Exceção à regra

Deputado que recebe três “salários” tem bloqueio de 30% dos rendimentos

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17 de julho de 2014, 16h04

Embora o Código de Processo Civil considere impenhoráveis os salários, subsídios e benefícios recebidos por aposentadoria, é possível flexibilizar a regra quando o devedor tem “elevada renda mensal” e o bloqueio não o colocará em dificuldade financeira. Essa foi a tese adotada pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso para determinar a penhora de 30% dos rendimentos do deputado federal Júlio José de Campos (DEM-MT).

O deputado recebe três benefícios por mês, que em junho chegaram, somados, a R$ 85,6 mil: subsídio da Câmara dos Deputados (R$ 26,7 mil), pensão vitalícia paga pelo estado de Mato Grosso por ter sido governador (R$ 24,1 mil) e aposentadoria e auxílio pelo seu tempo como conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (R$ 34,8 mil). Os dados baseiam-se nos rendimentos brutos recebidos no mês passado, conforme os sistemas de transparência de cada um dos órgãos.

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O valor penhorado deve ser usado para quitar uma dívida de R$ 422,2 mil, gerada a partir de cheques assinados por Campos (foto) em 2000. Ele havia contratado na época uma prestadora de serviços e dado cinco cheques pré-datados para o dono da empresa. O proprietário transferiu à ex-mulher todos os direitos que possuía sobre esses títulos, e foi ela quem procurou a Justiça quando o pagamento foi interrompido.

A Ação Monitória (para reconhecer o título) teve sentença favorável à autora em 2005, mas a defesa de Campos apresentou uma série de recursos. Em 2012, o Superior Tribunal de Justiça aplicou multa de 5% sobre o valor da causa, definindo os embargos como protelatórios. Após o caso transitar em julgado, a mulher entrou com Ação de Execução para concretizar o recebimento. O pedido de penhora foi negado em primeira instância, porque o juízo entendeu que seria incorreto afetar os rendimentos do político.

O advogado Breno Miranda, sócio do escritório Elarmin Miranda Advogados Associados, alegou então que a penhora de 30% de cada benefício não alcançaria parcela indispensável à subsistência de Campos, diante das suas diversas fontes de renda, e apontou que a ação principal tramita há 13 anos, sem efetiva execução. Para a desembargadora Cleuci Terezinha Chagas, relatora do caso, a doutrina e a jurisprudência já têm aceitado relativizar o dispositivo sobre a impenhorabilidade do salário.

No caso analisado, a magistrada avaliou que o valor cobrado não impediria o deputado de “manter com o seu próprio sustento e o de sua família”. “Não seria justo autorizar o funcionário público aposentado ou qualquer outro assalariado contrair dívidas, sabendo que o Judiciário não permitirá penhora sobre seus vencimentos, proventos, e/ou salário”, afirmou a relatora, seguida por unanimidade.

A decisão foi proferida em fevereiro deste ano e transitou em julgado em maio. Segundo Breno Miranda, os bloqueios já estão sendo feitos pelos órgãos que pagam os benefícios do deputado. Os valores devem ser transferidos para uma conta judicial e depois repassados à autora.

Serviço não feito
A revista Consultor Jurídico contatou o gabinete do deputado, mas não recebeu resposta às questões enviadas. Nos autos da Ação Monitória, ele disse que sustou o pagamento de quatro dos cinco cheques porque o serviço de prestações de serviços não havia sido cumprido devidamente pelo contratado. Alegou ainda que houve má-fé na transferência do título para a ex-mulher do dono da empresa, “para lograr êxito no recebimento total do valor do contrato”. O TJ-MT, no entanto, julgou que ele não conseguiu comprovar seus argumentos.

Clique aqui para ler o acórdão.

Agravo de Instrumento 104563/2013

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