Maçã mordida

Consumidores processam Apple nos EUA por publicidade enganosa

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2 de janeiro de 2015, 9h30

A virada do ano para a Apple não foi só de celebrações pelos ótimos resultados em suas demonstrações financeiras. Na terça-feira (30/12), dois consumidores da Flórida moveram uma ação, em um tribunal federal da Califórnia, onde está a sede da Apple, acusando a empresa de publicidade enganosa e táticas injustas e fraudulentas de negócios, de acordo com a petição inicial — um processo que, por si só, irá afetar negativamente o índice de satisfação dos consumidores.

A primeira acusação é de que a empresa engana os consumidores ao anunciar a capacidade de 16 GB para o iPhone, iPad e iPod. Os demandantes Paul Orshan e Christopher Endara alegam que a Apple omite, na divulgação dos produtos, a informação de que os sistemas operacionais e outros softwares pré-instalados nos dispositivos, especialmente quando o consumidor aceita a orientação da empresa para fazer o upgrade para o iOS 8, abocanham uma porção considerável da capacidade de armazenamento dos aparelhos.

Os advogados dos demandantes, que pedem ao juiz que certifique o processo como ação coletiva para que outros consumidores possam aderir a ela, alegam que os usuários comuns não esperam que haja uma diferença tão significativa entre a capacidade anunciada do dispositivo e a real capacidade disponível para uso — uma perda de 18,8% a 23,1%, dependendo do dispositivo, conforme o quadro apresentado na petição:

Dispositivo

Capacidade anunciada

Capacidade disponível

Capacidade indisponível ao usuário

 

GB

GB

GB

%

iPhone 6+

16

12,7

3,3

20,6%

iPhone 6

16

13,0

3,0

18,8%

iPhone 5

16

13,1

2,9

18,1%

iPad Air

16

12,6

3,4

21,3%

iPad

16

12,6

3,4

21,3%

iPod

16

12,3

3,7

23,1%

O advogado Gregory McNeal explica, em artigo para a revista Forbes, que parte do problema deriva do fato de a Apple segregar o espaço de armazenamento em duas partições: a partição mídia e a partição raiz. A partição mídia pertence ao consumidor, para armazenar suas fotos, vídeos, aplicativos e outros dados. A partição raiz pertence à Apple. E não é acessível ao consumidor, a não ser que ele “arrombe” essa partição para conseguir mais espaço. Por isso, há uma certa capacidade de armazenamento que nunca é usada pelo consumidor.

Nesse caso, o logotipo da Apple talvez faça sentido: é uma maçã abocanhada. Isto é, um dispositivo tem 16 GB menos cerca de 3 GB subtraídos em uma única “mordida”. Para ficar claro, o problema não é realmente o espaço ocupado pelo sistema operacional e softwares pré-instalados, porque são ferramentas indispensáveis. O problema é não esclarecer o consumidor, em seu material publicitário, que o dispositivo tem 16 GB, mas só cerca de 13 GB de espaço útil.

“Cada gigabyte de armazenamento que a Apple subtrai do consumidor significa uma perda de espaço para manter de 400 a 500 fotografias de alta resolução”, diz a petição.

Essa perda de espaço, dizem os demandantes, é agravada pelo fato de esses dispositivos da Apple não aceitarem o uso de cartões de memória, como o fazem dispositivos de algumas concorrentes. Além disso, os dispositivos da Apple também não permitem o uso de unidades de armazenamento de outras fornecedoras, transferências de arquivos para PCs, usando o utilitário “gerenciador de arquivos”, nem a utilização de armazenamento em nuvem de outras fornecedoras que não o da própria Apple.

Daí advém a segunda acusação, a de táticas injustas e fraudulentas de negócios. Normalmente, diz a petição, o consumidor percebe a falta de espaço para armazenamento quando está tirando fotos de um recital da neta, filmando o casamento da irmã ou a competição esportiva de um filho. Nesse momento de desespero, recebe uma mensagem da Apple sugerindo, como única solução, a utilização do iCloud, o sistema de armazenamento da Apple, que pode ser alugado por valores que variam de US$ 0,99 a US$ 29 por mês.

No caso dos usuários que fizeram o upgrade para o iOS 8 e se arrependeram depois que descobriram a maior perda de capacidade, a Apple não permite reverter a instalação para o iOS 7 ou qualquer outro sistema operacional.

Curiosamente, diz a petição, a agressiva campanha publicitária da Apple em favor do iOS 8 tem como slogan “O maior iOS já lançado” — embora a empresa não tenha pretendido que os consumidores entendessem essa declaração literalmente.

De acordo com a petição, esse é uma tática de negócios idealizada para forçar a aquisição dos serviços de nuvem da Apple, ao mesmo tempo em que elimina a concorrência, porque restringe as opções dos consumidores.

Consultada pelos jornais, a Apple preferiu não se pronunciar sobre a ação, pelo menos por enquanto. De qualquer forma, já se sabe que além de se defender na Justiça, a Apple terá um trabalho considerável de RP, para sanar possíveis prejuízos à imagem da empresa e de seus produtos.

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