Transmissões ao vivo

Superexposição contamina julgamentos no STF, diz Barbosa

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25 de janeiro de 2014, 12h51

A superexposição dos ministros durante as transmissões ao vivo contamina os julgamentos da corte. A afirmação é do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa e foi feita em uma conferência para cerca de 200 juristas e acadêmicos em Paris. As informações são da Folha de S.Paulo.

Sem citar nomes de colegas, Joaquim Barbosa afirmou que o fenômeno da superexposição "repercute na maneira como certos ministros deliberam e sobre o conteúdo de algumas decisões". Segundo ele, o problema é mais agudo nas sessões plenárias, onde são decididos os casos mais importantes pelos onze ministros, do que nas sessões das turmas.

"[Nas turmas,] a maior parte dos acórdãos do tribunal nasce de consensos reais que resultam em decisões relativamente curtas e coerentes", disse.

No discurso lido em francês durante 47 minutos, o presidente do STF afirmou que a lei que criou a TV Justiça foi um "imperativo democrático" e que as transmissões reforçam a transparência ao permitir que os cidadãos exerçam um controle mais eficaz sobre as atividades da corte.

Mas, em seguida, citou "brechas" do modelo de julgamento televisionado: favorecer a falta de objetividade dos magistrados e dificultar a deliberação baseada no diálogo entre os juízes. Na prática, as decisões resultam de um somatório de votos escritos com antecedência, não do debate entre os ministros durante as sessões.

"A individualidade prevalece sobre o colegiado e nós não sabemos exatamente que fundamentos basearam as decisões", disse Barbosa, durante colóquio realizado nesta sexta no Conselho Constitucional (equivalente francês do STF).

A conferência proferida por Barbosa, seu último compromisso oficial na capital francesa, foi sobre a influência da publicidade sobre a racionalidade das decisões tomadas pelo STF.

Holofones no STF
No seu diagnóstico dos problemas causados pelos holofotes sobre o Supremo, Joaquim Barbosa expressou incômodo com o tom da cobertura jornalística sobre as atividades da corte.

Segundo ele, os veículos de comunicação brasileiros privilegiam a cobertura das relações entre os ministros — ou, não raramente, os atritos entre eles — em detrimento do conteúdo das decisões. "O tribunal é de alguma forma uma vítima de seu próprio sucesso. Se a transparência é democraticamente desejável e essencial, é necessário combinar com decência e moderação", disse.

"A decência dos jornalistas de se concentrar nas questões jurídicas e não nas questões pessoais. E a moderação dos ministros para que o colegiado triunfe sobre a individualidade", concluiu.

Projeto de Lei
A transmissão das sessões do STF é polêmica e já está na mira de um Projeto de Lei em trâmite no Congresso. O deputado Vicente Cândido (PT-SP) pretende vetar todas as transmissões em tempo real das sessões plenárias da corte. O texto altera trecho da lei de TV a cabo que trata da criação do canal reservado ao STF, a TV Justiça.

Para o deputado petista a transparência não se caracteriza pela transmissão dos julgamentos, servindo, para isso, a publicidade das decisões. “Na verdade, as entranhas da Justiça vêm sendo mostradas com sensacionalismo exacerbado por parte de alguns ministros em particular”, diz Vicente Cândido, ao comentar o projeto em seu site. “O que a Constituição exige é a publicidade dos atos e não o andamento dos trabalhos”, sentencia.

Do outro lado, o ministro Marco Aurélio afirma que o Projeto de lei é impensável e defende transmissões. “Não há espaço para obscurantismo. Em pleno século XXI, pretender voltar às cavernas é um retrocesso bárbaro”, diz. O ministro foi quem sancionou a Lei 10.461 que criou a TV Justiça em 2002, pela Lei 10.461. Na época, ele era presidente da corte e exercia interinamente a Presidência da República durante o governo Fernando Henrique Cardoso.

*Texto alterado às 18h09 para acréscimo de informações.

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