Crise nas prisões

OAB forma novo grupo para monitorar sistema carcerário

Autor

20 de janeiro de 2014, 6h18

A Ordem dos Advogados do Brasil anunciou, na sexta-feira (17/1), a criação da Coordenação de Acompanhamento do Sistema Carcerário, que verificará a situação nos presídios brasileiros. O órgão será comandado por Adilson Geraldo Rocha, de Minas Gerais, com Márcio Vitor Meyer de Albuquerque (CE) como vice-presidente e Umberto Luiz Borges D’Urso (SP) como secretário, e reunirá representantes de todos os estados, além do Distrito Federal.

A criação da coordenação foi definida em dezembro, mesmo mês em que a OAB apresentou denúncias à Organização dos Estados Americanos sobre a falta de condições no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão. O local serve como retrato da situação em diversas partes do país, com desrespeito aos direitos humanos, problemas de lotação e brigas entre detentos trazendo violência e medo aos presos, agentes e parentes de quem vive esta situação.

O Conselho Federal da OAB recomendou a todas as seccionais que visitem as unidades de seus estados e montem um relatório com informações sobre a situação. Cada seccional tem liberdade para definir as medidas que deverá tomar, incluindo Ações Civis Públicas junto ao Judiciário local ou a apresentação de denúncias à OEA, como fez ainda em 2013 a OAB do Rio Grande do Sul, que focou sua atuação na situação do presídio central de Porto Alegre.

Crise
De acordo com José Carlos Cal Garcia Filho, presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB do Paraná, a situação no estado já é problemática, consequência da divisão da parte administrativa do sistema prisional entre a Secretaria de Justiça e a Secretaria de Segurança Pública, “que não conversam bem entre si”. A isso se somam, segundo ele, problemas como a falta de segurança para os agentes penitenciários, falta de remédios ou a pequena assistência jurídica aos presos, que atingem especialmente as penitenciárias, que são administradas pela Secretaria de Justiça.

Nas delegacias, a situação é ainda mais grave, pois a infraestrutura é bem mais deficiente e a superlotação é grande, com registro de unidades abrigando 100 presos em espaço destinado a 25 pessoas, ou 160 a 180 pessoas em uma área para 25 presos, como ocorre no 4º Distrito Policial de Londrina, confirmou ele. Nestas unidades, há presos já condenados misturados com pessoas que estão atrás das grades por falta de pagamento de pensão alimentícia.

José Carlos Garcia Filha afirma que a Ordem dos Advogados do Brasil monitora a situação de superlotação no sistema carcerário paranaense, com relatórios anuais sobre todos os estabelecimentos estaduais, “e os resultados são muito tímidos ainda”. Ele aponta que os casos de tentativa de fuga são diários nas delegacias, conforme relatos dos próprios policiais, chamando a atenção para o desvio de função dos oficiais, que cuidam de presos em vez de exercer suas funções prioritárias.

Ele fala que, apenas no Complexo Penitenciário de Piraquara (PR), foram registradas três rebeliões em um mês, sendo que uma delas inclui a “greve” de presos, que se recusam a sair de suas celas. A tensão entre presos e agentes que atuam no local é elevada, diz o advogado, e os problemas podem ocorrer a qualquer momento, sendo que as reclamações das duas partes são semelhantes, incluindo falta de segurança e problemas estruturais.

Origem
Outro estado em que a OAB acompanha de perto a situação é o Rio Grande do Sul. Ricardo Breier, secretário-geral da OAB-RS, afirma que o primeiro relatório apontando a crise no Presídio Central de Porto Alegre, “ considerado o pior dos país”, foi feita em abril de 2012, quando ele ainda presidia a Comissão de Direitos Humanos. O trabalho foi feito em conjunto com representantes dos Conselhos Regionais de Engenharia e do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul.

Segundo ele, a análise do Crea apontou falta de infraestrutura, recomendando a interdição do presídio porque “o local representa riscos à saúde, à segurança das pessoas e ao meio ambiente”. Opinião semelhante partiu do Cremers, que alertou para o risco de morte dos presos que estavam doentes, afirma Ricardo Breier. Ele relata que “o laudo foi encaminhado para a Secretaria de Segurança Pública gaúcha, que prometeu soluções, porém nada mudou”, como constatado durante nova vistoria, em dezembro, acompanhada pelo Conselho Federal.

O representante explica que a OAB-RS “está aguardando a resposta do estado à sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, tribunal vinculado à Organização dos Estados Americanos, que determinou uma série de medidas cautelares no Presídio Central de Porto Alegre”. Após o pronunciamento do governo gaúcho, serão definidos os próximos passos, conclui Ricardo Breier.

Relato semelhante
O cenário não é diferente em Minas Gerais. De acordo com Willian Santos, presidente do Conselho de Direitos Humanos da OAB local, o foco da atuação neste começo de ano deve ser o Centro de Remanejamento do Sistema Prisional da Gameleira, que fica em Belo Horizonte e foi palco, na última semana, de um homicídio, ainda que o caso tenha sido relatado como suicídio. Ele diz que a OAB já foi informada sobre a existência de uma sala de torturas no local.

Willian Santos confirma que todas as informações recebidas pela OAB sobre casos de violência nos presídios mineiros são pesadas, indicando que alguns crimes contam com envolvimento de agentes penitenciários. Ele define a situação em Minas Gerais como “um caos, com superlotação recorrente e persistente”, e diz que é real o risco de uma crise de violência dentro do sistema prisional estadual.

Direitos Humanos
No Rio de Janeiro, a situação é um pouco melhor, afirma Maíra Fernandes, presidente do Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro. Segundo ela, não há episódios de violência, os agentes penitenciários conseguem entrar nas celas e controlar a segurança nos locais. Ainda assim, o sistema penitenciário fluminense apresenta outras mazelas, como a superlotação: são cerca de 8 mil presos a mais do que o total de vagas.

Também há excesso de presos provisórios, e muitos apenados não conseguem o benefício da progressão de penas, mesmo que tenham direito a isso. O regime semi-aberto, aponta ela, é “semi-fechado”, pois muitos juízes não autorizam o trabalho extra-muros dos envolvidos, que ficam soltos dentro das unidades, mas não conseguem sair e trabalhar. Na visão da especialista, o Judiciário prende mais do que o necessário, tornando a prisão uma regra, e não exceção, e não adota como seria necessário a aplicação de medidas alternativas.

Outro ponto citado por ela é a existência de apenas uma Vara de Execuções Penais em todo o estado, com quatro juízes, que acumulam funções em outras varas, sendo responsáveis por todo o sistema, algo que só ocorre em outros cinco estados, “todos com perfil de população carcerária infinitamente menor”. A VEP é responsável por mais de 34 mil presos, além dos beneficiados com monitoramentos eletrônico, o que dificulta ainda mais o respeito aos benefícios previstos em lei e estimula a superlotação no sistema carcerário do Rio de Janeiro, informa Maíra Fernandes. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB. 

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!