"Manejos corporativos"

Com mudanças, CNJ terá que "pedir licença" para investigar, diz OAB-SP

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15 de abril de 2015, 19h36

A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil atacou, em nota oficial, as propostas de alteração ao funcionamento do Conselho Nacional de Justiça no anteprojeto do Estatuto da Magistratura, que substituirá a atual Lei Orgânica da Magistratura (Loman).

A principal crítica da OAB-SP diz respeito ao inciso III do artigo 273 da proposta, que estabelece que o CNJ poderá receber reclamações contra membros ou órgãos do Judiciário, “sem prejuízo da competência disciplinar e correcional dos tribunais”, e delas conhecer, podendo instaurar processos administrativos e, ao final deles, aplicar punições.

Para a OAB-SP, essa medida faz “definhar as atribuições mais caras e necessárias do órgão e condicionar suas iniciativas disciplinares à prévia licença dos tribunais: em síntese, o investigador terá de pedir licença para sindicar a conduta do investigado, que poderá negá-la! Nada mais impensável!”.

De acordo com a entidade, tais disposições são “manejos corporativos de operadores do direito que, mais preocupados com seus interesses e vantagens funcionais do que com a consolidação e aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito que conquistamos, se organizam e agem para debilitar o CNJ”.

Assim, a entidade declarou “repelir” o que classifica como tentativa de minimizar o CNJ, “órgão que tem arredado a opacidade e conferido transparência a um dos Poderes da República, que não pode se pretender hermético e impenetrável”.

Defesa das mudanças
Na segunda-feira (13/4), o presidente do Supremo Tribunal Federal e do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski, rebateu as críticas à proposta de alteração do funcionamento do CNJ, que busca impedir que um juiz seja interrogado por um conselheiro de instância inferior. Quem é contra a ideia afirma que a medida vai reduzir o poder de fiscalização do órgão.

“As críticas não se aplicam, porque a competência deles [conselheiros do CNJ] é direta da Constituição Federal. Isso significa que não pode um juiz substituto de primeiro grau ser designado por um conselheiro para interrogar um ministro de tribunal superior. Mas o conselheiro sempre tem a competência plena. O que eles não podem é delegar a atribuição para um juiz de instância inferior”, explicou Lewandowski, que é o relator da comissão formada pelo STF para debater o Estatuto da Magistratura.

O ministro ainda afirmou que não fazem sentido as afirmações de que a mudança iria fragilizar o Conselho. “Não há interesse em enfraquecer o CNJ por parte de seu presidente. Qual é o presidente de um órgão que tem interesse em enfraquecer o órgão que ele preside? Isso é um contrassenso”, disse.

Leia abaixo a íntegra da nota da OAB-SP:

“Nota Oficial

Na defesa do Conselho Nacional de Justiça – CNJ 

A Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, cumprindo suas finalidades legais e reafirmando seu compromisso com os valores democráticos do povo brasileiro, vê-se no dever de denunciar à sociedade os manejos corporativos de operadores do direito que, mais preocupados com seus interesses e vantagens funcionais do que com a consolidação e aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito que conquistamos, se organizam e agem para debilitar o Conselho Nacional de Justiça, órgão de controle externo do Poder Judiciário.

Pretendem esses setores eliminar mecanismos de que hoje dispõe o CNJ para autonomamente investigar irregularidades e desvios praticados por magistrados e tribunais, impor-lhes medidas e sanções disciplinares, fiscalizar seus atos administrativos e financeiros, sua regular funcionalidade e produtividade. Querem subordinar suas atividades ao prévio e inaceitável “placet” da própria Magistratura.

Considerando-se que no Estado Democrático de Direito nenhum ato pode escapar ao controle do Poder Judiciário, aí incluídos os de autoria dos demais Poderes, natural que não possa ficar sem qualquer controle e fiscalização aquele que a todos controla. A clássica indagação aqui se impõe: quem fiscaliza o fiscal?

O controle externo do Poder Judiciário, portanto, livre, autônomo e desimpedido é particular exigência das democráticas sociedades contemporâneas, não consistindo qualquer limitação à função jurisdicional, antes consubstancia valioso instrumento de fiscalização e disciplina. Antidemocrático e perigoso às liberdades seria a existência de um Poder sem qualquer controle, que, controlando jurisdicionalmente os demais, a nada ou a ninguém devesse prestar contas. A criação do CNJ remonta à antiga luta da OAB que sempre preconizou seu advento e positivação no Texto Constitucional, não sem sofrer, nesse intento, pertinaz e aguerrida resistência de juízes que se entendem acima de qualquer controle público. A batalha foi árdua, mas venceu a causa da democracia e criou-se o CNJ.

Agora, pretendem esses que não aceitam o crivo dos atos que praticam fazer definhar, através de uma proposta inadequada no anteprojeto de Lei Orgânica da Magistratura, as atribuições mais caras e necessárias do órgão e condicionar suas iniciativas disciplinares à prévia licença dos Tribunais: em síntese, o investigador terá de pedir licença para sindicar a conduta do investigado, que poderá negá-la! Nada mais impensável!

Caixa de ressonância da sociedade civil paulista, a OAB-SP repele essa tentativa de minimizar o CNJ, que tem arredado a opacidade e conferido transparência a um dos Poderes da República, que não pode se pretender hermético e impenetrável.

São Paulo, 10 de abril de 2015.

Marcos da Costa

Presidente da OAB-SP”

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