Escolha profissional

Consultora identifica estudantes que fazem Direito por razões erradas

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20 de julho de 2015, 9h50

Não é nenhuma novidade que muitos estudantes escolhem o curso de Direito por motivos que não garantem o sucesso na profissão. Por muitos anos, por exemplo, o sonho dourado dos pais era o de que o filho fizesse advocacia ou medicina. Até hoje, muitos estudantes optam pela advocacia porque “dá dinheiro”, “dá prestígio” e, quem sabe, “poder”, como outras profissões bem cotadas socialmente.

No entanto, a consultora profissional Shannon Achimalbe identificou outras razões pelas quais estudantes americanos escolhem a carreira de advogado, em detrimento de outras alternativas profissionais, por razões que não são as melhores para quem quer exercer a advocacia. Ela mesmo entrou na advocacia por motivos errados. E, por circunstâncias da vida, se tornou uma consultora profissional, um trabalho em que procura separar o joio do trigo — isto é, distinguir aqueles que não têm ou têm, digamos, vocação para a advocacia. Ela destaca:

O ativista
Ativistas — ou militantes — querem ser advogados para mudar o sistema. Muitos se tornam ativistas porque eles — ou pessoas próximas a eles — sofreram com decisões do sistema judicial, atos da polícia ou qualquer injustiça. Há casos em que a família do estudante perdeu muito dinheiro devido a eficiência do advogado da outra parte, que a “destruiu” no tribunal.

As histórias se seguem. Um estudante conta que, ainda criança, ouviu seus pais chorar e se queixar que tiveram de deixar sua casa e morar em um quarto na casa dos avós. Mais tarde soube que o locador triplicou o valor do aluguel, em violação à lei. Os pais decidiram se mudar porque não tinham dinheiro para contratar um advogado para processar o locador.

Um caso comum é de estudantes que foram vítimas de má conduta policial, principalmente as que foram vítimas de preconceito racial e os que estavam no lugar errado, na hora errada. Agora eles sonham em colocar a polícia “em seu lugar”.

Os ativistas pensam que, se foram advogados, entenderão melhor o sistema. Esperam proteger e educar outras pessoas sobre seus direitos jurídicos. Em muitos casos, querem ser defensores competentes de alguma causa que lhes é cara.

“Eu digo aos ativistas que seus objetivos são nobres, mas não precisam de um diploma de advogado para concretizá-los, embora isso possa ajudar. Eles podem, por exemplo, promover seminários e outros eventos junto com advogados criminalistas e de direitos civis. Ou podem trabalhar com autoridades governamentais ou fazer uma carreira política, se quiserem exercer um papel relevante na mudança do sistema”, afirma a consultora.

O determinado
De uma maneira geral, o estudante determinado já tomou a decisão de ir para uma faculdade de Direito que não está entre as melhores do país e ninguém pode impedi-los de fazer isso. Eles se recusam a reconhecer que a carreira de advogado não é mais o lugar seguro que já foi há algum tempo. Ou estão cientes dos riscos, mas decidiram ir frente de qualquer forma. Tornam-se defensivos, algumas vezes hostis, quando alguém questiona sua decisão.

Eles não pensam que são melhores que os outros porque, para eles, a vida  sempre foi dura e já lhes disseram que deveriam desistir de seus objetivos porque não irão concretizá-los. Eles são impulsionados, então, pelo desejo de provar que essas pessoas “do contra” estão erradas e é bem provável que consigam fazer isso. E quando o conseguem, perdem o ânimo para continuar na carreira.

Esses estudantes gostam de falar sobre as lutas que tiveram e têm de enfrentar constantemente, para justificar um suposto gosto pelas contendas. E de postar mensagens motivacionais na mídia social.

“Como o determinado já tomou sua decisão, não há praticamente nada que se possa fazer para mudar suas mentes. Qualquer tentativa de convencê-los será o mesmo que contrariá-los e isso só irá fortalecer suas decisões. Eu tento mostrar-lhes que existem outras opções de carreira nas quais sua determinação implacável poderia levá-los ao sucesso, mas eles não escutam".

O desacreditado
Esses estudantes chegam a pensar em alternativas para o curso de Direito, mas precisam de uma razão digna para evitar “cair em desgraça”, se anunciarem a desistência. Alguns querem apenas evitar um sentimento pessoal de fracasso. Outros sabem que irão enfrentar duras consequências se desistirem do curso de Direito. Por exemplo, seus pais irão cortar sua mesada ou até mesmo rejeitá-los, de uma ou outra forma, afirmando que eles “não querem nada na vida”. As pessoas mais próximas, incluindo aquelas com um relacionamento amoroso, podem mostrar um certo desprezo.

“Nessas situações, digo a essas pessoas que não é uma desonra mudar seus objetivos profissionais. As pessoas mudam de trabalho ou mesmo de carreira por muitas razões. Algumas vezes por opção própria, outras pelas circunstâncias da vida. Se alguém irá olhar com desprezo para você por causa disso, provavelmente essa pessoa não merece a sua consideração, de qualquer forma”, ela diz.

“Mas isso fica bem pior quando os interesses da família estão em jogo. Muitos pais não aceitam o que eles consideram rebeldia do filho, especialmente quando já gastaram muito dinheiro com escolas e professores particulares, carros e outros mimos. Isso não acontece como em filmes, em que o filho se rebela e os pais e os amigos acabam admirando seu caráter forte e decidido”.

O crente
Esses estudantes também estão determinados a fazer curso de Direito, mas sua motivação é outra: é um dever espiritual. Como os ativistas, eles querem se preparar para ajudar e educar os outros. A maioria estuda Direito e também religião na faculdade ou por conta própria. Frequentam igrejas e se esforçam por ser pessoas boas, moralmente.

E também há o caso, mais raro, do estudante que quer se tornar advogado porque testemunhou algum fenômeno estranho, como um arbusto em chamas do lado de fora de uma sala de tribunal, e o interpretam como um sinal divino. Ou porque tiveram uma “visão”.

“Quando converso com “crentes” sobre os custos da faculdade de Direito e sobre as dificuldades que os bacharéis enfrentam para se inserir no mercado, eles não me apresentam qualquer plano de carreira. Em vez disso, declaram sua fé em Deus ou em um “Plano Divino” e mencionam histórias de sucesso incidentais de outros crentes”, ela diz.

Segundo a consultora, muitas vezes ela tem de sustentar seus argumentos na Escritura. Ela diz a eles para levar em consideração, quando pensam no curso de Direito, as “promessas de falsos profetas”. E tenta explicar que a fé, apenas, não garante sucesso na advocacia. Aliás, a advocacia requer muito trabalho e muita ética, não fé.

“Deus promete a eterna salvação, mas ele nunca prometeu eterno emprego, nem salvação da enorme dívida que você vai contrair para fazer o curso de Direito”, ela diz. Nos EUA, um curso de Direito pode custar US$ 150 mil ou mais. O bacharel que não encontra emprego, logo depois da formatura, irá enfrentar um “inferno” financeiro, por assim dizer.

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