Excessos judiciais

Gilmar Mendes suspende concessão de direito de resposta ao PT na Veja

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2 de outubro de 2014, 19h52

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que obrigava a revista Veja a dar ao PT direito de resposta por causa de uma reportagem. O ministro afirmou em liminar que o STF, na decisão que declarou a Lei de Imprensa inconsitucional, fixou o entendimento de que o direito de resposta só é cabível contra a divulgação de informações falsas. No caso da Veja, escreveu o ministro, todos os fatos foram noticiados com as devidas fontes.

A decisão do ministro foi tomada em medida cautelar em uma Reclamação levada ao Supremo pela editora Abril, que publica a revista. A empresa é representada no STF pelo advogado Alexandre Fidalgo, sócio do escritório EGSF Advogados.

O TSE havia condenado a Veja por causa de uma reportagem em que diz que “o PT paga a chantagistas para escapar do escândalo da Petrobras”. A revista afirma que o partido deu dólares para que “um chantagista” não divulgasse fatos relacionados à investigação sobre financiamento de campanha por meio de contratos fraudulentos com a Petrobras. O objetivo seria impedir que a informação interferisse nas eleições presidenciais, marcadas para este domingo (5/10).

De acordo com o relator da representação, ministro Admar Gonzaga, a reportagem “extrapolou os limites da crítica ácida” e ofendeu a honra do partido. Por isso, entendeu que o direito de resposta era a medida adequada “a tal situação de extravasamento da liberdade jornalística”.

Relator da Reclamação ajuizada ao Supremo, Gilmar Mendes, discordou do colega de TSE, tribunal do qual Gilmar é vice-presidente. Na liminar, ele afirma que “o acórdão eleitoral incorreu, no mínimo, em excesso”, quando disse que as informações noticiadas pela Veja eram inverídicas.

Embora reconheça que a medida cautelar não seja o meio mais adequado de se investigar a veracidade de informações noticiada pela imprensa, a Veja creditou tudo o que divulgou em depoimentos dados à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal.

“Estando os fatos sob investigação, não é possível concluir sobre sua incorreção ou inveracidade”, escreveu. Para ele, “afigura-se bastante provável que o ato reclamado tenha, ao emprestar interpretação excessivamente limitadora da liberdade de imprensa, destoado das decisões proferidas por esta corte na ADPF 130 e na ADI 4.451 [que discutiram a Lei de Imprensa], ambas de relatoria do ministro Ayres Britto”.

Para o advogado Alexandre Fidalgo, que representa a Veja, "a decisão é magnífica". "O STF, na voz do Ministro Gilmar Mendes, fez prevalecer os pressupostos da democracia, repondo os valores constitucional da liberdade de expressão ao caso concreto. O Supremo, em duas oportunidades, afirmara que a crítica, ainda que veemente ou impetuosa, especialmente quando dirigida aos entes públicos, constitui o exercício da atividade de imprensa."

Fotos
Um dos principais argumentos da representação do PT ao TSE — e do ministro Admar Gonzaga — se relaciona à foto que ilustrou a reportagem. A revista publicou uma imagem de notas de dólar para se referir à quantia que disse terem sido pagos ao tal chantagista.

O ministro Admar, relator da representação, indagou em seu voto que a própria reportagem dizia não ter conseguido acesso ao chantagista. “Se aquele que supostamente recebeu os dólares não quis se manifestar, de que forma a representada [a revista Veja] conseguiu a fotografia das cédulas que, taxativamente, afirmou terem sido utilizadas para pagamento da chantagem? A revista não explica”, anotou.

Para o ministro Gilmar, esse argumento é “assaz frágil”. “É evidente que a referência que se faz à imagem não é literal”, afirmou em seu voto. Diz o voto: “O texto jornalístico utiliza-se de uma figura de linguagem para atribuir maior expressividade ao discurso. Visa tão somente a ressaltar que o pagamento da chantagem que descreve pode ter sido efetuado em um montante considerável de dólares. As notas constantes da imagem sequer poderiam ser identificadas por seu número de série e, em sua maioria, por seu valor, de modo a vinculá-las aos fatos descritos.”

Preocupações jurisprudenciais
Gilmar Mendes também afirma que a concessão do direito de resposta nesse caso foi “bastante lesivo à liberdade de imprensa”, inclusive porque contrariou a jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Federal.

O ministro cita diversos precedentes do próprio TSE que demonstram a preocupação da corte com a liberdade de expressão. Um voto do ministro Sepúlveda Pertence, já aposentado, por exemplo, diz que “é a imprensa escrita a área de eleição de toda a história da afirmação da liberdade de expressão, de pensamento, de informação, de crítica”.

De uma tacada só, Gilmar Mendes critica o posicionamento do PT, de ir ao Judiciário reclamar da imprensa, e do TSE, por vacilar com sua própria jurisprudência. É que, segundo ele, já consta outra representação ajuizada pelo PT para reclamar de edição mais recente da Veja.

“Essa representação está baseada na mesma espécie de fundamentação que a representação anterior, na qual foi expedido o ato reclamado. Assim, mantendo-se a jurisprudência do TSE revelada no acórdão ora reclamado, tudo leva a crer que novo direito de resposta deverá ser concedido a favor da mesma coligação e contra a mesma revista”.

A semelhança entre os pedidos e a probabilidade de a próxima decisão ser em sentido semelhante  “leva à real e iminente possibilidade de que a Corte Superior Eleitoral transforme-se em corresponsável pela edição da revista em comento, em virtude da jurisprudência que está a construir em homenagem ao direito de resposta e em desprestígio da liberdade de imprensa e de informação”.

Clique aqui para ler a decisão.

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