Polêmica dos vetos

De como nem todos gatos são pardos no novo Código de Processo Civil

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9 de janeiro de 2015, 7h09

Depois de minha coluna sobre a ponderação e a indicação de veto do aludido parágrafo segundo do artigo 487 (ler aqui) do novo Código de Processo Civil, a polêmica invadiu os lares e bares do país todo. Partidários da ponderação ficaram irritadíssimos. E ficaram preocupados no sentido de que, por alguma razão, também poderia ser vetado o parágrafo anterior (parágrafo 1º), o que, concordo, seria o caos (maior ainda).

Quero deixar claro que minha crítica é — e foi — exclusivamente direcionada ao paragrafo segundo do artigo 487, que trata da ponderação. Meu texto é muitíssimo claro nesse sentido. Mas, para não deixar dúvidas, nem de longe tenho qualquer restrição a qualquer outro item ou parágrafo do aludido artigo 487. Aliás, um dos melhores dispositivos do novo CPC é o parágrafo primeiro, assim vazado:

Art. 487. São elementos essenciais da sentença:

(…)

§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:

I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;

II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;

III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;

IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;

V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.

Trata-se de um dispositivo que visa a proporcionar às partes um maior controle acerca das decisões judiciais. No mundo todo clama-se por maiores controles nas fundamentações. A Corte Europeia dos Direitos Humanos considera a fundamentação um direito fundamental. O parágrafo primeiro do artigo 487 é o corolário da democracia.

Quem quer democracia e respeito pela Constituição,  mormente no que tange ao principio de que “todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido” e a garantia da fundamentação (artigo 93, inciso IX da CF) — princípios que devem ser da estima de qualquer governo, especialmente o governo atual, deve lutar pela preservação do paragrafo primeiro.

No fundo, a equação é a seguinte: enquanto o parágrafo primeiro apresenta mecanismos de controle das decisões que devem ter a simpatia de todos aqueles que sentem na pele o problema do decisionismo, o parágrafo segundo (o da ponderação) coloca-se como antítese, na medida em que relativiza tudo o que o paragrafo primeiro garante. Sem o parágrafo primeiro o CPC desaparece, ficando pior que o atual; sem o parágrafo segundo (o da ponderação), o CPC se fortalece e se coloca de forma coerente com outros mecanismos de controle das decisões; mas, sem os dois parágrafos, aí não tem nem mais CPC.

Há que ter muita calma nessa hora. Muita gente aproveitando a fumaça para misturar alhos com bugalhos. E, assim, poder dizer que "todos os gatos são pardos". Eu digo que não: há pardos e não pardos! 

Fazer Direito no Brasil é coisa difícil mesmo. Escrever sobre Direito é mais difícil ainda. E ser compreendido é tarefa hercúlea. Quase impossível. 

*Artigo alterado às 11h34 desta sexta-feira (9/1) para correção de informação. No texto consolidado 
com os ajustes promovidos pela Comissão Temporária do Código de Processo Civil o artigo mencionado no texto deixou de ser o 486 e passou a ser o 487.

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