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A banalização do conceito de dignidade humana pelo STF

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12 de maio de 2014, 8h36

Spacca
Caricatura: Robson Pereira - Colunista [Spacca]O conceito de dignidade humana é um dos mais difundidos nos dias atuais, estando presente, de forma explícita, nas Constituições de um grande número de países. Mas a sua aplicação, principalmente no Brasil, tem ocorrido de "forma corriqueira e obscura", ficando, na maioria das vezes, ao mero arbítrio de cada julgador, na sustentação de teses que não guardam relação entre os conceitos jurídicos e filosóficos da dignidade da pessoa humana e o que está sendo decidido. Em outras palavras, "uma abstração vaga utilizada por juízes para decidir casos difíceis, no sentido que quiserem, de acordo com seus sentimentos pessoais".

As críticas contundentes são de João Costa Neto, doutorando e mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília e em Direito Público, pela Universidade Humboldt de Berlim, e estão expostas em Dignidade Humana Visão do Tribunal Federal Constitucional Alemão, do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Europeu. Com base na análise detalhada da jurisprudência das três cortes, Costa Neto conclui que, de um modo geral, o tribunal brasileiro não se sai bem na comparação, diante da "facilidade e da banalidade" com que evoca e recorre à dignidade humana a fim de ver solucionadas as mais diversas e variadas questões. "Enquanto instituição, o STF precisa preocupar-se mais com a conceituação, ainda que aproximada, do que seja dignidade humana, algo que não foi feito a contento até o momento", afirma o autor.

Ao fazer uma busca no banco de dados eletrônico do STF, Costa Neto encontrou 216 acórdãos e 1.599 decisões monocráticas nas quais os termos "dignidade" e "humana", conjugados, foram encontrados, embora em nenhuma das 768 súmulas, vinculantes e ordinárias publicadas pela corte o tema tenha sido abordado. Mas o problema principal detectado por ele não está ligado à quantidade, mas a qualidade das menções. Na análise individualizada dos votos, ele destaca variados "erros individuais", que, se não chegaram a alterar o resultado dos julgamentos, "favorecem a imprevisibilidade das decisões da corte e mina sua credibilidade".

Apenas dois ministros do Supremo ficaram de fora das críticas. Dias Toffoli, pelo "esforço consistente no sentido de não banalizar a utilização do conceito de dignidade humana" e Gilmar Mendes, por "invocar o conceito de dignidade humana de maneira sistemática e com precisão, sem trivializá-lo".  Além de apontar um a um os "erros individuais" do demais ministros, Costa Neto  também enumera diversos casos em que o STF ficou a dever uma definição mais clara do que seja dignidade humana, ao mesmo tempo em que não conseguiu esclarecer, nos fundamentos das respectivas decisões, "em que medida a dignidade humana era capaz de amparar uma determinada tese jurídica". Isso teria ocorrido, por exemplo, no julgamento conjunto da ADI 4424 e da ADC 19, envolvendo um ponto crucial na aplicação da Lei Maria da Penha; no julgamento da ADI 3510, em que o STF julgou a constitucionalidade da chamada Lei da Biossegurança e na ADPF 54, sobre a interrupção da gestação de feto anencefálico.

Por outro lado, o autor também detectou "momentos de lucidez por parte do STF" no que tange ao uso do conceito, notadamente nos casos em que a corte se debruçou sobre o mínimo existencial e as uniões homoafetivas. Para ele, em ambos os casos as decisões foram tomadas com base em argumentos fundados na dignidade humana, sem que isso implique incoerência e inconsistência. "Mas esses casos parecem ser exceções, em meio a um conjunto confuso de pronunciamentos do STF acerca da dignidade humana", resume.

Serviço:
Título: Dignidade Humana — Visão do Tribunal Constitucional Alemão, do STF e do Tribunal Europeu
Autor: João Costa Neto
Editora: Saraiva
Edição: 1ª Edição 2014
Número de Páginas:  200
Preço: R$ 48,00 

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