judicial também questiona portaria do Ministério da Justiça que reconheceu o direito às promoções na carreira militar, concedendo à viúva de Lamarca pensão com proventos de general de brigada e determina "ressarcimento ao erário federal dos valores comprovadamente desembolsados, corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação".

Em sua decisão, o juiz refuta o argumento da família de Lamarca de que o Supremo Tribunal Federal teria reconhecido a possibilidade da Lei 10.559/02 (que regulamenta o artigo 8ª da ADCT) ser mais benéfica 
aos anistiados.

"Fundamental esclarecer que a possibilidade de um regime mais benéfico previsto pela Lei 10.559/2002, como, por exemplo, a previsão de não incidência de imposto de renda sobre as reparações pagas, não significa que ao legislador ordinário tenha sido autorizado alargar as hipóteses de cabimento da anistia, o que representaria verdadeira quebra da hierarquia normativa da Constituição", explicou.

Para o juiz, é até possível cogitar que a lei dê concretude aos benefícios decorrentes da anistia. Mas, segundo ele, não é possível ao legislador alargar as hipóteses de cabimento dessa medida de pacificação social. "Considerando os termos do artigo 8º do ADCT/88, não se vê direito ao regime de anistiado apenas e tão somente pelo fato de determinada pessoa ter sofrido, ainda que em razão de opção política, injusta e danosa perseguição estatal", complementou.

Decisão questionada
A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça questionou, por meio de nota, a decisão judicial. "A decisão proferida no caso em concreto coloca em risco o esforço de reconciliação e o progressivo tratamento construído ao largo de 30 anos, por parte dos sucessivos governos democráticos, dos legados autoritários da ditadura militar e das demais questões ainda pendentes da transição democrática", diz o texto assinado pelo presidente da Comissão, Paulo Abrão.

A Comissão de Anistia concedeu indenização de R$ 100 mil para viúva de Lamarca e seus dois filhos, totalizando R$ 300 mil. "A anistia a Carlos Lamarca, seus dois filhos e sua esposa constitui-se em ato oficial do Estado brasileiro, após rigoroso processo administrativo que também levou em conta decisões judiciais, está integralmente amparada pelo artigo 8º do ADCT da Constituição da Republica de 1988 e pela sua regulamentação na Lei 10.559/02", argumenta o texto do Ministério da Justiça.

A pensão vitalícia para a viúva, Maria Pavan, mulher de Lamarca, equivale ao soldo de general-de-brigada, que na época era de R$ 12 mil. Também foi aprovada em 2007 reparação econômica para Maria Pavan no valor de R$ 902.715,97, a título de anistia política post-mortem a Lamarca, com promoção ao posto de coronel e proventos de general-de-brigada. Os advogados da família de Lamarca afirmaram que vão recorrer da decisão. Com informações da Agência Brasil.

Clique aqui para ler a decisão.
Processo 0018466-29.2007.4.02.5101

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