Questão trabalhista

"Hoje, no Brasil, o Judiciário é a grande face da distribuição de renda"

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15 de fevereiro de 2015, 6h04

Spacca
Lívio Enescu é uma figura que chama a atenção nos encontros de operadores do Direito de São Paulo. Suas gravatas borboleta são conhecidas tanto entre advogados quanto entre a magistratura, com quem ele tem bom relacionamento.

Presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado de São Paulo (biênio 2014 — 2016), Enescu tem posições firmes sobre as relações entre empresa e empregado. Ele avalia, por exemplo, que a mudança alcançada com a Emenda Constitucional 45, de 2004, tornou mais ampla a área de atuação dos advogados — que ele passou a liderar. A Justiça do Trabalho, lembra ele, não só cuida das relações de emprego, mas das relações de trabalho: “Essa advocacia passa a ter muita pujança, estabelecendo hoje, na minha opinião, a maior classe média da advocacia em todo o país”, assinala.

Filho de imigrantes fugidos do stalinismo na Romênia, que, por acaso, tiveram como destino de fuga o Brasil, o advogado recebeu a revista eletrônica Consultor Jurídico em seu escritório, no centro de São Paulo. No encontro, falou sobre questões que vão da rearticulação da própria categoria — a AATSP conta apenas 800 associados, enquanto o estado tem cerca de 100 mil advogados trabalhistas — à relação da advocacia trabalhista com os tribunais e com os clientes. Enescu também falou sobre as implicações do Processo Judicial eletrônico e a descentralização do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.

Apesar de não advogar na área esportiva, Enescu tem o esporte como peça fundamental para a construção das relações sociais e, também, da própria democracia. Tanto que o estabelecimento de atividades festivas e de cunho esportivo são pautas essenciais de sua gestão à frente da AATSP.

Na conversa com a revista, ele relembrou como foi parar na advocacia e, depois, na militância da categoria trabalhista. “Vi que a área trabalhista possibilitava colocar ideologia junto com o ferramental do Direito”, rememora.

Com 57 anos, Enescu acumula o cargo de presidência da Comissão do Advogado Assalariado, e as vice-presidências da Comissão de Direitos e Prerrogativas e da Comissão de Direito Desportivo da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil.

Leia a entrevista:

ConJur — Quais são os pontos prioritários da advocacia trabalhista?
Lívio Enescu —
Na questão trabalhista há primeiro o preconceito. A questão do capital e trabalho sempre foi vista pela questão de defesa dos direitos dos trabalhadores. Na época da ditadura militar, apesar de não terem mexido no direito dos trabalhadores, não se permitia a organização deles em sindicatos e centrais; se permitia, combatia e criminalizava a atuação. No seu bojo, temos a advocacia trabalhista — que sempre foi tida como uma advocacia menor, no conjunto da advocacia geral. Com o crescimento da Justiça do Trabalho em todo o país, há o crescimento da advocacia trabalhista. Em São Paulo, por exemplo, 100 mil advogados que são cadastrados trabalhistas nos dois Tribunais Regionais do Trabalho: o da 2ª Região, que é o tribunal da capital, Baixada Santista e grande São Paulo, e no da 15ª Região, que é o tribunal do interior. Ainda falta muita coisa para ser estabelecida na luta dos advogados.

ConJur — Houve uma mudança estrutural na advocacia trabalhista em 2004, com a Emenda Constitucional 45?
Lívio Enescu —
Sim. A gente percebe a advocacia trabalhista hoje muito pujante. A lei trabalhista mudou. Com a constitucionalização e a reforma, mais jovens que vêm da academia vão para advocacia trabalhista, para Procuradoria do Trabalho, para magistratura trabalhista, ou seja, existe uma abertura de campo muito grande. O advogado trabalhista, diferentemente do advogado normal, tem uma ida ao judiciário muito maior. É o advogado que mais participa de audiências, quase que diárias.

ConJur — Isso acontece mesmo com chegada do processo eletrônico?
Lívio Enescu —
Sim, porque na Justiça do Trabalho as audiências de conciliação são obrigatórias. Além disso, há muitas audiências, já que, nessa área, a prova é essencial. Oitenta porcento das demandas trabalhistas são por conta de horas-extras e equiparação salarial que precisam de prova em sede de audiência. Já as outras carreiras nem tanto, porque é só ver se a lei foi cumprida ou não. Essas questões de Direito não precisam nem de audiência.

ConJur — Em sua campanha para a AATSP, a necessidade de dinâmica social e esportiva ficaram em evidência. Quais são os planos quanto a isso?
Lívio Enescu —
A incivilidade da dinâmica social paulistana é percebida na relação entre os advogados, e também entre os advogados e os operadores do Direito. Não digo que seja uma relação muito difícil, mas há uma relação não muito amistosa com a magistratura. É algo que precisa ser construído. É necessário construir pontes e tirar muros, e para isso tem que ter a associação, como a gente diz na gíria, quebrando o gelo e trazendo mais os advogados para o seu ambiente dentro da associação, estabelecendo dinâmicas sócio-culturais e desportivas. Na questão desportiva, tem que dar ao advogado também o lazer, propiciando a ele mais qualidade de vida. Essa é a primeira preocupação. Outra é a defesa intransigente dos direitos e prerrogativas dos advogados.

ConJur — Quais são os principais problemas que o senhor vai enfrentar nessa gestão?
Lívio Enescu —
O principal está na relação com os juízes e com os servidores. Porque tem muito endurecimento e muita truculência. Isso se dá pela tensão que os juízes têm na carreira. Com o excesso de trabalho, eles são atingidos, como nós, na questão da insegurança na cidade, problemas de mobilidade urbana, entre outros.

ConJur — O que isso tem a ver com o juiz especificamente?
Lívio Enescu —
O juiz trabalhista tem uma atuação e uma participação junto com as partes e com os advogados que é muito mais intensa que o juiz do cível e do crime, que têm menos audiências. No momento em que há relações humanas muito próximas e, no caso, com antagonismo de propostas, o juiz administra isso e se vê em uma situação tensionada. Ele tem que estar muito sóbrio, muito bem equipado cultural e tecnicamente, para poder dar uma resposta. Isso gera tensão porque o juiz faz 25 audiências por dia. Ninguém tem, fora da Justiça do Trabalho de São Paulo, 25 audiências por dia. É uma carga de trabalho muito grande. Além disso, o juiz tem despachos e a administração das suas secretarias.

ConJur — O Processo Judicial eletrônico (PJe) ainda é visto como uma problema para advogados trabalhistas?
Lívio Enescu —
O PJe vem de uma forma açodada. O acesso à Justiça é um dos maiores bens da República. A mudança do sistema deve ser feita com calma, pois o advogado não está familiarizado com essa tecnologia. Há preocupações, tanto da associação dos advogados trabalhistas, como das outras associações e a Ordem dos Advogados do Brasil no sentido de preservar muita a segurança e garantir o acesso à Justiça. Os problemas mais pontuais desse processo são as questões da ampla publicidade, dos relatórios de interrupção e a adequação a suspensão de processos. Nós estamos vivendo no papel há quase 600 anos em um processo que também criou raízes. Queremos que essa transição seja paulatina.

ConJur — Uma reclamação quase unânime da advocacia trabalhista é a fragmentação dos fóruns em vários pontos da cidade de São Paulo. Por que a categoria vê isso como um problema?
Lívio Enescu —
A criação de vários fóruns contraria a grande luta da advocacia trabalhista em relação à jurisdição, que é o âmbito da aplicação da lei ao caso concreto. Sempre quisemos ter um só fórum trabalhista. Antes nós tínhamos cinco fóruns, passamos a ter só um e agora voltamos a ter vários. O problema de mobilidade urbana é tão grande em São Paulo que você não consegue fazer audiência em todos os fóruns. E isso faz com que advogado que tem uma advocacia mais artesanal — ele e o sócio ou ele sozinho — não possa se dividir em vários advogados para atuar. É muito falso dizer que haverá uma nova advocacia no bairro, porque a advocacia trabalhista é muito especifica. Dificilmente o advogado do bairro vai se valer da contiguidade do fórum e ganhar esse cliente.

ConJur — Em médio ou longo prazo isso não se reverteria?
Lívio Enescu —
Não, porque o advogado tem o seu escritório em um lugar só. E porque o advogado de bairro vai continuar, por exemplo, sendo advogado criminal, advogado privado. Ele tem o perfil de atender vários tipos de causa. Nós não, nós somos só trabalhistas.

ConJur — Há uma mudança, com o tempo, no tipo de causas que a advocacia trabalhista defende?
Lívio Enescu —
Hoje existe mais a questão da prestação do serviço. Houve uma migração do setor primário industrial para prestação do serviço em São Paulo e no interior, por conta da vocação dos locais. O interior ainda preserva suas fábricas, como no caso da tecelagem. A cidade de São Paulo, não. A melhor qualificação dos trabalhadores leva a uma mudança na dinâmica do trabalho, mas não nas causas, pois continua havendo demanda de horas extras, equiparação salarial, direitos normativos que são os direitos atinentes à organização dos seus sindicatos. E uma categoria pode ter mais direitos que a outra, de acordo com a luta dos seus respectivos sindicatos.

ConJur — Há uma percepção de fora da área que a Justiça Trabalhista acaba tutelando quase todas as relações de trabalho.
Lívio Enescu —
E essa impressão é correta, é valida e é extremamente democrática. Ou seja, a questão do negociado nunca pode prevalecer ao legislado. O que temos hoje de construção jurídica com a constituição federal, com a CLT [Consolidação das Leis Trabalhistas] e com os direitos normativos, e a negociação dos sindicatos dos empregados e dos empregadores devem ser mantidos na integra. Eu sou pela manutenção do status quo legislativo. Essa questão do negociado onde os sindicatos podem negociar e se sobrepor ao legislado para mim é falacioso, antidemocrático e anterrepublicano. O negociado entre sindicatos de trabalhadores e sindicatos patronais ou entre patrões e empregados jamais pode se sobrepor ao legislado.

ConJur — Como o senhor encara a questão dos direitos indisponíveis?
Lívio Enescu —
Não é possível ter a visão parcial do processo histórico. A visão é ampla. Se olharmos a dura legislação brasileira trabalhista e não para a questão do hermetismo, vemos um processo muito melhor do que os outros países. A Argentina flexibilizou e hoje é um lixo. Os países que se flexibilizaram, como a Espanha, hoje têm taxa de desempregos terríveis. O Brasil, na manutenção, tem hoje taxa de desemprego baixíssima. 

ConJur — E por que não pode haver um contrato entre patrão e empregado, por exemplo, com um horário de almoço menor, no qual o trabalhador faça um intervalo de almoço de 15 minutos para voltar para casa mais cedo?
Lívio Enescu —
Alguns sindicatos preveem os horários móvel e flexíveis; jornada móvel e intervalo de meia hora, por exemplo. A Justiça não vê com bons olhos. Eu encaro com muita desconfiança, porque criar um horário móvel onde na sua vida, na sua família, o bom seja estar no lazer no final de semana, e a empresa pode falar: “Não. O seu lazer é de segunda.” O seu filho está na escola, sua mulher está trabalhando, você não tem nada para fazer na segunda-feira, você quer usar o seu tempo melhor. Então, eu acho que é discutível. Eu sou contra o horário móvel e o horário flexível. Porque o fim de semana se instituiu como lazer, é bíblico. Ele é cultural. Eu acho que a ruptura de paradigma é uma ruptura muito complicada.  

ConJur — O senhor vê com maus olhos a questão da terceirização?
Lívio Enescu —
Completamente. A terceirização é a colocação de trabalhadores de classes diferentes no mesmo ambiente de trabalho. É a criação de cidadãos de primeira e segunda classes. Eu sou absolutamente contra a terceirização. E aquele que se vale dela responde solidariamente e subsidiariamente segundo decisão do Tribunal Superior do Trabalho.  Não existe uma boa terceirização. Porque não tem razão de ser.

ConJur — Como assim?
Lívio Enescu —
Se você quer ter uma empresa em que os trabalhadores vistam a camisa, eles têm que ser empregados da empresa. Se há terceirização, já tem um vício de origem na sua atividade comercial.

ConJur — Mas existe, dentro da categoria, quem defenda a terceirização?
Lívio Enescu —
Sim. Existem advogados empresariais que defendem a terceirização. Eles dizem que isso possibilita mais dinamismo dentro da empresa, a empresa fica menos inchada. Esse é o argumento deles, que é falacioso.

ConJur — A relação dos trabalhadores nas grandes obras do PAC é temerária?
Lívio Enescu —
Hoje sim. Eu parto de um pensamento ideal, no qual todos os empregos tenham tudo o que o bom emprego tem que ter: meio ambiente de trabalho de qualidade, equipamentos de proteção individual e coletivos, educação dentro do ambiente de trabalho, lazer, cultura e salário dignos para os trabalhadores e suas famílias. É o que chamo de desenvolvimento sustentável.

ConJur — A advocacia trabalhista consegue atuar nessa meta?
Lívio Enescu —
Com certeza. Na medida em que o advogado incomoda o capital nas medidas trabalhistas, ele se corrige; à medida em que se provoca fiscalizações do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego e leva ao Judiciário, há melhoria para o trabalhador. O capitalista começa a ver que isso não dá lucro, porque ele perde muito dinheiro na área trabalhista. O Judiciário hoje, no Brasil, que é um país muito litigioso, é a grande face da distribuição de renda também. Ele possibilita comida no prato do trabalhador. De demandas de saúde, à educação, cultura, aquisição imobiliária, aquisição de bens de consumo duráveis e semiduráveis.  Outra coisa, que é um paliativo, é que as correções trabalhistas são melhores que o mercado financeiro. O teto trabalhista tem uma correção superior ao mercado. O crédito trabalhista é um crédito importante. As correções trabalhistas são maiores que as correções do cível, por exemplo.

ConJur — O capital parece se adaptar também à morosidade da Justiça. E muito se fala que o trabalhador acaba ganhando muito na Justiça, mas que ele demora para receber. Existe uma média razoável de tempo?
Lívio Enescu —
Algumas reformas legislativas, junto com a atuação da magistratura na duração razoável do processo, diminuem esse número. Antigamente você tinha um processo que demorava de seis a oito anos. Hoje, um processo demora dois anos. Fica difícil apurar uma média de tempo sem dados estatísticos na mão. Mas têm julgamentos em seis meses e no tribunal regional, em um ano. Se a demanda vai à Brasília [no TST], pode demorar entre dois ou três anos. Mas nos Tribunais Regionais do Trabalho é muito rápido. E com o novo Código de Processo Civil, a tendência é acabar com os recursos repetitivos, o que trará mais celeridade processual. Nós estamos conseguindo exigir a duração razoável do processo.

ConJur — Como o senhor avalia os ministros do TST terem feito um abaixo assinado contra a terceirização?
Lívio Enescu —
É para isso que a Justiça do Trabalho existe. A terceirização não é boa.  Existe hoje um Tribunal Superior do Trabalho com uma nuance mais progressista, mais pró-trabalhadores. Os últimos indicados para ministros pelo governo Dilma são ministros mais sociais. Portanto, isso é um ato progressista. É um ato de manutenção da qualidade do emprego, do trabalhador respondendo para o seu real empregador. Ou seja, se o trabalhador não responde para o seu real empregador, algum “pulo do gato” tem aí. A empresa de terceirização paga todos os direitos? Ela dá todos os direitos da convenção coletiva? Então, por que ele vai servir a dois patrões?

ConJur — Quais dois patrões?
Lívio Enescu —
O dono da terceirização e o dono da tomadora do serviço, que é a empresa que recebe o empregado no seu chão de fábrica.

ConJur — O que o associado à AATSP pode esperar da sua gestão?
Lívio Enescu —
O associado quer mais combatividade na defesa dos direitos e prerrogativas, prestação de serviços nos fóruns, convênio com empresas, entre outros benefícios. Além disso, quer assembleias e audiências públicas para discutir problemas pontuais da profissão.

ConJur — E como é que o senhor vai conseguir fazer isso?
Lívio Enescu —
Auditando, sensibilizando, começando campanhas, tendo uma atuação firme. A associação, quando tiver uma atuação firme na defesa dos interesses da categoria, vai estimular as pessoas a se associar.  

ConJur — Como o senhor enxerga os julgamentos em bloco feitos pelo TST?
Lívio Enescu —
Se os temas são iguais e a lesão do direito é igual, isso não fere o princípio da jurisdição. Porque são planos econômicos e processos absolutamente iguais, que tem que ter, por uma questão de segurança jurídica, uma resposta. São questões de direito e lesões de direito de grupos grandes que têm que ter o mesmo julgamento. Então, não vejo problema.

ConJur — Como é para o advogado trabalhista o processo de arbitragem e o processo de mediação?
Lívio Enescu —
Eu sou absolutamente contra a arbitragem e mediação. Porque é solução de processo fora do judiciário. Eu defendo o monopólio estatal do Judiciário Trabalhista. A gente criou uma cultura em 70 anos [da CLT], essa cultura é vitoriosa, é exitosa. Nós tentamos resolver fora do Judiciário com as comissões de conciliação prévia, que eram feitas no sindicato, e foi uma tragédia.

ConJur — O senhor acha que qualquer mediação que esteja fora do processo estatal é danosa por si só?
Lívio Enescu —
No caso do processo estatal, não é um problema na origem, mas eu não entendo que possa haver isonomia entre as partes fora do Estado. Não é um problema para advocacia porque o trabalhador está culturamente ligado à contratação de um advogado.

ConJur — E com a mediação é a mesma coisa? Porque na mediação você não pode ter um julgador…
Lívio Enescu —
Busca o consenso. Isso é semântica. Eu defendo a manutenção da Justiça do Trabalho como está hoje. Nenhuma solução fora dela.

ConJur — O senhor lida muito com o movimento sindical. Mas e na advocacia trabalhista, tem muito pelego?
Lívio Enescu —
Não. Mas tem o cara que faz política com o tribunal, que puxa o saco. O peleguismo é o advogado “aderir” ao tribunal sem discutir se isso é bom para o conjunto dos advogados.

Ele adere na inação, não construindo uma pauta, e não sendo sensível ao dia a dia da advocacia e nem às reivindicações da classe. A inação é o peleguismo. Não ir contra o interesse dos outros é o peleguismo. O pelego é o cara que atua de forma absolutamente diversionista, confundindo a sua base e atuando na defesa dos interesses dos empregadores. A inação é incompetência.

ConJur — Como o senhor enxerga a CLT, responsável pela criação de sindicatos únicos?
Lívio Enescu —
Temos o hibridismo no Getúlio Vargas. Existe uma leitura histórica do Getúlio de fora do processo da fase em que ele é fascista, que ele condena a Olga Benário, e a fase que ele é extremamente progressista contra uma UDN fascista. Estou falando de um homem de 15 anos de poder. Portanto, existe esse hibridismo entre a origem dele e o suicídio. A CLT são várias leis, e muitas leis que foram sendo adaptadas. A consolidação são leis extremamente progressistas, de um movimento sindical de base que fizeram esse conjunto de legislação. Entre 80% e 90% dessas leis são progressistas. Portanto, eu defendo ainda a manutenção da união sindical. Acho que nesse momento eu defendo os metalúrgicos e no futuro a pluralidade de representação dos trabalhadores. O que eu não posso é ter enfraquecimento da organização sindical, pois isso é o caos. E para os sindicatos não pelegos, a pluralidade abre sindicatos pelegos, sindicatos que a gente chama “sindicato de cartório”. A pluralidade abre sindicatos.

ConJur — E quais são as proposições, se é que existem para melhorar a CLT?
Lívio Enescu —
Para melhorar eu não vejo. Quem quer melhorar não precisa mudar a legislação, pode fazer pacto com os sindicatos. Os sindicatos podem fazer toda a solução para aumento salarial, que diminua horário de trabalho, por acordo coletivo e por convenção coletiva. O piso salarial maior, por exemplo, é possível. O capital que investe aqui sabe que é diferente investir na Venezuela, que é diferente do capital que investe na Índia e do capital que investe no Panamá.

ConJur — E como o senhor pretende atrair todos os tipos de advogados trabalhistas, patrões e empregados, para a AATSP?
Lívio Enescu —
Discutindo pauta da sociedade de advogados. Quero abrir uma plenária da advocacia empresarial, dos advogados que defendem as empresas. Mas, também, uma para os advogados que defendem trabalhadores. Apesar de todos serem advogados trabalhistas, existem especificidades na advocacia empresarial trabalhista e na advocacia obreira. Eu quero ser plural, queremos ter todos eles juntos. Tanto que eu já estive na Fiesp conversando com os advogados empresariais e vou ter uma reunião nas centrais sindicais e com os sindicatos. O advogado trabalhista é um elemento extremamente importante, tanto quando defende trabalhadores, quanto ao defender empresas. Ele é muito rico dentro desse processo da dinâmica social. E queremos dar dignidade a ele, valorizar e participar dos debates, tanto regional, quanto nacionalmente. Apesar de ser advogado de trabalhadores, eu penso em uma advocacia que contemple o advogado empresarial e o de trabalhadores, ou, ainda, o advogado hibrido, que trabalha para um e para outro.

ConJur — O senhor acredita que uma relação de contrato com as empresas possa ser usada para pleitear um teto salarial?
Lívio Enescu —
Eu acho que o piso máximo hoje não é um ponto de pauta. O mínimo é um ponto de pauta, o máximo não. Hoje, nos Estados Unidos, existem abismos sociais terríveis, na França tem abismos sociais. Porque se você não paga no salário, cria-se free benefice. Há formas de escalonar e de fugir do piso maior com artifícios legais. Tanto que o piso nos Estados Unidos, me parece, tem uma diferença de 186 vezes entre o CEO e o cara de chão de fábrica no começo de carreira. Porque lá, a teoria é contratualista. Prevalece o contrato entre as partes.

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