Jurisprudência fiscal

Execução fiscal contra sócio de sociedade de advogados e outras questões

Autores

  • Mary Elbe Queiroz

    é advogada tributarista sócia da Queiroz Advogados Associados pós–doutora em Direito Tributário (Universidade de Lisboa – Portugal) Doutora em Direito Tributário (PUC-SP) mestre em Direito Público (UFPE) professora e presidente do Conselho Jurídico do Ibrei.

  • Antonio Elmo Queiroz

    é advogado sócio do escritório Queiroz Advogados Associados e diretor do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil.

16 de julho de 2015, 9h53

Spacca
É uma característica da sociedade empresária a separação patrimonial entre os bens da entidade e dos seus sócios, sendo mesmo elemento basilar para a sociedade limitada.

Porém, por disposição legal, a sociedade de advogados não pode incorporar esse atributo da sociedade limitada, pois há previsão de que “o sócio responde subsidiária e ilimitadamente pelos danos causados aos clientes por ação ou omissão no exercício da advocacia, sem prejuízo da responsabilidade disciplinar em que possa incorrer” (artigo 17 da Lei 8.906/94, Estatuto da Advocacia).

Com esse fundamento, da impossibilidade legal de haver autonomia patrimonial, ocorreu um redirecionamento de uma Execução Fiscal para os sócios de uma sociedade de advogados.

Houve recurso apontando que, para haver responsabilização tributária via redirecionamento, teria que ter sido apontado excesso de poderes ou infração de lei ou contrato social por parte dos sócios, como prevê a responsabilização tributária do artigo 135 do CTN.

Contudo, o redirecionamento foi mantido por Turma do TRF/4ª Região, sob o fundamento de que, para sociedade de advogados, a norma a invocar não é o CTN mas o Código Civil; assim ementado:

Agravo de Instrumento nº 5013225-28.2015.404.0000/RS (divulgado em 10.06.2015)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. SOCIEDADE SIMPLES.

1. A devedora é sociedade constituída por advogados, para o exercício da sua profissão, e, portanto, sociedade simples, destituída de natureza empresária, na qual o exercício da atividade da sociedade consiste basicamente no próprio exercício da profissão de seus sócios.

3. A sociedade de advogados não dispõe da faculdade de optar pela forma da sociedade limitada, já que a lei expressamente determina a impossibilidade de limitação da responsabilidade dos advogados sócios (art. 17 da L. 8.906/94). Ademais, é sociedade evidentemente destituída de natureza empresarial, não se socorrendo da abertura da sociedade simples à tipologia limitada, facultada pelo art. 983 do CC.

4. Aplicável ao caso o disposto no art. 1.023 do Código Civil, que prevê: Se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo, na proporção em que participem das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária.

5. Agravo de instrumento desprovido.

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Novos critérios jurídicos
Segundo o artigo 146 do CTN, “a modificação (…) nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução”.

No caso abaixo, essa norma foi discutida em caso de contribuinte que já tinha sofrido uma anterior fiscalização por parte do fisco federal em 2009, quando ficou estabelecido que a subvenção que recebia de Estado da federação era para investimento; sendo que, em posterior fiscalização em 2011, veio a ser autuado sob o fundamento que seria uma subvenção para custeio, portanto sofrendo a tributação de IRPJ/CSLL.

O contribuinte pleiteou que, pelo menos, o novo entendimento só se aplicasse para os fatos geradores a partir de 2011, nos termos do artigo 146 do CTN, pois só a partir dessa data teve conhecimento do novo critério jurídico, já que até esse ano estava confiando na apreciação anterior do fisco.

Analisando o caso, Turma do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais manteve decisão de DRJ, que considerou que o novo entendimento do fisco só não poderia ser aplicado para o ano de 2006 pois não autuado na primeira fiscalização, mas não gerando efeitos sobre as fiscalizações posteriores a essa data; assim ementado:

Acórdão 1401-001.041 (publicado em 11.06.2015)

VÍCIO MATERIAL. MUDANÇA DE CRITÉRIO JURÍDICO. ART. 146 DO CTN. ANO-CALENDÁRIO DE 2006.

Mudança de interpretação da autoridade fiscal, que em autuação pretérita considerou o suporte fático analisado como subvenção para investimento resultando na ausência de lançamentos de IRPJ e CSLL, e em procedimento fiscal posterior, relativo ao mesmo ano-calendário e contribuinte, considerou o mesmo suporte fático como subvenção para custeio ou operação, caracteriza a modificação de critério jurídico e esbarra nos limites impostos para a alterabilidade do lançamento previstos no art. 146 do CTN, ensejando nulidade dos lançamentos em decorrência de vício material.

Voto Vencido (…)

Conforme visto na análise do recurso de ofício, o colegiado julgador de 1ª instância afastou o lançamento do IRPJ e da CSLL, relativamente ao ano-calendário de 2006, porque verificaram que, de fato, houve mudança de critério jurídico em relação ao período em questão.

Em sede recursal, a contribuinte pleiteou a extensão deste entendimento para os demais anos-calendário (2008, 2009 e 2010). (…)

Nesta senda, entendo que, se fosse possível alterar posicionamento sobre situação jurídica antes deferida, a Fazenda Pública estaria impondo total insegurança jurídica aos contribuintes, os quais se encontram sob o constante risco de no transcorrer de sua vida ou no desenvolvimento de sua atividade serem surpreendidos por um novo entendimento do Órgão Fiscal, imputando-lhe obrigações tributárias mesmo após ter acolhido posicionamento em sentido contrário, expresso por ato administrativo editado pela própria Fazenda Pública.

Ante tal atuação, restaria totalmente rompida a boa-fé que deve prevalecer na relação entre contribuinte e Fisco.

Diante do exposto, considero que os lançamentos de IRPJ e CSLL, referentes aos anos-calendário de 2008, 2009 e 2010, também deveriam ser afastados por nulidade absoluta.

Voto Vencedor (…)

Permissa venia, não vejo como o fato de a classificação da fiscalização de 2009 possa influir na fiscalização de 2011, quando o objeto da primeira fiscalização não tinha por escopo a matéria especificamente tratada na segunda, instaurada mediante autorização específica da Delegacia da Receita Federal.

Na verdade, o lançamento constitui norma individual e concreta de tributação. A ausência de lançamento em 2009 é a ausência dessa norma individual e concreta, que somente veio a ser editada com o lançamento de 2011.

Nesse sentido, não há vinculação entre um posicionamento tácito de “não lançamento” na primeira fiscalização, com a oposição expressa ocorrida na segunda, principalmente se considerado, novamente aqui, a autorização expressa e pontual conferida à Autoridade Fiscal para realizar o lançamento de 2011, conforme permissivo do art. 149 do CTN.

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Decisões variadas
a) No Acórdão 9101-001.839 (publicado em 14.05.2015), a Câmara Superior de Recursos Fiscais do Carf decide que, como a lei da CSLL não dispõe de preceito específico, não cabe tomar de empréstimo da lei do IRPJ a previsão acerca da indedutibilidade de despesa; assim ementado: “a base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido é o resultado do período de apuração com observância da legislação comercial e com os ajustes previstos na legislação específica. Descabe a adição de despesas consideradas desnecessárias, com fulcro unicamente em norma da legislação do Imposto de renda, pois a base de cálculo da contribuição não se confunde com o lucro real tributado pelo imposto de renda”.

b) No REsp 1.413.421 (publicação em 29.06.2015), analisada a mudança, feita por Município, da cobrança anual para mensal do ISS de sociedade de advogados; tendo sido dado provimento monocrático ao recurso, já que não poderia ser alterado nenhum traço do tratamento tributário diferenciado; assim fundamentado: “com efeito, o acórdão recorrido encontra-se em desconformidade com a jurisprudência desta Corte, a qual firmou-se no sentido de que a sociedade uniprofissional de advogados de natureza civil, qualquer que seja o conteúdo de seu contrato social, goza do tratamento tributário diferenciado previsto no art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei 406/68, não recolhendo o ISS com base no seu faturamento bruto, mas sim no valor fixo anual calculado de acordo com o número de profissionais que a integra”.

Autores

  • Brave

    é advogada e professora, pós-doutora em Direito Tributário pela Universidade de Lisboa, e doutora pela PUC-SP; mestre em Direito Público pela UFPE; presidente do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil; presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários; membro imortal da Academia Brasileira de Ciências Econômicas, Políticas e Sociais; membro do Conselho Jurídico da Fiesp (Conjur); sócia do escritório Queiroz Advogados Associados e Palestrante da FocoFiscal.

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    é advogado, sócio do escritório Queiroz Advogados Associados e diretor do Centro de Estudos Avançados de Direito Tributário e Finanças Públicas do Brasil.

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