Duração (Ir)razoável

Morosidade no Judiciário é uma problemática de caráter global

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30 de abril de 2015, 9h26

Segundo voz corrente, as boas definições fundamentam as boas discussões. Assim, principia-se dizendo que “razoável” vem do latim razão, que significa a faculdade que tem o ser humano de avaliar, julgar, ponderar ideias universais. Assim está no famoso dicionário etimológico da língua portuguesa — Antônio Geraldo da Cunha.

Porém, para os fins didáticos a que se destina esse artigo, deve-se interpretar o referido adjetivo como sinônimo de justo, ponderado, sensato. Afinal, a razoabilidade, segundo os parâmetros de um homem médio não admite tais relativismos ou condicionantes.

Feita essa análise conceitual, adentra-se à questão de fundo, traçando uma abordagem, ainda que superficial, do princípio da Duração Razoável do Processo, um dos alicerces do Novo Código de Processo Civil (NCPC), que entrará em vigor em março de 2016.

Como se sabe, uma série de medidas processuais está previstas no NCPC, a fim de efetivar o referido princípio, como a) julgamento cronológico das demandas; b) redução do número de recurso; c) sucumbência recursal (o que inibe a procrastinação das ações); d) possibilidade de produção de prova mediante lavra de tabelião, dentre outras.

Mesmo diante de tantas “novidades”, se faz necessário recordar que o milagroso princípio da Duração Razoável do Processo fora incorporado ao ordenamento jurídico pátrio, em 1992, por meio da ratificação do Pacto São José da Costa Rica, que definia esse princípio como uma das garantias judiciais (artigo 8º) a ser obedecida pelos signatários.

Doze anos depois, por meio da Emenda Constitucional 45/2004, restou incorporado, ao artigo 5º da Constituição Federal, o princípio da Duração Razoável do Processo, consagrando um dos direitos e garantias fundamentais.

De lá pra cá, inúmeras leis foram publicadas, a fim de concretizar o mencionado princípio, dentre elas a Lei dos Juizados Especiais Cíveis de 26 de setembro de 1995, que buscou adaptar e efetivar a Lei dos Juizados Especiais de Pequenas Causas de 7 de novembro de 1984.

Outro exemplo é a Lei do Cumprimento de Sentença de 22 de dezembro de 2005, que, a grosso modo, buscava a celeridade processual, por meio de um processo sincrético, em que se dispensaria as formalidades habituais de um processo de execução, como uma nova citação.

Como um último exemplo, pode-se mencionar a Lei de Mandado de Segurança de 7 de agosto de 2009, que traz relevantes reformas no que toca a celeridade processual, por se tratar de um instituto importantíssimo, objeto de estudos desde a década de 30 e que não apresenta uma correspondência perfeita no Direito Comparado.

Assim, o artigo 4º do NCPC que atribui à Razoável Duração do Processo o título de norma fundamental de direito processual, não é nenhuma novidade, já existe em nosso ordenamento há pelo menos duas décadas. Outra dúvida a ser levantada diz respeito ao porquê da inclusão deste princípio no NCPC, já que ele fora elevado ao patamar de garantia constitucional em 2004.

Diante desse impasse, questiona-se a respeito das dificuldades ou resistências em se atingir um resultado justo em um processo, que dure um lapso temporal razoável. Afinal, justiça que tarda falha.

Quase todos os países enfrentam este binômio tão conhecido: quantidade vs. qualidade. Apenas a título ilustrativo, cumpre mencionar as palavras de Bridget Cullen, membro do Tribunal de Queensland/AUS: “In recent years, there have been a number of strong and sustained criticisms of the civil justice system in Australia, England and United States. These criticisms fall into there general categories: a) access to justice; b) inefficiency; and c) delay” (Bridget Cullen, Civil Procedure, Third Edition, Thomson Reuters, 2013).

A questão da morosidade não se restringe ao Brasil ou aos países latinos, mas atinge também as nações que aplicam o common law, a exemplo dos EUA, Inglaterra e Austrália. Caracteriza-se, portanto, uma problemática de caráter global, independente do sistema jurídico escolhido.

Por fim, considerando a realidade e o sistema brasileiro, ousa-se a afirmar que a morosidade processual tem um aspecto político, institucional, sendo imperiosa uma reforma estrutural nas nossas instituições judiciárias, a fim de garantir ao Poder Judiciário meios efetivos capazes de promover a amadurecida Duração Razoável do Processo, o que já pode ser constatado com a aplicação do processo eletrônico, digitalização dos autos e agilidade na condução dos atos processuais.

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