Dano social

"Casos graves de corrupção devem ter benefícios penais reduzidos"

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9 de dezembro de 2015, 16h23

Por causa do dano social que causam, os casos graves de corrupção devem ter eventuais benefícios penais reduzidos. A opinião é do promotor de Justiça de São Paulo Roberto Livianu, a respeito da proposta que o Ministério Público Federal apresentou para a população de que os crimes de corrupção sejam considerados hediondos. Autor do livro Corrupção – incluindo a Lei Anticorrupção, Livianu é o presidente do recém criado Instituto Não Aceito Corrupção, que inaugura suas atividades nesta quarta-feira (9/12).

O objetivo do grupo é analisar políticas públicas já existentes, sugerir aprimoramentos e desenvolver pesquisas contra a corrupção no Brasil. No longo prazo, o objetivo do instituto é ambicioso :“operar uma mudança profunda na sociedade brasileira, por meio da conscientização da população, da discussão de formas de controlar a corrupção no país e da educação das próximas gerações para a criação de uma sociedade mais ética e cidadã”, conforme sua própria apresentação.

Livianu avalia como positivo o conjunto de propostas para combate da corrupção elaborados pelo Ministério Público Federal — o polêmico pacote de 10 medidas contra a corrupção, objeto de maciça campanha do MPF para angariar apoio. O promotor não vê abusos nos acordos de delação que tem sido feitos no Brasil e pede atenção ao Projeto de Lei 3.636, que propõe bloqueio às punições da Lei de Improbidade em caso de acordo de leniência. 

Leia a entrevista:

Conjur – O que acha do pacote de 10 medidas contra corrupção lançada pelo MPF? Tornar um crime hediondo é uma medida efetiva para coibi-lo?
Roberto Livianu – A iniciativa é muito positiva. Há várias boas ideias de um modo geral. Sou favorável à dinâmica escolhida de apresentar as propostas através de 20 projetos de iniciativa popular. Fazer com que a sociedade reflita sobre o tema da corrupção é extremamente importante e didático além de representar a concretização do conceito de democracia participativa, tanto nas assinaturas como no ato de colhê-las. Já são mais de 800 mil e o povo colocará o tema em debate no Congresso Nacional se atingidas 1,5 milhão de assinaturas. Isto gera legitimidade. Para coibir a corrupção é necessário muito mais que tornar o crime de corrupção hediondo, sendo essencial enfrentar suas causas e diminuir oportunidades para sua prática, mas não é descabido cogitar a redução de benefícios penais em casos graves de corrupção, pela danosidade social que geram.

ConJur – Você entende que as prisões preventivas estão sendo utilizadas para forçar delação?
Roberto Livianu – Creio que não. Não atuo nestes casos, de atribuição do MPF (sou do MP-SP), mas, pelo que sei, quase 80% dos acordos de delação premiada foram celebrados com pessoas soltas, que procuraram espontaneamente o MPF. Além disso, 100% das reuniões para discutir as colaborações são gravadas. A prisão preventiva é exceção e não pode ser banalizada, sendo cabível para garantir a ordem pública ou a aplicação da lei penal. Ou por convir à instrução do processo. Se comprovado qualquer desvio de finalidade, o Judiciário deverá ser acionado e cumprirá seu papel.

ConJur — As delações violam a Constituição? Os acordos impedem a contestação judicial da pena, o pedido de Habeas Corpus…
Roberto Livianu — As delações ou colaborações premiadas são previstas em diversas leis de nosso ordenamento desde 1986, com a Lei 7.492, e são detalhadamente reguladas pela Lei 12.850 e utilizadas largamente em todo o planeta, sob forte influência da Itália, onde teve lugar a operazione mane pulite (mãos limpas) na década de 1970, onde os pentiti (arrependidos) colaboraram amplamente com o sistema de justiça. Acredito na importância dos acordos penais para a obtenção de mais eficiência do sistema de justiça e por isto, penso serem  admissíveis os acordos acerca de penas estipulando o impedimento de contestações, só se podendo cogitar em questioná-los se houver vício no acordo, mas não em relação ao mérito.

 ConJur – O que a Lei Anticorrupção mudou quando se abre um inquérito sobre improbidade e crimes relacionados uso ilícito da coisa pública?
Roberto Livianu – A Lei Anticorrupção foi criada para punir administrativamente atos de corrupção empresarial. Jamais para salvar empresas em dificuldade (vide artigo 5 da Convenção da OCDE de 1997).  Ela diz expressamente  que não está impedida a incidência da Lei de Improbidade nem a das leis penais. São, portanto, instâncias distintas de punição. No entanto, há um projeto de Lei sendo discutido na Câmara, o PL 3.636, que propõe bloqueio às punições da Lei de Improbidade em caso de acordo de leniência. Acho isto bem delicado e deve ser bem discutido para não ser instrumento de impunidade. Aliás, acho um problema a forma como a Lei 12.846 concebeu o acordo de leniência, permitindo que governo e empresa suspeita se componham, sem fiscalização do MP.

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