Princípio da anualidade

Minirreforma eleitoral não deve valer para eleições gerais de 2014

Autor

  • Bruno Martins

    é advogado eleitoral sócio do escritório GMF Advocacia doutorando em Direito pela Universidade Católica de Santa Fé Argentina coordenador e professor do curso de Direito Eleitoral da Atame Pós Graduação e Cursos.

18 de junho de 2014, 6h09

No dia 11 de dezembro de 2013, a Presidente da República, sancionou a famigerada minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013), aprovada pelo Congresso Nacional.

Coincidência ou não, mas nos últimos oito anos, sempre que estavam próximas as eleições gerais, tivemos alterações na legislação eleitoral, por intermédio das“minirreformas eleitoral”, a saber: 1) Primeira minirreforma eleitoral (Lei 11.300/2006); 2) Segunda minirreforma eleitoral (Lei 12.034/2009); e 3) Terceira minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013).

A legislação eleitoral é de difícil compreensão por parte dos candidatos, cabos eleitorais, e até pelos próprios operadores do direito por vários motivos, posto que: 1) Possui uma legislação pulverizada; 2) O Código Eleitoral é de 1965, está totalmente obsoleto, devendo ser interpretado de acordo com as normas supervenientes; 3) A Justiça Eleitoral não possui juízes permanentes de carreira, sofrendo assim uma oxigenação e constantes mudanças em seus julgados; 4) Até 5 de março do ano da eleição o Tribunal Superior Eleitoral deverá expedir as resoluções que irão nortear as eleições daquele ano. Assim,por essas e outras razões todos aqueles que atuam perante a Justiça Eleitoral devem estudar diuturnamente, para invocar o melhor direito a favor do seu cliente.

Por outro lado, antes da terceira e última minirreforma eleitoral ser sancionada, ainda quando era somente um projeto de lei do Senado Federal (PLS 441/2012), cujo autor foi o Senador Romero Jucá, teve como objetivo reduzir o tempo das campanhas de três para dois meses, bem como diminuir seu custo. Ainda nessa linha, somente a título de curiosidade, o tempo da campanha foi reduzido somente em dois dias, ou seja, a data das convenções partidárias para escolha de candidatos passou de 10 a 30 de junho para 12 a 30 de junho do ano das eleições.

Impende destacar que a minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013) trouxe alterações tardias, porém necessárias para a legislação eleitoral, todavia, precisamos fazer uma verdadeira Reforma eleitoral, e não uma Minirreforma eleitoral com tamanha timidez, como a que foi sancionada, e que seja suficiente para tratar de todos os assuntos necessários e, quiçá enxergar essas alterações.

Como o escopo do presente texto não é abordar a minirreforma eleitoral propriamente dita, e sim demonstrar sua possível aplicabilidade para este pleito, seguem algumas alterações trazidas na minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013):

1. Dupla filiação: no caso de filiação a dois ou mais partidos, prevalecerá a filiação mais recente;
2. Data da convenção partidária: ficaram fixadas no período de 12 a 30 de junho do ano das eleições, em vez do período de 10 a 30 de junho;
3. Parcelamento de multas eleitorais: limitou o parcelamento de multas eleitorais a 10% da renda da pessoa, sendo que o parcelamento pode ser feito em até 60 meses.
4. Substituição de candidatos: a minirreforma unificou o prazo de substituição de candidatos nas eleições majoritárias e proporcionais, assim a substituição se efetivará se o pedido for apresentado até 20 dias antes do pleito.
5. Gastos com alimentação e aluguel: Estabeleceu o limite de 10% da receita obtida para gastos com alimentação e 20% para gastos com aluguel de veículos, entre outras alterações feitas pela minirreforma.

Antes mesmo da minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013) ser sancionada, começaram os rumores sobre sua validade para as eleições gerais de 2014.

No intuito de elucidar a questão acerca da validade da minirreforma para essas eleições, é preciso fazer alusão a um dos princípios basilares do Direito Eleitoral: o principio da anualidade eleitoral que, de acordo com o artigo 16, caput, da Constituição Federal de 1988 dispõe que: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.”

Ao se interpretar o texto do artigo 16, caput da Constituição Federal, verifica-se que, como a minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013) fora sancionada no dia 11 de dezembro de 2013, logo, não deveria ser aplicadanas eleições de 5 de outubro de 2014, ou melhor, não poderia ser aplicada nas eleições de 2014, tendo que respeitar o princípio da anualidade, sendo que ela somente seria aplicada nas eleições municipais de 2016.

Necessário lembrar que não há uma definição cristalina sobre o que seja “o processo eleitoral” (consoante o artigo 16 da Constituição Federal), e é com base nessa indefinição que já vivenciamos situações em que leis sancionadas às vésperas das eleições tiveram validade, quais sejam: Lei 11.300/2006 (primeira minirreforma eleitoral) e a Lei Complementar 135/2010 (lei da ficha limpa), sendo que esta última o STF entendeu que só poderia ser aplicada nas eleições de 2012 e não em 2010, quando fora sancionada, por desrespeitar o princípio da anualidade.

Ainda nessa linha, no dia 13 de dezembro de 2013, em nota distribuída pela assessoria do Tribunal Superior Eleitoral, o então presidente da Corte Eleitoral, ministro Marco Aurélio de Mello, afirmou que as mudanças trazidas pela minirreforma não poderiam ser aplicadas nas eleições de 2014.[1]

Na mesma nota distribuída pela assessoria do TSE, o ministro Marco Aurélio de Mello, chamou atenção dizendo que: “A Constituição Federal revela em bom português, em bom vernáculo, que a lei que, de alguma forma, altere o processo eleitoral entra em vigor imediatamente, mas não se aplica à eleição que se realiza até um ano após”.

Após o pronunciamento do ministro Marco Aurélio de Mello, que naquela ocasião ainda presidia a Corte Eleitoral, em 19 de dezembro de 2013, o senador Sérgio de Souza (PMDB-PR) apresentou uma consulta ao Tribunal Superior Eleitoral, — Consulta 100075, relator ministro João Otávio de Noronha —, na qual questiona se a minirreforma eleitoral (Lei 12.891/2013) será aplicada nas eleições de 2014.

Por outro lado, em 13 de maio do presente ano, o ministro Dias Toffoli tomou posse como presidente do Tribunal Superior Eleitoral e, em entrevista sobre os desafios da nova gestão, quando indagado sobre a minirreforma eleitoral, de pronto respondeu que existe uma consulta no TSE sobre a minirreforma que, a princípio, entende que a ampla maioria dos seus dispositivos é passível de aplicação, finalizando que a Corte Eleitoral já está preparando eventual alteração nas resoluções para que quando chegar o dia 10 de junho — data esta em que se iniciam as convenções partidárias — estas já estejam de maneira adequada, além de todos os partidos e candidatos cientes das regras do jogo.[2]

Dessa forma, com base nas declarações do presidente do TSE,ministro Dias Toffoli, resta claro que a minirreforma eleitoral valerá para as eleições gerais de 2014. Todavia, já entramos no período permitido para a realização das convenções partidárias para escolha de candidatos (10 a 30 de junho), sendo que a partir de 10 de junho é assegurado o exercício de direito de resposta ao candidato, partido ou coligação atingidos — ainda que de forma indireta — por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica que seja difundida por qualquer veículo de comunicação social, e até o presente momento a Consulta nº 100075,que trata da validade da minirreforma eleitoral para as eleições gerais de 2014, ainda se encontra pendente de julgamento.

Essa insegurança jurídica acerca da validade da minirreforma eleitoral para as eleições de 2014, com a pendência de julgamento da referida Consulta 100075/TSE, impacta oscandidatos que poderiam adiantar orçamentos em relação à confecção de adesivos para suas campanhas, pois até o presente momento o tamanho permitido dos adesivos para veículos é de 4m2, entretanto, a minirreforma eleitoral diminui esse tamanho para 50 cm por 40 cm. Essa morosidade do julgamento também impacta negativamente empresários gráficos e artesãos que produzem manualmente bonecos, pois com a minirreforma, os bonecos estão proibidos, bem como os cavaletes. Além disso, essa dúvida incide sobre os operadores do direito, pois como exemplo, considere-se o caso do autor deste artigo que até o presente momento não publicou o manual que sempre escreve em ano de eleição, intitulado Manual do Candidato Eleições 2014, por desconhecer se a minirreforma terá validade de forma parcial ou total para as eleições de 2014.

Concluindo, na minha interpretação de operador do direito, acredito que em respeito ao princípio da anualidade (artigo 16, caput da Constituição Federal de 1988) a minirreforma eleitoral não pode ter validade para as eleições gerais de 2014, nem de forma parcial tampouco de forma total. Esse é o entendimento do ex-presidente do TSE, ministro Marco Aurélio de Mello, que afirma que a Constituição revela esse sentimento em bom português e em bom vernáculo, todavia, pela indefinição do conceito existente no artigo 16 da Constituição, de que trata “o processo eleitoral”, é com base nessa indefinição que já experimentamos situações em que leis sancionadas às vésperas das eleições tiveram validade, quais sejam: Lei 11.300/2006 (primeira minirreforma eleitoral) e a Lei Complementar 135/2010 (lei da ficha limpa), sendo que esta última o STF entendeu que só poderia ser aplicada nas eleições de 2012.

Desse modo, mesmo não concordando com a validade da minirreforma para as eleições gerais de 2014, com fundamento no histórico da primeira minirreforma eleitoral e na lei da ficha limpa, é que acredito que, infelizmente, mais uma vez, as regras do jogo serão mudadas aos 45 minutos do segundo tempo e questiono: será que essas alterações permitirão o Brasil ser campeão na pseudocopa das copas?


[1]http://www.valor.com.br/politica/3371768/presidente-do-tse-diz-que-minirreforma-eleitoral-nao-vale-para-2014#ixzz34eJO69Ru

[2]http://www.tse.jus.br/noticias-tse/2014/Maio/em-entrevista-presidente-do-tse-fala-sobre-desafios-da-nova-gestao

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  • é advogado eleitoral, sócio do escritório GMF Advocacia, doutorando em Direito pela Universidade Católica de Santa Fé, Argentina, coordenador e professor do curso de Direito Eleitoral da Atame Pós Graduação e Cursos.

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