Inovação na apelação

É possível mudar fundamento de decisão para manter pena mais grave

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2 de outubro de 2014, 12h03

Ao analisar apelação da defesa, o tribunal pode manter a decisão recorrida com base em outros fundamentos, desde que resulte de elementos já reconhecidos nos autos e não gere prejuízos ao recorrente. Com esse entendimento, por unanimidade, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal negou provimento ao Recurso Ordinário em Habeas Corpus, interposto pela Defensoria Pública da União em favor de um condenado por tráfico de drogas.

O réu foi condenado na comarca de Cáceres (MT) a pena de cinco anos e seis meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 60 dias-multa. A defesa apelou ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso, mas não conseguiu resultado favorável. Em seguida, pediu Habeas Corpus ao Superior Tribunal de Justiça buscando regime inicial semiaberto, mas não foi atendida.

No recurso apresentado ao Supremo, a Defensoria argumentou que o juízo de primeiro grau fundamentou o regime inicial fechado na obrigatoriedade decorrente da Lei dos Crimes Hediondos, declarada inconstitucional pelo STF. Alegou ainda que, no julgamento da apelação, o TJ-MT valeu-se de fundamento (maus antecedentes) que não constavam na sentença condenatória, caracterizando inovação prejudicial em recurso exclusivo da defesa.

O relator, ministro Gilmar Mendes, afirmou que o TJ-MT afastou o dispositivo da Lei dos Crimes Hediondos, mas manteve o regime inicial fechado, invocando os maus antecedentes, que já haviam sido reconhecidos na sentença. “Não houve, ao meu ver, o reconhecimento de novas circunstâncias desfavoráveis, mas a utilização de circunstâncias já reconhecidas na fundamentação do regime inicial. A linha de argumentação do TJ-MT não merece reparos”, disse.

Segundo o relator, o Plenário do STF reputou, em diversos julgados, inválidas para o crime de tráfico de drogas a vedação da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito e a imposição compulsória do regime inicial fechado. Entretanto, disse que “os julgados não reconheceram o direito automático a esses benefícios. A questão há de ser apreciada pelo juiz do processo”, afirmou.

O afastamento do regime inicial fechado obrigatório, concluiu o relator, autoriza a fixação de um novo regime inicial com base nas circunstâncias judiciais. No caso dos autos, o ministro disse que o regime inicial fechado foi fundamentado pelo TJ, nos termos da Súmula 719 do STF, que afirma que a “imposição de regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea”.

O voto do relator foi seguido por unanimidade. O ministro Celso de Mello afirmou que “não é permitido que o tribunal ad quem pronuncie uma decisão que seja desfavorável a quem recorre, quer do ponto de vista quantitativo, quer sob o aspecto meramente qualitativo”. Contudo, não houve no caso, segundo o ministro, alteração na pena do réu. "Não houve ofensa ao postulado que veda a reformatio in pejus [reforma da decisão para piorar a situação do réu]”, disse.

O ministro Teori Zavascki disse ainda que não houve vício formal no acórdão do TJ-MT e salientou a importância do precedente, uma vez que, no julgamento de recursos ordinários, como é caso das apelações, “não se impede que, sem piorar a situação do recorrente, se mantenha a decisão [recorrida] por outros fundamentos, desde que não constitua esse novo fundamento uma nova causa de pedir”. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

RHC 123.115

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