Opinião

Redação genérica dificulta definição de instituições financeiras

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26 de agosto de 2015, 8h51

A Lei 4.595/64, em seu artigo 17, tipifica instituições financeiras como sendo "as pessoas jurídicas, públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros."

Trata-se, conforme se depreende de breve leitura do aludido dispositivo legal, de definição extremamente ampla, pois é difícil imaginar, sobretudo nos dias atuais, uma atividade empresarial que não envolva a arrecadação, intermediação, ou aplicação de valores próprios ou de terceiros.

A doutrina, atenta aos problemas impostos pela forma genérica e abstrata como foi redigido o artigo que conceitua as instituições financeiras, tentou, nos últimos anos, restringir sua definição. Para o especialista em Direito Bancário Eduardo Salomão Neto, uma empresa, para ser considerada instituição financeira, deve exercer cumulativamente as seguintes atividades: "(i) a captação de recursos de terceiros em nome próprio, (ii) seguida de repasse financeiro através de operação de mútuo, (iii) com o intuito de auferir lucro derivado da maior remuneração dos recursos passados em relação à dos recursos coletados, (iv) desde que a captação seguida de repasse se realize em caráter habitual.

Tal restrição teve, como uma das principais finalidades, impedir que empresas que efetivamente não configuram como instituições financeiras corressem o risco de indevidamente responderem pela suposta prática do crime tipificado no artigo 16 da Lei 7.492/89, o qual pune a conduta daquele que opera instituição financeira sem a devida autorização.

Outro importante marco para tentar resolver esta questão se deu com a recente promulgação da Lei 12.865/2013, a qual promoveu importante regulamentação das atividades desenvolvidas por importantes seguimentos, como é o caso, por exemplo, das empresas intermediadoras de pagamento pela internet.

De acordo com o referido diploma legal, o Banco Central, diferentemente do que acontecia antes, quando as atividades destas empresas eram, em sua imensa maioria, reguladas por portarias e circulares emanadas de órgãos como, por exemplo, o CADE e a SEFAZ, passou a ser responsável por monitorar e supervisionar a operação destas pessoas jurídicas, bem como autorizar o funcionamento e a transferência de controle, fusão e cisão delas.

Claro está, portanto, que, antes da edição da Lei 12.865/2013, as atividades das empresas em questão não eram regulamentadas pelo Banco Central do Brasil.

Tudo isso não impede que as empresas atuantes nesses ramos de atuação sejam vitimadas com ilegalidades decorrentes do período anterior ao da promulgação da referida lei. Explica-se:

Recentemente, atuamos em um inquérito policial no qual, em meados de 2012, o Delegado da Polícia Civil que presidia a investigação expediu ofício ao Banco Central do Brasil indagando se determinada empresa de intermediação de pagamento online fazia parte das instituições supervisionadas pela autarquia.

A resposta, evidentemente, foi negativa, exatamente porque, naquele momento, as instituições de pagamento online não estavam sujeitas à regulação do Banco Central do Brasil.

Mesmo diante de todas explicações apresentadas perante a Justiça Estadual no sentido de demonstrar que as empresas de intermediação de pagamento online não necessitavam, naquele momento, de autorização do Banco Central do Brasil para funcionar, o feito foi remetido à Justiça Federal para apuração da suposta prática do delito de crime contra o sistema financeiro nacional.

Coube, então, ao procurador da República Andrey Borges de Mendonça entender que a pergunta a ser feita não era se as intermediadoras de pagamento possuíam, naquele momento, autorização do Banco Central do Brasil, para funcionar, mas sim se tal era necessário, e, tendo concluído que não, opinar pelo arquivamento da investigação em virtude da atipicidade dos fatos, com o que o juízo da 6ª Vara Criminal Federal concordou.

De toda forma, fica claro que já passou da hora dos legisladores entenderem que não há, principalmente quando se fala em Direito Penal, seara que lida com os bens mais preciosos do indivíduo, como se conviver com leis que, em virtude de sua falta de técnica, dão margem a que pessoas físicas e jurídicas sejam investigadas e processadas , muitas vezes de forma arbitrária, por fatos manifestamente atípicos, cabendo a nós, operadores do Direito, lutar para que os diplomas e dispositivos legais passem a ser aprovados somente quando não contiverem impropriedades e ambiguidades.

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