Embargos de divergência

Insignificância para reincidência de furto deve se basear em caso concreto

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11 de dezembro de 2015, 14h50

A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça definiu que a reincidência criminosa do furto não permite a aplicação do princípio da insignificância, exceto quando as instâncias ordinárias verificarem que a medida é socialmente recomendável na análise do caso concreto.

O entendimento foi firmado no julgamento que acolheu, por maioria, embargos de divergência em recurso especial relatado pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca e interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul e o MP Federal. Para a 6ª Turma, o passado delitivo não impede a aplicação do benefício na esfera penal. Segundo a 5ª Turma, porém, as condições pessoais negativas devem ser consideradas.  

Foi decidido o retorno dos autos ao primeiro grau para que, superada a insignificância, seja dado prosseguimento na instrução ou no julgamento da ação penal porque não foi apresentado na origem elemento que autorizasse a aplicação excepcional do princípio da bagatela. O caso envolve o furto de uma mochila no valor de R$ 69 que foi devolvida à vítima, empresa de grande porte e com considerável capacidade econômica.

“Apenas as instâncias ordinárias, que se encontram mais próximas da situação que concretamente se apresenta ao Judiciário, têm condições de realizar o exame do caso concreto, por meio da valoração fática e probatória a qual, na maioria das vezes, possui cunho subjetivo, impregnada pelo livre convencimento motivado”, diz o acórdão. 

A certidão de antecedentes criminais do envolvido aponta a participação em outros crimes contra o patrimônio. São 12 processos, no total, a maioria por furto simples, constando quatro sentenças condenatórias. Uma dessas é definitiva.

Para o relator, não se pode deixar de analisar o passado criminoso do agente. Ele diz que uma conduta formalmente típica que gere pequena lesão ao bem jurídico, apesar de materialmente insignificante, é temerária ao ordenamento jurídico, caso não se analise maus antecedentes, reincidência ou ações penais em curso, porque poderia provocar a “multiplicação de pequenos crimes, os quais se tornariam inatingíveis pelo ordenamento penal”.

No entendimento do ministro Rogerio Schietti Cruz, que acompanhou o relator, a não punição nesses casos pode gerar o sentimento de falta de confiança nos órgãos e agentes públicos que compõem o sistema de Justiça criminal. Ele cita que não são raras as notícias de autores de pequenos furtos submetidos a atos de violência em “sombrias salas de segurança de supermercados e até mesmo a linchamentos, muitos dos quais com resultado letal, levados a cabo por populares que renunciam às regras de ordenamento do convívio social em nome de uma ‘justiça imediata’”.

A ministra Maria Thereza de Assis Moura abriu a divergência e foi voto vencido no julgamento. Ela disse que as considerações sobre a reincidência e a reiteração criminosa não têm força para afastar o princípio da insignificância, sob pena de dar prioridade ao “superado” direito penal do autor, em detrimento do direito penal do fato.

No caso em estudo, afirma a ministra, verifica-se a existência de “mínima ofensividade e de reduzido grau de reprovabilidade” do comportamento. “A lesão jurídica provocada é inexpressiva, não causando repulsa social, autorizando, pois, o reconhecimento da atipicidade da conduta.”

Os ministros Felix Fischer, Jorge Mussi e Nefi Cordeiro acompanharam o relator, mas fizeram a ressalva de que não é possível considerar a reincidência como fator impeditivo para a aplicação do princípio da insignificância.

O ministro Fischer propôs em seu voto uma revisão dos contornos do princípio para que seja aplicado somente no caso de condutas que sejam irrelevantes e incapazes de causar prejuízo ao bem jurídico tutelado, afastando a possibilidade de se levar em conta as características do autor do fato. “No caso em exame, tendo em vista que o valor foi avaliado em R$ 69, não o reputo insignificante, mas, sim, de pequeno valor, razão pela qual afasto a aplicação do princípio em discussão.”

Clique aqui para ler o acórdão do julgamento.
EAREsp 221999/RS

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