Sistema de inteligência

STJ cria núcleos para fazer triagem de processos antes de distribuir

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8 de outubro de 2014, 18h27

Sem a criação de um filtro de recursos ao Superior Tribunal de Justiça pelo Congresso Nacional, o tribunal precisa trabalhar com as ferramentas que tem. Por isso está criando núcleos para análise de demandas repetitivas e para triagem de processos cujas teses já foram pacificadas pelo tribunal ou que não podem ser admitidos por algum óbice processual. Esse núcleo já funciona na 2ª Seção, que trata apenas de matérias de Direito Privado, e mostra resultados promissores. A ideia é expandir os grupos de trabalho para todo o tribunal, além de aprimorar o sistema de triagem de processos antes da distribuição aos gabinetes.

A principal dessas medidas é o Núcleo dos Recursos Repetitivos (Nurer). É uma espécie de grupo de estudos que deve ser instalado em todos os tribunais do país para análise dos casos que podem ser — ou já foram — afetados pelo STJ como recurso repetitivo.

STF
No caso do STJ, os ministros querem que esses núcleos sirvam para fazer um trabalho de inteligência processual. Para isso, o presidente do tribunal, ministro Francisco Falcão (foto), criou uma comissão de ministros para estudar soluções para o problema. Ela é formada pela ministra Assusete Magalhães, da 1ª Seção, e pelos ministros Rogério Schieti e Paulo de Tarso Sanseverino, da 1ª e 2ª seções, respectivamente.

O pai da ideia da comissão é o ministro Paulo de Tarso. Em entrevista coletiva nesta quarta-feira (8/10), ele mostrou números de uma conta que não fecha, apesar das estatísticas promissoras que os núcleos já vêm mostrando. Em 2013, o tribunal recebeu 310 mil casos para resolver. Isso significa que cada ministro recebeu, em média, 10 mil processos.

Segundo o ministro, o principal problema do STJ é o mesmo do resto do país: excesso de demanda. Desses 310 mil processos recebidos em 2013, 184 mil eram Agravos em Recurso Especial — recurso interposto contra decisão de tribunal local que denegou a subida de um recurso ao STJ. São 60% dos recursos que chegaram ao gabinete em um ano.

“O nosso recurso é o REsp, ou Recurso Especial, e eles são 65 mil por ano, em média. Dá 40% da demanda, mas os gabinetes estão abarrotados de agravos”, afirma Sanseverino. Segundo ele, 90% desses AREsp são desprovidos e a decisão da origem, mantida. “Como é um recurso cujo problema é o grande número, a solução é a triagem prévia, verificar o que é inviável e não distribuir”, explica.

Essa triagem começou em julho deste ano na Presidência do STJ. E segundo dados da Secretaria Judiciária do tribunal, em setembro, já resultou numa redução de 9% da demanda aos gabinetes.

O Nurer também vai ter papel fundamental nisso. O núcleo que funciona na 2ª Seção foi criado em julho de 2013 pelo ministro Sidnei Beneti, hoje aposentado. A ideia é que todos os processos dos grandes demandantes (empresas de telefonia e bancos) passem por ali para uma análise prévia. Se tratarem de matéria já pacificada, não são distribuídos. E o núcleo também pode identificar novas demandas repetitivas e avisar os ministros, para que afetem recursos que tratem delas.

STJ
De acordo com o ministro Sanseverino (foto), logo que o Nurer foi instalado, recebia 1,5 mil processos por mês. Com a identificação das demandas repetitivas e a denegação das teses pacificadas, hoje o núcleo trabalha com uma demanda de 500 processos por mês.

Isso já tem reflexo no trabalho dos gabinetes dos ministros da 2ª Seção. Antes do Nurer, recebiam 1,3 mil processos por mês para julgar, em média. Em um ano de funcionamento do núcleo, recebem mil. “Demos soluções rápidas e semelhantes para casos iguais. Os resultados foram significativos, uma redução de 30% na demanda da Seção de Direito Privado”, comemora.

Sanseverino conta que a ideia agora é expandir essa prática para casos ligados a outras empresas, também responsáveis por um grande volume de recursos ao tribunal. O tribunal também pretende estruturar um Nurer na 1ª Seção ainda este ano, para entrar em 2015 com mais um núcleo de repetitivos funcionando.

“Nossa meta é criar um sistema de inteligência que possa identificar quais e quantos são esses recursos repetitivos, porque hoje trabalhamos com números aproximados. Sabendo quais são os recursos, podemos delimitar as teses e informar tanto aos ministros quanto aos tribunais locais exatamente quais são as discussões que serão travadas e por isso devem ficar sobrestadas.”

A grande dificuldade disso, na 1ª Seção, é que os ministros não parecem ter gostado muito de ver os recursos sendo denegados antes da distribuição. Entendem que isso viola o princípio do juiz natural. Lá, o ministro Mauro Campbell Marques sugeriu que a afetação de um recurso repetitivo seja discutida antes pelos ministros, por e-mail, e que o tribunal tenha um prazo de seis meses para levar o caso a julgamento.

Mas o ministro Paulo de Tarso Sanseverino está confiante de que o tribunal conseguirá cumprir com a meta. Ele também pretende criar um Nurer na 3ª Seção em breve, mesmo reconhecendo a complicação de se ter um sistema de demandas repetitivas num colegiado que lida com a liberdade das pessoas. Em matéria de execução penal, em que deve prevalecer a isonomia e a igualdade, diz ele, é possível trabalhar de maneira semelhante ao que é feito no Nurer da 2ª Seção.

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