Manifestação política

Facebook não deve apagar críticas de relevância pública

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15 de março de 2014, 10h54

“O programa da nova ordem democrática principalmente quando em debate assuntos de relevância pública tem sede, e fome, e desejo, e vontade, de discussão, de sair às ruas, de sentir a gente viva, de protestar, de até proferir ironias e palavras chulas.” Com esse entendimento, o juiz Fernando Antonio de Lima, da Vara do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Jales, revogou tutela antecipada que determinava que o Facebook apagasse comentários tidos como ofensivos, relacionados aos trabalhos de uma publicitária.

A decisão foi tomada depois de novos documentos, apresentados pela própria publicitária, terem demonstrado que as supostas ofensas não foram dirigidos a ela, mas que foram feitos para fins de manifestação política, crítica à Administração Pública Municipal.

No caso, a publicitária foi contratada para projetar o logotipo da Feira Agrícola, Comercial, Industrial e Pecuária de Jales (Facip) — festa popular na região de Jales — e disponibilizou o material na rede social, com restrição de acesso à equipe de trabalho. Mas o trabalho acabou sendo divulgado no Facebook para outros usuários, seguido de vários comentários de baixo calão — como “Mas ó, que ficou uma merca, ficou" (sic) — feitos por um usuário anônimo. Por solicitação do advogado da publicitária, a empresa retirou as imagens do ar, mas os comentários permaneceram.

Em recurso, a publicitária trouxe aos autos a explicação da pessoa que fez os cometários no Facebook. Uma parte da nota diz: “Essa página foi criada com a intenção de criticar certas coisas que nós, população, não concordamos. Porém estão tentando nos calar, o que é triste. Não temos partido político, faço piada com amigos e tudo mais, não tem essa de camaradagem, quando a prefeita acertar em algo, pode ter certeza que iremos parabenizá-la, mas por enquanto, não temos motivo algum”.

Sendo assim, segundo o juiz, os novos documentos apresentados pela publicitária mostraram que as críticas feitas pelos usuários do Facebook eram para expressar o não contentamento da população com o manejo da coisa pública por representantes populares. “Tanto que, em momento algum, a pessoa da autora teria sido vinculada ao trabalho objeto dos comentários”, afirmou o juiz.

A publicitária pediu ainda sigilo processual alegando que o caso ganhou grande repercussão nacional e que, por isso, estava sofrendo ainda mais ofensas. Entretanto, o magistrado entendeu que o fato discutido é de inegável interesse público e que a discussão diz respeito às relações de trabalho da publicitária, não à intimidade dela.

A decisão, no entanto, determinou que o Facebook apresente, em dez dias, os dados do responsável pela página que contém as expressões contestadas pela autora.

Tutela antecipatória
A tutela antecipada tinha sido concedida porque o juiz entendeu que embora a liberdade de expressão e de manifestação do pensamento estejam previstas na Constituição Federal, não se pode sair do campo da discordância, "para penetrar o palco delituoso da ofensa”, afirmou.

Na época, ele levou em consideração que a crítica ao trabalho virou um “repertório de deselegância”, que pode afetar direitos da personalidade da autora, como honra, imagem e bom nome. De acordo com ele, as redes sociais são importantes canais de divulgação de ideias, mas não podem transformar-se em terras sem lei.

Clique aqui para ler a decisão.

Processo 0001743-42.2014.8.26.0297

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