Retrospectiva 2013

STF concluiu julgamentos relevantes em matéria tributária

Autor

  • Fábio Martins de Andrade

    é advogado doutor em Direito Público pela UERJ e autor da obra “Modulação em Matéria Tributária: O argumento pragmático ou consequencialista de cunho econômico e as decisões do STF”.

3 de janeiro de 2014, 8h12

Spacca
Com a conclusão dos trabalhos no corrente ano judiciário é possível traçar retrospecto com os principais julgamentos ocorridos (iniciados, retomados e/ou concluídos) no Supremo Tribunal Federal em matéria tributária.

Quebrando um jejum dos anos anteriores, 2013 foi rico, com a conclusão de julgamentos que se prolongavam por mais de década, ou aguardavam o pronunciamento definitivo da Suprema Corte com impacto em um sem número de outros processos em trâmite junto ao Poder Judiciário (dado o efeito multiplicador de alguns temas).

Muito do que foi alcançado se deve ao empenho pessoal do presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, que desde o primeiro instante empenhou-se publicamente no sentido de reduzir o enorme volume de casos represados em razão de julgamentos intermináveis e, mais recentemente, do reconhecimento de repercussão geral.

Com isso, o objetivo de aplicar os precedentes aos demais casos que versam sobre a matéria decidida é alcançado em menor tempo. Em médio prazo, proporcionará a efetiva redução dos recursos que chegam ao STF, com maior pacificação social nos demais tribunais, superiores ou de segunda instância.

Quando for atingido esse objetivo, espera-se que o STF assuma o relevante papel que lhe foi destacado pela Lei Maior, como seu guardião máximo, e passe a atuar cada vez mais exclusivamente como uma Corte Constitucional.

Voltando ao retrospecto do corrente ano, vejamos quais foram os principais julgamentos ocorridos no Plenário do STF (utilizando como fonte os informativos que circulam com o resumo das decisões).

Logo no início do retorno aos trabalhos, em 6 de fevereiro de 2013, foi finalizado o julgamento que reconheceu a constitucionalidade do sistema progressivo de alíquotas para o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD), sob o fundamento de que a progressividade de alíquotas do imposto: não descambaria para o confisco, na medida em que há o controle do teto das alíquotas pelo Senado Federal (na forma do art. 155, § 1º, IV, da Constituição); é compatível com a Súmula nº 668 do STF, que se refere à inconstitucionalidade de lei municipal que tenha estabelecido alíquotas progressivas para o IPTU antes da Emenda Constitucional 29/2000; e não necessitaria de emenda constitucional, diferentemente do que ocorreria com o IPTU. Foram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski (relator) e Marco Aurélio (RE 562.045, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ ac. Min. Cármen Lúcia, j. 06.02.2013, DJe 26.11.2013).

No final de fevereiro foi concluído o julgamento de caso da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, no qual foi decidido que os serviços que presta estão abrangidos pela imunidade recíproca (CF, artigo 150, VI, a, e §§ 2º e 3º). Dentre os argumentos que fundamentaram a decisão, consta que a extensão do regime de imunidade tributária se justificaria na medida em que a empresa seria longa manus da União, em exercício de atividade absolutamente necessária à integração nacional e à fruição do direito básico de se comunicar das pessoas, sob pena de desorganização do serviço no caso de tributação pelos Municípios, que a tributariam de modo distinto. Nesse caso, foram vencidos os ministros Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Cezar Peluso e Marco Aurélio (RE 601.392, Rel. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ ac. Min. Gilmar Mendes, j. 28.02.2013, DJe 05.06.2013).

Nos dias 13 e 14 de março 2013 foi concluído o julgamento de ações diretas ajuizadas pelo Conselho Federal da OAB e pela CNI contra diversos dispositivos inseridos pela chamada “Emenda do Calote” (Emenda Constitucional 62/2009) com a expressa declaração de inconstitucionalidade: a) da expressão “na data de expedição do precatório”, contida no § 2º do art. 100 da CF; b) dos §§ 9º e 10 do art. 100 da CF; c) da expressão “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança”, constante no § 12 do art. 100 da CF, do inciso II do § 1º e do § 16, ambos do art. 97 do ADCT; d) do fraseado “independentemente de sua natureza”, inserido no § 12 do art. 100 da CF, para que aos precatórios de natureza tributária se apliquem os mesmos juros de mora incidentes sobre o crédito tributário; e) por arrastamento, do art. 5º da Lei nº 11.960/09; e f) do § 15 do art. 100 da CF e de todo o art. 97 do ADCT. Na ocasião, deliberou-se apreciar questão relativa a eventual modulação de efeitos da decisão oportunamente (ADIs 4.357 e 4.425, Rel. Min. Ayres Britto, red. p/ ac. Min. Luiz Fux).

Em 24 de outubro 2013, o referido julgamento foi retomado e na ocasião o relator levantou questão de ordem na qual propôs a modulação temporal dos efeitos da decisão, nos termos do artigo 27 da Lei 9.868/1999. A forma da modulação que propôs foi com a observância das seguintes regras: 1) consideram-se válidos os pagamentos dos precatórios realizados até o trânsito em julgado das ações diretas, nas modalidades leilão e quitação por acordo, porquanto ficarão declarados nulos apenas com eficácia ex nunc, sendo certo que não poderão ser usados doravante; 2) mantêm-se os percentuais mínimos da receita corrente líquida vinculados ao pagamento de precatórios (art. 97, §§ 1º e 2º), permitindo aos entes federados dar continuidade ao pagamento de suas dívidas sem comprometer os serviços básicos de relevante interesse público; 3) até o final do exercício financeiro de 2018, os entes federados que estiverem realizando o pagamento de acordo com o regime especial aqui modulado não poderão sofrer sequestro de valores, exceto no caso de não liberação tempestiva dos recursos de que tratam o inciso II e os §§ 1º e 2º do art. 97 do ADCT ex vi do art. 97, § 13, do ADCT; 4) na forma do art. 97, § 10, do ADCT, no caso de não liberação tempestiva de tais recursos vinculados ao pagamento de precatórios, haverá: a) sequestro da quantia nas contas dos entes federados na forma do § 4º até o limite do valor não liberado; b) constituir-se-á alternativamente por ordem dos Tribunais em favor dos credores direito líquido e certo auto-aplicável, independente de regulamentação, à compensação automática com débitos líquidos lançados por esta contra aqueles; c) e, havendo saldo em favor do credor, o valor terá automaticamente poder liberatório do pagamento de tributos dos entes federados devedores até onde se compensarem; d) e o Chefe do Poder Executivo responderá na forma da Lei de Responsabilidade Fiscal e de Improbidade Administrativa. Em seguida, pediu vista o ministro Roberto Barroso (ADI 4.357-QO, ADI 4.425-QO, Rel. Min. Luiz Fux, j. 24.10.2013).

Em 21 de março de 2013 foi encerrado o julgamento referente à questão do PIS/Cofins-Importação, com a expressa declaração de inconstitucionalidade da parte que pretendeu alargar a noção de “valor aduaneiro” contida no artigo 7º, I, da Lei 10.865/2004, pelo qual a base de cálculo das referidas contribuições incidentes sobre a importação “será o valor aduaneiro, assim entendido, para os efeitos desta Lei, o valor que servir ou que serviria de base para o cálculo do imposto de importação, acrescido do valor do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e de Comunicação – ICMS incidente no desembaraço aduaneiro e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso I do art. 3º desta Lei”.

Desse modo, a parte sublinhada foi declarada inconstitucional por violação ao artigo 149, § 2º, III, a, da Constituição da República, introduzido pela Emenda Constitucional 33/2001. O texto declarado inconstitucional sucumbiu porque as contribuições sociais sobre a importação, quando tivessem alíquota ad valorem, deveriam ser calculadas com base apenas no valor aduaneiro, e não com quaisquer outros acréscimos que fossem.

Nesse caso, ao final do julgamento foi rejeitada questão de ordem suscitada pela Fazenda Nacional, para que fossem modulados os efeitos da decisão, sob o fundamento de que o tema poderia ser analisado oportunamente, em sede de embargos de declaração (RE 559.937, Rel. Min. Ellen Gracie, red. p/ ac. Min. Dias Toffoli, j. 20.03.2013, DJe 17.10.2013). Da oposição de embargos de declaração pela Fazenda Nacional os autos foram conclusos ao Gabinete do Ministro Dias Toffoli.


Em 10 de abril de 2013 finalmente foi proclamado o resultado do julgamento da ADI 2.588, ajuizada pela CNI contra o § 2º do art. 43 do CTN e o artigo 74, caput e parágrafo único, da MP 2.158-35/01. A este dispositivo foi dada interpretação conforme a Constituição, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de que não se aplicaria às empresas coligadas localizadas em países sem tributação favorecida (não “paraísos fiscais”), e que se aplicaria às empresas controladas localizadas em países de tributação favorecida ou desprovidos de controles societários e fiscais adequados (“paraísos fiscais”, assim definidos em lei), bem como se afastou a aplicação do referido parágrafo único de modo retroativo. Observou-se empate no tocante à situação de empresas coligadas em “paraísos fiscais” e controladas fora de “paraísos fiscais” (ADI 2.588, Rel. Min. Ellen Gracie, red. p/ ac. Min. Joaquim Barbosa).

Em seguida, e na esteira do resultado proclamado na ADI 2.588, foram chamados a julgamento outros dois recursos extraordinários em que se discutia a inconstitucionalidade do art. 74 da MP 2.158-35/01, que estabelece que os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados.

O primeiro (Caso Coamo) seguiu a mesma sorte da decisão contida na ADI 2.588, tendo o Tribunal negado provimento ao recurso extraordinário do contribuinte, vez que restou consignado que a empresa seria controlada e situada em “paraíso fiscal”, de modo que o dispositivo legal seria aplicável ao caso (RE 611.586, Rel. Min. Joaquim Barbosa).

O segundo (Caso Embraco) cuidava de recurso extraordinário interposto pela União e contra empresas controladas fora de “paraíso fiscal”. Nesse caso, restou decidido que os autos retornassem ao tribunal de origem para que houvesse pronunciamento acerca de eventual vedação de bitributação baseada em tratados internacionais (RE 541.090, Rel. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o ac. Min. Teori Zavascki).

Ainda naquele dia, o Plenário referendou medida acauteladora em ação cautelar ajuizada pela Vale na qual concedia eficácia suspensiva ativa a recurso extraordinário referente à sistemática de tributação dos lucros no exterior. Com a conclusão do julgamento da ADI 2.588, do RE 611.586 e do RE 541.090, restou clara a fumaça do bom direito e o perigo na demora, sobretudo levando-se em consideração que o caso tratava de empresas controladas em países não considerados “paraísos fiscais”, em que existente tratado internacional (AC 3.141, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 10.04.2013, DJe 30.09.2013).

Ainda naquele dia, o Pleno decidiu que não incide ICMS sobre o serviço de fornecimento de água encanada. Nesse caso, foi reconhecida a violação ao art. 155, II, da Constituição da República, que prevê a materialidade do ICMS. Ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski (RE 607.056, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 10.04.2013, DJe 16.05.2013).

No final de abril foi decidido pelo Pleno que a contribuição destinada ao Sebrae possui natureza de contribuição de intervenção no domínio econômico e não necessita de edição de lei complementar para ser instituída. Desse modo, foi reconhecida a sua constitucionalidade. Ficou vencido o Ministro Marco Aurélio (RE 635.682, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 25.04.2013, DJe 24.05.2013).

Em 9 de maio de 2013, foi concluído o julgamento sobre a impossibilidade de dedução do valor equivalente à CSLL de sua própria base de cálculo, bem como da base de cálculo do IRPJ, nos termos previstos no art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 9.316/96. Foi decidido que o valor devido a título de CSLL não deveria ser tratado como despesa operacional ou necessária (dedutível) para fins de apuração do IRPJ. Ficou vencido o Ministro Marco Aurélio (RE 582.525, Rel. Min. Joaquim Barbosa).

Em 22 de maio de 2013 o Pleno deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança coletivo que pretendia a declaração de ilegalidade da Portaria 1.135/2001, editada pelo Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social, sob o fundamento de que aumentou a base de cálculo da contribuição social incidente sobre as remunerações ou retribuições pagas ou creditadas a transportador autônomo pelo frete, carreto ou transporte de passageiros realizado por conta própria, prevista no art. 22, III, da Lei 8.212/1991. A alteração perpetrada pela Portaria 1.135/2001 foi afastada, por violação ao princípio da legalidade, para restabelecer os parâmetros constantes na redação original do Decreto 3.048/1991, que previa a alíquota de 11,71%. Ficaram vencidos os ministros Eros Grau e Gilmar Mendes (RMS 25.476, Rel. Min. Eros Grau, red. p/ ac. Min. Marco Aurélio).

No mesmo dia o Pleno decidiu que a cassação de registro especial para a fabricação e comercialização de cigarros, em virtude de descumprimento de obrigações tributárias por parte da empresa, é válida e não constitui sanção política. Foram vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello (RE 550.769, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 22.05.2013).

Ainda naquela tarde foi declarada a inconstitucionalidade da incidência da contribuição para o PIS e a Cofins não cumulativas sobre os valores recebidos por empresa exportadora em razão da transferência a terceiros de créditos de ICMS. Desse modo, foi reconhecido que os valores correspondentes à transferência a terceiros de créditos de ICMS não integram a base de cálculo do PIS/Cofins. Ficou vencido o Ministro Dias Toffoli (RE 606.107, Rel. Min. Rosa Weber, j. 22.05.2013, DJe 25.11.2013).

No dia seguinte foi declarada inconstitucional a incidência da contribuição para PIS e Cofins sobre a receita decorrente da variação cambial positiva obtida nas operações de exportação. No caso, concluiu-se que eventual variação da taxa de câmbio entre o fechamento e a liquidação do contrato configuraria receita decorrente de exportação, sempre que favorável ao exportador. Desse modo, as receitas cambiais relativas à exportação estariam abrangidas pela imunidade prevista no art. 149, § 2º, I, da Constituição da República (RE 627.815, Rel. Min. Rosa Weber, j. 23.05.2013, DJe 01.10.2013).

Em junho, o Plenário acolheu parcialmente embargos de declaração sobre Crédito-Prêmio do IPI para assentar a extensão da declaração de inconstitucionalidade do art. 1º do Decreto-Lei nº 1.724/79 no ponto em que conferia delegação ao ministro de Estado da Fazenda para extinguir os incentivos fiscais concedidos pelos artigos 1º e 5º do Decreto-Lei nº 491/69 (RE 208.260, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 12.06.2013, DJe 11.11.2013).

Ainda naquele mês, o Tribunal decidiu, com repercussão geral, que a contribuição para o Finsocial, incidente sobre o faturamento das empresas, não está abrangida pela imunidade constitucional sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão. O Finsocial tem a natureza jurídica de imposto (de competência residual da União). Caracterizando-se como tributo pessoal, não leva em conta a capacidade contributiva do comprador de livros, mas sim a do vendedor. Assim, a imunidade recairia sobre o livro (objeto tributado) e não sobre o livreiro ou sobre a editora. Restou vencido o Ministro Marco Aurélio, que conferia interpretação mais ampla à imunidade constitucionalmente estabelecida (RE 628.122, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 19.06.2013, DJe 30.09.2013).

Logo no início da volta aos trabalhos depois do recesso de julho, o Pleno decidiu que é inconstitucional a majoração, sem edição de lei em sentido formal, do valor venal de imóveis para efeito de cobrança do IPTU, acima dos índices oficiais de correção monetária. A correção monetária com base nos índices anuais de inflação não constitui aumento de tributo (artigo 97, § 1º, do CTN), razão pela qual não se submete à reserva legal imposta pelo art. 150, inciso I, da Lei Maior. No caso em julgamento, a majoração pretendida por decreto foi afastada (RE 648.245, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 01.08.2013).

Em setembro não encontramos qualquer julgamento de mérito relevante em matéria tributária que tenha sido veiculado nos informativos referentes às decisões do Plenário do STF.


Em 20 de setembro de 2013, o Plenário Virtual decidiu pela existência de repercussão geral da questão sobre o alcance da imunidade tributária, prevista no art. 149, § 2º, I, da Lei Maior, para incluir os exportadores que vendem no mercado externo por meio de trading companies (empresas que atuam como intermediárias na exportação). O que está em jogo na aplicação da referida imunidade é tanto o princípio da legalidade como também o da isonomia à luz da distinção entre os exportadores diretos e indiretos (RE 759.244, Rel. Min. Roberto Barroso).

Em 18 de outubro de 2013, o Plenário Virtual, por unanimidade, reputou constitucional a questão relacionada à incidência ou não do PIS e da Cofins sobre a receita decorrente da locação de bens móveis (RE 659.412, Rel. Min. Marco Aurélio).

Em 30 de outubro foi reconhecida a constitucionalidade da exigência contida no artigo 17, inciso V, da Lei Complementar nº 123/06, pela qual: “Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte (…) que possua débito com o INSS, ou com as Fazendas Públicas Federal, Estadual ou Municipal, cuja exigibilidade não esteja suspensa”.

Após lembrar o tratamento constitucional propositadamente diferenciado às microempresas e às empresas de pequeno porte, a relevância do setor na geração de emprego e renda no País, enfim, as razões que culminaram com a criação do Simples, bem como a edição da Emenda Constitucional nº 42/03, o Relator assinalou que seria regime especial de tributação de caráter opcional por parte dos contribuintes, mas de observância obrigatória pelos entes federados. Restou vencido o Ministro Marco Aurélio, que provia o recurso por reputar inconstitucional o preceito em questão, que configuraria coação política (RE 627.543, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 30.10.2013).

Em 31 de outubro, o STF reafirmou a sua jurisprudência consolidada, no sentido de garantir a imunidade tributária prevista no artigo 150, inciso VI, alínea “c”, da Constituição da República, aos imóveis pertencentes a instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos quanto ao IPTU. A repercussão geral da matéria foi reconhecida por unanimidade. No mérito, o debate girou em torno do vínculo do imóvel às atividades essenciais da entidade assistencial, vez que se encontrava vago. A Corte decidiu que a imunidade aplica-se também aos bens imóveis alugados (na forma da Súmula nº 724), bem como àqueles temporariamente vagos, “desde que atendidos os requisitos legais necessários ao enquadramento nessa categoria”, nas palavras do Relator (RE 767.332, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 31.10.2013, DJe 22.11.2013). Ficou vencido o Ministro Marco Aurélio.

Em 6 de novembro de 2013, o Tribunal decidiu que, após a Emenda Constitucional 33/2001, é constitucional a instituição do ICMS incidente sobre a importação de bens, sendo irrelevante a classificação jurídica do ramo de atividade da empresa importadora. A incidência do tributo depende da observância das regras de anterioridade e irretroatividade e a validade da constituição do crédito tributário depende da existência de lei complementar sobre normas gerais e de legislação local de instituição do ICMS. Não se poderia falar em constitucionalidade superveniente para legitimar legislação local anterior à referida emenda constitucional ou à Lei Complementar nº 114/02, com o único objetivo de validar crédito tributário constituído em momento no qual não haveria permissão constitucional, inclusive lembrando da orientação firmada pelo STF sobre o tema nos RREE 346.084 e 390.849. Desse modo, o Pleno negou provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e deu provimento ao recurso interposto pelo contribuinte (RREE 439.796 e 474.267, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 06.11.2013).

Em 20 de novembro, o Pleno concluiu o julgamento dos RREE 208.526 e 256.304, que cuidavam do expurgo inflacionário conhecido como “Plano Verão” em leading case patrocinado pelo nosso escritório, quando, de modo artificial, o Governo divulgou taxa de correção monetária das demonstrações financeiras em patamar flagrantemente inferior ao que tinha sido observado pelos órgãos oficiais de aferição da referida taxa mensal.

Desse modo, com oito votos convergentes, restou declarada a inconstitucionalidade do § 1º do art. 30 da Lei nº 7.730/89 e do art. 30 da Lei nº 7.799/89,[1] vencidos os Ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes (RREE 208.526 e 256.304, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 20.11.2013).

Concluído o julgamento dos RREE 208.526 e 256.304, que se iniciara em 1º de fevereiro de 2001, foram chamados os demais casos sobre o tema (RREE 215.142 e 221.142, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 20.11.2013). Depois de lido o relatório, tanto o patrono das empresas contribuintes recorrentes como também a representante da Fazenda Nacional, de comum acordo, abriram mão do tempo de sustentação oral, vez que o tema replicava aquele cuja conclusão ocorrera momentos antes no Plenário. Tal gesto foi bem recebido pela Corte e recebeu congratulação expressa dos Ministros Ricardo Lewandowski e Roberto Barroso. Em seguida, o voto do Relator, Ministro Marco Aurélio, foi acompanhado de modo unânime.

Ao final, por proposta do ministro Gilmar Mendes, foram aplicados aos casos os efeitos do instituto da repercussão geral, vez que é Relator do RE 242.689 e que versa sobre o mesmo tema, com o encerramento dinâmico e imediato dos casos pendentes no Poder Judiciário.

No próprio dia 20 de novembro de 2013, o Pleno também concluiu o julgamento que, por maioria, reputou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade de lei do estado de Santa Catarina, que dispõe sobre o cálculo do valor adicionado, para fins de partilha do produto arrecadado com a incidência do ICMS, relativo à energia elétrica, sob o fundamento de ofensa aos artigos 161, inciso I, 158, parágrafo único, inciso I, ambos da Constituição da República. Restou vencido o ministro Marco Aurélio, que julgava improcedente o pedido, por entender que o Estado-membro poderia tratar da matéria por lei local, vez que não havia reserva à lei complementar (ADI 3.726, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 20.11.2013).

Ainda no mesmo dia, o Tribunal retomou julgamento de recurso em que se discute a constitucionalidade da incidência do ICMS na importação de bem móvel realizada mediante operação de arrendamento mercantil (leasing). O presidente, ministro Joaquim Barbosa, em voto-vista, em tese, considerou possível a referida incidência. Todavia, registrou que um dos obstáculos a ser enfrentado seria a lesão da capacidade contributiva (art. 145, § 1º, da Lei Maior) pela ausência de normas gerais adequadas a mensurar o aspecto econômico da operação, vez que a pretensa tributação não poderia absorver integralmente a utilidade econômica do fato tributado a ponto de torna-lo inviável. Além disso, vários outros pontos foram suscitados no voto do Presidente, como a citação de precedente em que a Corte fixou entendimento pelo qual o arrendamento mercantil não se confunde com a locação ou com simples compra e venda, a distinção de tratamento no tocante ao ISS e ao ICMS, a competência da União para criar tributos de fins extrafiscais regulatórios e a necessidade de observar o ambiente competitivo de mercado, dentre outros. Em seguida, pediu vista o Ministro Teori Zavascki (RE 226.899, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 20.11.2013).

Na sequência, ainda no mesmo dia, o Pleno retomou o julgamento de recurso sobre tema afim: a incidência do ICMS no leasing internacional. Nesse caso, a ministra Cármen Lúcia proferiu voto-vista que acompanhou a divergência, no qual aduziu que os fatos narrados no processo teriam ocorrido antes das alterações perpetradas pela Emenda Constitucional 33/2001, cabendo aplicar o direito à espécie, pouco importando o reconhecimento prévio da repercussão geral. Além disso, propôs interpretação sistemática dos dispositivos constitucionais envolvidos. Consignou, ademais, que não haveria circulação econômica quando não houvesse aquisição de mercadoria, mas mera posse decorrente do arrendamento, cabendo à Fazenda Pública examinar o contrato de arrendamento para verificar a incidência ou não de ICMS. Em seguida, pediu vista o Ministro Teori Zavascki (RE 540.829, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 20.11.2013).

Em 27 e 28 de novembro de 2013, o Pleno iniciou o julgamento conjunto de casos que discutem o direito a diferenças de correção monetária de depósitos em cadernetas de poupança em razão de expurgos inflacionários decorrentes de diversos planos econômicos (Cruzado, Bresser, Verão, Collor I e Collor II). De início, o Tribunal deliberou, por maioria, começar o julgamento com a leitura dos relatórios e as sustentações orais para, logo depois, suspendê-lo para prosseguimento em data a ser agendada no início do ano judiciário de 2014, com sessões contínuas. Em seguida, o julgamento foi suspenso (ADPF 165, Rel. Min. Ricardo Lewandowski; RREE 591.797 e 626.307, Rel. Min. Dias Toffoli).

Desse apanhado selecionado de decisões, verifica-se que a Corte, sob a presidência do Ministro Joaquim Barbosa, tem se preocupado realmente com o potencial multiplicador das demandas tributárias ajuizadas perante o Poder Judiciário. Nesse sentido, vem desenvolvendo intenso trabalho para julgar matérias submetidas ao regime da repercussão geral e racionalizar a conclusão dos julgamentos pendentes (com pedidos de vista).

Sob a presidência do ministro Joaquim Barbosa, começou intenso trabalho de julgar matérias submetidas ao regime da repercussão geral e concluir os julgamentos pendentes (com pedidos de vista).

Além disso, cabe registrar que se verifica maior concentração de julgamentos em dias específicos nos quais predomina a pauta dos casos em matéria tributária. Verifica-se maior produtividade no julgamento de tais casos, com a definição de relevantes precedentes e a conclusão de leading cases importantes para a pacificação social na relação entre o Fisco e os contribuintes.

Levando em conta declarações recentes, quando do encerramento do ano judiciário, o presidente continuará no mesmo caminho, priorizando a conclusão de julgamentos que tramitam há muitos anos (em razão dos pedidos de vista) e deixando fluir os casos de repercussão geral reconhecida.

Nesse sentido, cabe mencionar possíveis casos que serão levados a julgamento no próximo ano, com o retorno dos trabalhos a partir de fevereiro. São eles:

a) a Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC nº 18, que versa sobre a inconstitucionalidade da espúria inclusão da parcela do ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins, matéria que chegou no Plenário do STF há mais de uma década e em agosto de 2006 contabilizou seis votos favoráveis aos contribuintes e um contrário (nos autos do RE nº 240.785, que posteriormente foi preterido em razão do ajuizamento da referida ação declaratória);

b) a conclusão do julgamento referente à modulação temporal dos efeitos da decisão que declarou a inconstitucionalidade de boa parte da chamada “Emenda do Calote” a partir da proposta do Ministro Luiz Fux (ADIs 4.357 e 4.425);

c) o julgamento da legitimidade da instituição do PIS/Cofins-Importação, cuja repercussão geral já foi reconhecida no RE nº 565.886 (Rel. Min. Marco Aurélio);

d) a publicação do acórdão dos RREE nº 256.304 e nº 208.526, que declarou a inconstitucionalidade do art. 30, § 1º, da Lei nº 7.730/89, e do art. 30 da Lei nº 7.799/89 (Plano Verão);

e) a continuação do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF nº 165, ajuizada em 2009 pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro – Consif e que versa sobre os expurgos inflacionários veiculados pelos sucessivos planos econômicos na era inflacionária, como os Planos Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2; e

f) a publicação do acórdão referente à ADI 2.588, que deu interpretação conforme à Constituição ao art. 74 da MP 2.158-35/01, conforme decisão relatada anteriormente. Nesse caso, possivelmente a CNI oporá embargos de declaração para esclarecer pontos que restaram omissos durante o julgamento. O tema é tão relevante e estratégico tanto para o Governo Federal como também para o empresariado que, recentemente, foi objeto de programa de parcelamento específico e generoso, com o objetivo de incrementar a receita tributária.

Verifica-se, portanto, que o próximo ano reserva à Suprema Corte árduo trabalho no sentido de iniciar, retomar e/ou concluir relevantes casos em matéria tributária que certamente terão aplicação em centenas de milhares de processos que tramitam pela vacilante jurisprudência das instâncias inferiores do Poder Judiciário. Isso, nesse momento de especial efervescência da sociedade civil organizada, seria capaz de trazer um pouco de estabilidade e segurança jurídica, elementos indispensáveis ao bom funcionamento do sistema constitucional tributário e da pacificação entre o Fisco e os contribuintes.


[1] Eis o teor dos referidos dispositivos para melhor compreensão: “Art. 30. No período-base de 1989, a pessoa jurídica deverá efetuar a correção monetária das demonstrações financeiras de modo a refletir os efeitos da desvalorização da moeda observada anteriormente à vigência desta Lei. § 1º. Na correção monetária de que trata este artigo a pessoa jurídica deverá utilizar a OTN de NCz$ 6,92 (seis cruzados novos e noventa e dois centavos)” (Lei nº 7.730/89); “Art. 30. Para efeito de conversão em número de BTN, os saldos das contas sujeitas à correção monetária, existentes em 31 de janeiro de 1989, serão atualizados monetariamente, tomando-se por bases o valor da OTN de NCz$ 6,92” (Lei 7.799/89).

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