Corte desfalcada

É injustificável a demora em escolher um novo ministro do Supremo

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28 de novembro de 2014, 5h51

A Constituição do Brasil, logo na sua abertura, estabelece que “são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Trata-se de princípio que é um dos pilares da nossa democracia — a separação de poderes, só que falta ser efetivado de verdade, sob muitos aspectos.

O sistema de preenchimento das vagas de ministro do Supremo Tribunal Federal, a cada vez que surge uma, tem demonstrado reiteradamente que essa tal independência é ainda uma quimera longínqua criada pelo legislador constituinte.

Tem sido frequente a injustificada demora na escolha de membros do Supremo Tribunal Federal, e ocorre também neste momento, pois, há mais de três meses, deu-se a aposentadoria do polêmico e raivoso ministro Joaquim Barbosa. Pois muito bem, desde então a comunidade jurídica do país debate e se pergunta quem será o agraciado da vez: um jurista na pura essência da palavra? Um político-jurista? Um profissional das carreiras jurídicas capaz de agradar a todos os segmentos que se querem ver “representados” na mais alta Corte de Justiça?

Sabe-se lá, dizem alguns, o que passa sobre o tema pela cabeça da senhora presidente da República, hoje às voltas com a seleção de ministros para o Executivo e de olho na estrondosa operação "lava jato". Enquanto isso, danem-se os processos aos montes dormitando em prateleiras e, inacreditável, às favas as partes ávidas pelos julgamentos dos seus casos que, em geral, são um caos para si, que se amontoam em projeção aritmética no Supremo Tribunal Federal.

Em outra oportunidade em que me manifestei sobre o mesmo tema, entendia que cometia crime de responsabilidade o então presidente da República por deixar transcorrer em branco seis longos meses para a escolha de um ministro para o Supremo Tribunal Federal. Claro, continuo a pensar do mesmo jeito, mas agora um pouco mais indignado não somente pela repetição do desrespeito da chefia do Executivo para com a corte mais alta do Poder Judiciário brasileiro e, principalmente, para com os cidadãos jurisdicionados. Em vista disso, estou cada vez mais convicto de que se faz urgente a fixação de um prazo para a escolha dos membros desse poder, sob pena de essa relevantíssima tarefa ser acometida ao próprio Judiciário ou ao Congresso Nacional.

Nessa seara, causa também perplexidade o silêncio obsequioso da nação e das instituições em geral, e até da imprensa, quanto ao descaso de sua excelência, pois, afinal, não consigo admitir que possa ser tão dispensável assim a figura de um entre apenas 11 (que é o número de integrantes do Supremo), de maneira a podermos prescindir dele pelo tempo que as conveniências políticas, ou sei lá de que outra natureza, possam ditar.

Só para se ter uma ideia, segundo dados que circulam pela internet, tramitam no STF, atualmente, mais de 100 mil processos para serem dirimidos, o que significa, numa conta simples, mais de 10 mil litígios para cada ministro, e ainda há de se considerar que o presidente da corte, via de regra, não recebe processos para relatar. Apesar disso, e mesmo tendo tantos bons nomes na comunidade jurídica do país para escolha de apenas um, estamos há mais de 100 dias com um dos gabinetes entregue às moscas e às traças na sede do Supremo, a poucos passos do Palácio do Planalto.

Enfim, senhora presidenta, não se esqueça do Supremo Tribunal Federal. A escolha de um novo ministro não é, assim, uma escolha de Sofia. E, senhores parlamentares, deem um basta nesse estado de coisas e emendem a Constituição para estabelecer um prazo máximo para que o chefe do Poder Executivo exerça essa atribuição. Se não, a independência fica só no papel, desacreditada.

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