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Governo federal tenta tipificar terrorismo no ordenamento penal brasileiro

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30 de junho de 2015, 20h02

O governo federal enviou ao Congresso Nacional, na semana passada, dois anteprojetos de lei sobre terrorismo. Um cria o tipo penal da organização terrorista dentro da Lei das Organizações Criminosas e pune quem promover, constituir ou integrar esse tipo de grupo com oito a 12 anos de prisão. O outro cria a ação de indisponibilidade de bens para que se possa declarar o congelamento de bens ou valores de quem foi condenado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) por praticar atos terroristas. Ambos os projetos foram enviados ao Senado com pedido de urgência.

Os dois projetos são de autoria conjunta dos ministérios da Fazenda e da Justiça. Foram apresentados ao Congresso em decorrência da participação do Brasil no Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi, em português, ou FATF, na sigla em inglês). Trata-se de um comitê fundado dentro do G20, mas que tem 36 países — membro e 180 países associados.

O projeto de lei para tipificar o terrorismo é uma demanda antiga de alguns setores, especialmente o Ministério Público Federal. O ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, por exemplo, costuma criticar o que chama de omissão brasileira em relação ao tema. Normalmente a fala é feito durante julgamentos de ações de extradição, em que o extraditando é acusado de terrorismo em outro país, crime que ainda não existe no Brasil.

A discussão costuma ser morna, já que a maioria dos ministros não concorda com a urgência da matéria. Dizem que a maioria dos crimes cometidos por ditos terroristas já estão tipificados no Código Penal, e não seria necessário criar uma lei específica.

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Fato de Brasil ser membro do Gafi exige que tenha leis específicas, diz Vasconcelos.
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O secretário nacional de Justiça do Ministério da Justiça, Beto Vasconcelos, explica que ambas as posições estão certas. Mas o fato de o Brasil ser membro do Gafi exige que o país adote medidas de especialização de sua lei penal para casos de terrorismo, continua o secretário.

Três pontos
Vasconcelos destaca três pontos importantes do projeto que tipifica o terrorismo. O primeiro é que tanto quem planeja quanto quem executa atos terroristas, bem como quem participa e quem financia grupos que promovem o terror, são punidos.

Outro ponto é que só é considerado terrorismo atos que “ocorram por razões de ideologia, política, xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou gênero e que tenham por finalidade provocar o terror”.

Por isso o próprio texto do projeto exclui da tipificação “a conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais ou sindicais movidos por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender ou buscar direitos, garantias e liberdades constitucionais”.

O último ponto é a descrição, em lei, da atuação dos lobos solitários. É o nome que a imprensa internacional deu a quem pratica atos terroristas mas não faz parte da hierarquia de nenhuma organização formal. É como se fosse um recruta de si mesmo: ele se identifica com a ideologia de determinado grupo e decide adotar seu modus operandi, mas não integra a estrutura formal da organização.

Pelo projeto do governo, as penas dos lobos solitários podem ser aumentadas de um terço ao dobro. Caso o crime afete meios de comunicação, transporte, hospitais ou escolas, a pena é aumentada em até um terço.

Congelamento de bens
O segundo anteprojeto obedece a uma resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). O órgão está ligado à estrutura da ONU e reúne 15 países: cinco membros permanentes (Estados Unidos, Rússia, França, Reino Unido e China) e dez membros eleitos para mandatos de dois anos.

A principal função do CSNU é “zelar pela manutenção da paz e da segurança mundial”. Por isso, o conselho aprova resoluções e faz recomendações aos Estados-membros da ONU com o intuito de combater ameaças à paz mundial. O conselho é o único órgão internacional cujas decisões são de cumprimento obrigatório pelos países-membro da ONU.

De acordo com o secretário nacional de Justiça, essas sanções costumam ser congelamento de bens ou proibição de tráfego entre os países-membros da ONU. E o projeto pretende regulamentar um processo por meio do qual as decisões do Conselho possam ser cumpridas.

O texto enviado pelo governo ao Senado pretende criar um rito processual para o cumprimento de sanções impostas pelo CSNU a pessoas físicas ou jurídicas condenadas por terrorismo. Pelo anteprojeto, o Ministério Público tem 24 horas para, depois da decisão do Conselho de Segurança, propor a ação de indisponibilidade de bens perante a Justiça Federal, requerendo tutela antecipada.

Segundo a exposição de motivos da Presidência da República, hoje, essa sanções seguem o rito ordinário estabelecido pelo Código de Processo Civil, “o que acaba por gerar atrasos no cumprimento das resoluções internacionais, prejudicando as investigações de crimes de natureza grave e colocando o Brasil em constante pressão no âmbito internacional”.

O governo explica que o Brasil é membro fundador da ONU e, ao lado do Japão, foi o país que mais vezes foi eleito para fazer parte do CSNU. O órgão existe desde 1946 e o Brasil já foi escolhido para integrá-lo dez vezes. “Isto demonstra a importância de nosso país para o sistema internacional, bem como a relevância que tal órgão tem para o Brasil.”

Clique aqui para ler o anteprojeto para tipificação de terrorismo e aqui para ler a exposição de motivos.

Clique aqui para ler o anteprojeto que cria a ação de indisponibilidade de bens e aqui para ler a exposição de motivos.

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