Harmonia com a lei

Não há excesso em prisões da "lava jato" se durarem até oito meses

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2 de abril de 2015, 11h30

[Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S.Paulo desta quinta-feira (2/4) com o título A prisão dos réus da Lava Jato]

A corrupção sempre esteve em nossas mentes, mas hoje incendeia nossos corações. Faltam escola, hospital, água encanada, rede de esgoto, policiamento e segurança. Os R$ 200 bilhões desviados por ano no Brasil (estimativa da Organização das Nações Unidas) triplicariam o investimento federal em educação ou em saúde.

Corrupção é um câncer que mata, e há um grande tumor descoberto na Petrobras que está sendo diagnosticado e tratado para evitar novas metástases. A quimioterapia, como a prisão preventiva, é um remédio amargo, mas necessário.

A prisão antes do fim do processo deve ser exceção. A regra é que a pessoa seja presa após o julgamento. A exceção ocorre quando a liberdade da pessoa gera um risco à sociedade: de reiteração de crimes, risco econômico, de fuga ou de atrapalhar a colheita das provas.

Na operação "lava jato", vários fatos demonstram esses riscos e, consequentemente, a imprescindibilidade das prisões. Há provas de que a corrupção nas empresas é um modelo de negócio praticado há muito e que envolve bilhões de reais.

Pior do que isso, existem provas de que a corrupção continuou ao longo de 2014, mesmo após a deflagração da operação, o que revela completo destemor e crença na absoluta impunidade. Vários dos réus ainda escondem dinheiro sujo no exterior, o que é um crime atual.

A necessidade de frear os crimes justifica a prisão como medida extrema. O risco dos crimes coloca também em xeque a economia. Muito se diz sobre o prejuízo econômico vinculado à "lava jato". Deixemos as coisas claras. O que traz prejuízos econômicos é a corrupção, e não o combate a ela. E essa corrupção precisa ser estancada.

O simples desligamento formal dos empresários presos de seus cargos nas empreiteiras não atenua esse risco, pois eles mantêm ampla influência nas empresas, na qualidade de donos ou altos executivos.

Eles têm os contatos com agentes públicos envolvidos no esquema e poder de decisão, ainda que informal. Têm a faca, a massa e o queijo na mão para continuar a corrupção e fazer desse caso uma pizza, caso sejam soltos.

O risco é também para a colheita de provas. Os réus não só cometeram os crimes, mas os esconderam, praticando lavagem de dinheiro. Além disso, depois de descobertos, tentaram enganar a Justiça, apresentando documentos falsos e dizendo que repasses de dinheiro para as empresas de fachada, controladas pelo doleiro Alberto Youssef, eram pagamentos de serviços de consultoria prestados licitamente. Um total desrespeito à Justiça.

Presentes as justificativas para a prisão, existe ainda um limite temporal: o processo não pode demorar além do razoável. A Lei das Organizações Criminosas previu um prazo de até oito meses para o fim da colheita de provas pelo juiz. Tudo indica que esse prazo será atendido na "lava jato", ou seja, não há ou haverá excesso injustificado.

Assim, as diversas razões para as prisões permanecem, como as cortes têm reconhecido em mais de uma centena de recursos (habeas corpus), em decisões que estão em harmonia com a lei.

O argumento de que os crimes praticados não são violentos não convence. A corrupção é tão violenta quanto o tráfico de drogas. Corrupção mata, e mata mais do que o tráfico. Precisamos de um Brasil que trate igualmente corruptores, corruptos e traficantes.

Caso a suposta ausência de violência seja fundamento para soltar os réus acusados de corrupção na "lava jato", por coerência, o mesmo tratamento deveria ser estendido aos milhares de traficantes de drogas presos preventivamente no país.

Revogar prisões que foram decretadas para estancar uma corrupção sistêmica e bilionária significaria deixar esse câncer ganhar terreno no paciente, por receio de administrar um remédio amargo capaz de impedir o avanço desse mal.

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