Jurisprudência defensiva

Filtros recursais podem gerar ainda mais processos, alertam professores

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23 de outubro de 2014, 10h49

Como desafogar os tribunais superiores sem prejudicar o acesso à Justiça e a garantia da efetivação dos direitos previstos na Constituição? A questão foi debatida nesta terça-feira (21/10) na XXII Conferência Nacional dos Advogados, que acontece no Rio de Janeiro.

Para o professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo Dalmo Dallari, é preciso uma mudança na Constituição para que o Supremo Tribunal Federal seja exclusivamente um tribunal constitucional.

“Hoje, temos 70 mil processos em andamento no STF e isso prejudica a efetividade da garantia aos direitos fundamentais. Agindo somente nos casos relacionados à Constituição, o tribunal alemão pode ser considerado um modelo de eficiência”, sugeriu.

O advogado e professor da PUC-Rio Sérgio Bermudes defendeu a implementação de filtros como forma de evitar a sobrecarga nos tribunais superiores. “Filtros recursais impedem de forma eficaz a interposição de recursos descabidos e fazem com que se obedeça a jurisprudência, fazendo com que o Judiciário exerça sua função pedagógica. Isso ajuda a garantir a efetividade do processo”, defendeu.

Ele lembrou que fatores como a descentralização dos órgãos jurisdicionais e o aumento do número de juízes podem melhorar esse panorama. “Hoje, o Brasil conta com menos de um terço dos juízes de que necessita”, alertou.

Já o doutor em Direito Constitucional e professor da Fundação Getulio Vargas Thiago Bottino citou dados da pesquisa “Supremo em Números”, feita pela Escola de Direito da FGV, e do projeto “Pensando o Direito”, promovido em parceria com o Ministério Público e o Ipea.

“No STJ, por exemplo, 43,8% dos Habeas Corpus vêm do TJ-SP, o que pode ser considerado um sintoma de uma ‘explosão’ de ações de liberdade individual”, disse. Segundo ele, medidas do STF como o não-conhecimento de Habeas Corpus substitutivos ao Recurso Ordinário de Habeas Corpus prejudicam as garantias das liberdades individuais.

O advogado e presidente da Associação Brasileira de Constitucionalistas Democratas, Marcelo Figueiredo, falou sobre o movimento recorrente de reforma do Poder Judiciário como instrumento de restrição à jurisdição dos tribunais superiores.

Citando as Propostas de Emenda Constitucional 209/2012 e 358/2005, ele ressaltou que “os tribunais devem ter o direito de escolher as matérias julgadas, assim como nas democracias mais avançadas”. Entretanto, o advogado recomendou cuidados. “É preciso que haja filtros, mas que eles não afetem de forma negativa a efetivação dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição.”

Retomando a PEC 209/2012 e a situação de abarrotamento dos tribunais superiores, em sua fala sobre a criação de repercussão geral no Superior Tribunal de Justiça, o conselheiro Federal da OAB Evandro Pertence lembrou que atualmente entram mais de 300 mil processos por ano para serem julgados por apenas 33 juízes na corte. No entanto, ele acredita que a PEC não é uma solução adequada. “Ela se apresenta como uma renúncia à jurisdição e um corte feito à população de acordo com sua capacidade financeira”, argumentou, defendendo um aumento paulatino no número de juízes no STJ.

Para Alexandre Reis Siqueira Freire, advogado e professor da Universidade Federal do Maranhão, a PEC 209 surtirá efeitos contrários aos seus objetivos, uma vez que a repercussão geral no Supremo já provoca inúmeros recursos relacionados ao método, e não ao mérito dos casos. “O STF reclama do enorme número de recursos que chegam à corte. Todavia, acaba por provocar um aumento no número dos mesmos ao adotar práticas defensivas”, concluiu.

Para presidir a mesa dos debates foi convidada Margarete de Castro Coelho, deputada estadual (PP-PI), acompanhada pelo relator Erick Venâncio Lima do Nascimento; o secretário-geral da Comissão Nacional de Legislação da OAB Federal; e o secretário Helder José Freitas de Lima Ferreira, conselheiro Federal da OAB pelo Amapá.

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