Processo Novo

Reformas constitucionais devem aprimorar RE e REsp

Autor

  • José Miguel Garcia Medina

    é doutor e mestre em Direito professor titular na Universidade Paranaense e professor associado na UEM ex-visiting scholar na Columbia Law School em Nova York ex-integrante da Comissão de Juristas nomeada pelo Senado Federal para elaboração do anteprojeto que deu origem ao Código de Processo Civil de 2015 advogado árbitro e diretor do núcleo de atuação estratégica nos tribunais superiores do escritório Medina Guimarães Advogados.

19 de maio de 2014, 8h00

Retorno, no presente texto, a assunto recorrente, aqui na coluna Processo Novo: as Propostas de Emenda Constitucional relacionadas aos recursos extraordinário e especial, dirigidos, respectivamente, ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça.

Faço-o, agora, em razão da apresentação e aprovação por comissão designada pela Câmara dos Deputados, no último dia 13 de maio, de substitutivo à proposta original da PEC 209/2012. O substitutivo acrescenta disposições à proposta original da PEC, restringindo ainda mais o cabimento do recurso especial, e trata, também, da denominada súmula impeditiva de recursos (o texto do substitutivo aprovado pode ser acessado aqui; a proposta original da PEC pode ser lida aqui).

Tenho ressalvas à proposta original da PEC 209/2012 (cf. o que escrevi em outro texto desta coluna). E mais restrições ainda ao substitutivo agora apresentado e aprovado, acima referido. Gostaria de destacar algumas delas.

Não considero acertada a ideia de se restringir o cabimento de recurso especial apenas às causas cujo valor supere duzentos salários mínimos.[1] Uma causa não é necessariamente menos importante apenas pelo fato de envolver um valor monetário inferior. Se é possível afirmar que causas de valores muito elevados podem merecer alguma atenção diferenciada, a recíproca não é verdadeira. Por exemplo, situações em que litigam pessoas menos favorecidas economicamente em causas de valor econômico mais reduzido, por conta de referido critério, ficarão automaticamente fora do alcance da atuação do Superior Tribunal de Justiça. O valor econômico poderá não ser tão grande sob o ponto de vista do Tribunal, mas poderá representar todas as economias das pessoas envolvidas. O substitutivo propõe algumas regras procedimentais que, a meu ver, caberiam melhor em textos infraconstitucionais – e o CPC, evidentemente, é a melhor sede.

A título exemplificativo, a previsão de prazo máximo para o sobrestamento de recursos no tribunal de origem[2] é algo previsto no projeto de novo CPC.[3] Por outro lado, como a PEC 209/2012 versa apenas sobre recurso especial, haverá, se aprovada, previsão de prazo para julgamento desse recurso pelo Superior Tribunal de Justiça, sem que algo semelhante se faça, em relação ao recurso extraordinário dirigido ao Supremo Tribunal Federal. Por fim, a súmula impeditiva de recursos, tal como prevista no substitutivo[4] – reproduzindo, no particular, o que se propõe na PEC 358/2005 –, encontra-se em descompasso com o que de mais moderno se tem produzido, na doutrina brasileira, a respeito de decisões orientadas por precedentes, em grande medida retratadas no projeto de novo Código de Processo Civil. No ponto, o projeto de novo CPC contém disposições interessantes, que levam os sujeitos do processo (as partes, em suas petições; os juízes, em suas decisões) a justificarem suas razões em atenção ao que se firmou na jurisprudência, não apenas através de enunciados sumulados, mas também em julgamentos de casos repetitivos (tenho feito referência à ideia de jurisprudência íntegra, cf. pode ser visto aqui e aqui).

Tal como se prevê no substitutivo, contudo, as partes não teriam condições de demonstrar que o entendimento sumulado estaria superado (a revisão da súmula só poderia ser pleiteada por legitimados para propor ADIn) ou, sequer, que a súmula não se aplicaria ao caso. Em relação a esses aspectos, tudo indica a conveniência de se aguardar a finalização dos trabalhos que estão sendo realizados pelo Senado Federal, quanto ao projeto de novo Código de Processo Civil (cf., a respeito, o que escrevi aqui). Há que se considerar, por fim, que tramita, também na Câmara dos Deputados, a PEC 275/2013, que, de modo mais amplo, dispõe não apenas a respeito do recurso especial, mas também do recurso extraordinário. É importante que as duas propostas tramitem em conjunto, para que se reúnam num só texto as qualidades que ambas ostentam (fiz sugestões de aperfeiçoamentos às referidas propostas em outro texto, disponível aqui).

É imprescindível, de todo modo, que sejam repelidas ideias que se encontrem em descompasso com a importantíssima função que devem exercer, entre nós, os tribunais superiores.

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 [1] De acordo com o que se propõe no substitutivo, o artigo 105 da Constituição vigoraria acrescido de parágrafo com o seguinte teor: “§ 6º Não cabe recurso especial nas causas com valor inferior a 200 (duzentos) salários mínimos, salvo se houver divergência entre a decisão recorrida e súmula do Superior Tribunal de Justiça”.

[2] Os seguinte parágrafo, de acordo com o substitutivo, deve ser acrescido ao artigo 105 da Constituição: “§ 3º Acolhida a relevância, o recurso especial será submetido a julgamento em até doze meses. Superado este prazo, os recursos sobrestados na origem deverão ser encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento”.

[3] Na versão do Senado, artigo 991; na versão da Câmara, artigo 1.050. Ambas as versões estão disponíveis para download também em nosso blog, aqui.

[4]  De acordo com o substitutivo, acrescenta-se à Constituição o artigo 105-A, com o seguinte teor: “Art. 105-A. O Superior Tribunal de Justiça poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de quatro quintos dos membros do órgão fracionário competente, após reiteradas decisões sobre a matéria, aprovar súmula que, a partir de sua publicação, constituir-se-á em impedimento à interposição de quaisquer recursos contra a decisão que a houver aplicado; bem como proceder à sua revisão ou cancelamento. § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2º A aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada originariamente perante o Superior Tribunal de Justiça por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3º São insuscetíveis de recurso e de quaisquer meios de impugnação e incidentes as decisões judiciais, em qualquer instância, que deem a tratado ou lei federal a interpretação determinada pela súmula impeditiva de recurso.”

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