Danos ao bebê

Corte de Apelação inglesa começa a julgar se é crime beber durante a gravidez

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7 de novembro de 2014, 10h15

Começou nesta semana o julgamento que discute se o bebê que nasce com defeitos porque sua mãe consumiu álcool durante a gravidez é vítima de crime. A Corte de Apelação vai dizer se filho de mãe alcoólatra tem direito de ser indenizado pelo Estado. A responsabilidade criminal da mãe, no entanto, não está sendo discutida. A abertura das audiências iniciais foi divulgada pelo jornal britânico The Guardian.

A discussão acontece no pedido de indenização movido em favor de uma menina de sete anos, vítima da chamada "síndrome alcoólica fetal". Ela é representada pelo Conselho Tutelar, que pede indenização da comissão do Estado responsável por reparar danos a vítimas de crime (Cica).

A corte tem de decidir se a mãe, ao beber, cometeu algum crime. Só em caso positivo a menina terá direito a indenização. Embora não esteja em discussão, uma decisão nesse sentido pode abrir precedente para que as gestantes comecem a responder por comportamentos prejudiciais que provoquem danos irreversíveis aos filhos.

A menina, que teve sua identidade preservada, nasceu em 10 de junho de 2007 e foi diagnosticada com a síndrome alcoólica fetal. A doença provoca má-formação na face, em órgãos como rim e pulmão e dados cerebrais permanentes. A causa é o consumo excessivo de álcool pela gestante. Hoje, a menor vive sob tutela do Estado.

Segundo o processo, a mãe era usuária de drogas, mas largou o vício durante a gestação. Manteve, no entanto, o consumo de álcool, mesmo sendo advertida por médicos e até assistentes sociais de que a bebida provocaria danos irreversíveis no seu bebê. Ela chegou a frequentar um programa público para ajudar a largar a bebida, mas não teve resultado.

Em 2011, um tribunal administrativo reconheceu que a menor tinha sido vítima de violência e tinha direito de receber indenização da Cica. A decisão, no entanto, foi derrubada em dezembro do ano passado pela segunda instância administrativa (clique aqui para ler, em inglês).

A discussão principal gira em torno de estabelecer se um feto pode ser considerado uma pessoa e, portanto, ser vítima de violência. Na primeira instância, o juiz considerou que sim e enquadrou o caso no crime de envenenamento. Mas, para o tribunal de segunda instância, a jurisprudência no país é clara no sentido de que feto não é indivíduo e não pode ser vítima de crime. Por esse entendimento, a menor só teria direito à indenização se tivesse sofrido algum dano após o seu nascimento, e não antes disso.

Para tomar essa decisão, o tribunal citou um julgamento de 1994 da House of Lords, que fazia as vezes de Suprema Corte do Reino Unido até 2009. Na ocasião, foi julgado se um homem poderia ser condenado por assassinato por bater numa gestante e provocar o parto prematuro do bebê, que morreu depois de quatro meses. O homem acabou condenado por homicídio culposo. Durante o julgamento, foi defendido por alguns juízes que, antes de nascer, o bebê não tem personalidade humana e não pode ser vítima de crime de violência (clique aqui para ler em inglês).

Não há data prevista para a conclusão do julgamento na Corte de Apelação. E, provavelmente, a discussão não deve se encerrar aí. A responsabilidade das gestantes pelo cuidado com o feto na barriga ainda deve chegar à Suprema Corte do Reino Unido e à Corte Europeia de Direitos Humanos.

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