Requisitos objetivos

Não é necessário parecer do Conselho para indulto

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19 de fevereiro de 2014, 12h04

Com a inovação trazida no parágrafo 5º do artigo 11 do Decreto de 8.172/13 – no qual a presidente da República deixou de prever a necessidade de emissão de parecer do Conselho Penitenciário para a declaração do direito ao indulto e à comutação de penas – muita discussão surgiu.

Recentemente, esse a ConJur publicou artigo de Rodrigo de Oliveira Ribeiro, no qual o advogado sustenta a inconstitucionalidade da previsão de dispensa de parecer.

Do artigo, vale transcrever o seguinte trecho:

“A sugestão, consubstanciada na previsão do artigo 11, parágrafo 5°, incorre em grave equívoco. Viola a competência do legislador ordinário (artigo 22, I, da CF), ao invadir matéria já regulada em lei federal à guisa de exercer sua prerrogativa prevista no artigo 84, XII, da CF.

Frise-se que a Constituição limita expressamente os poderes do chefe do Executivo, vedando em seu artigo 62 que adote medidas provisórias relativas a direito processual penal. Logo, à guisa de conceder indultos e comutar penas, não pode modificar normas processuais penais através de decreto.

O Código de Processo Penal, em seu Título IV, ao regular a matéria relativa a graça, indulto e anistia, em seus artigos 734 a 742, menciona a participação do Conselho Penitenciário nos artigos 734, 735, 736, 737, 741 e 742. É porque é o órgão da execução penal especializado nesta matéria (artigo 70, I, LEP).” [1]

Mencionada inconstitucionalidade não se verifica. Vejamos.

Considerando-se que somente o Presidente da República pode conceder indulto e comutação (artigo 84, inciso XII da Constituição Federal), é de atribuição exclusiva da Presidência o estabelecimento das condições para a declaração do direito.

O artigo 70, I da Lei de Execução Penal — que traz como atribuição do Conselho Penitenciário a de elaborar parecer sobre indulto e comutação de penas e é norma infraconstitucional — deve ser interpretado à luz do que dispõe o artigo 84, inciso XII da Constituição Federal de 1988, cujo teor transcrevemos:

“Compete privativamente ao Presidente da República:

(…)

XII – conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei” (destacamos).

A interpretação do artigo 70, I da Lei de Execução Penal conforme a Constituição deixa claro que, sendo a competência para conceder indulto e comutação exclusiva do Presidente da República, é o chefe do Poder Executivo quem deve dizer se a audiência dos órgãos instituídos em lei é ou não necessária.

Assim, o Conselho Penitenciário tem atribuição para emitir parecer sobre indulto e comutação de penas, mas essa atribuição somente será exercida se o presidente da República entender necessária a confecção de parecer.

Ademais, o conflito entre o previsto no artigo 11, parágrafo 5º do Decreto 8.172/13 e o disposto no artigo 70, I da Lei de Execução Penal é apenas aparente, na medida em que a norma do artigo 70, I diz respeito apenas ao indulto individual — única espécie de indulto cujo procedimento é regulamentado pela Lei de Execução Penal (artigos 188 a 192 da Lei de Execução Penal[2]) — benefício para cuja concessão é necessária a análise das circunstâncias pessoais de quem requer o indulto.

Ora, se há requisitos subjetivos a serem verificados, se há circunstâncias pessoais do solicitante que devem ser avaliadas, é até justificável que o pedido de indulto individual passe pela análise do Conselho Penitenciário — órgão composto por psiquiatras, assistentes sociais, psicólogos e profissionais do direito. Mas se os requisitos para a concessão do indulto e da comutação são puramente objetivos – como os trazidos no Decreto 8.172/13 — não há sentido nenhum em exigir que profissionais de outras áreas do conhecimento opinem sobre o caso.

Especificamente sobre a dispensabilidade do parecer em caso de indulto coletivo, confira-se:

“HABEAS CORPUS – DEPOIMENTO FALSO – INDULTO COLETIVO – POSSIBILIDADE

DE CONCESSÃO SEM OITIVA DO CONSELHO PENITENCIÁRIO – DESCONHECIMENTO DE MATÉRIA NÃO ABORDADA NO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL ESTADUAL – ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E NESTA EXTENSÃO CONCEDIDA.

1- Não se conhece de matéria não examinada no acórdão do Tribunal a quo, porquanto implicaria em supressão de instância.

2- É dispensável o parecer do Conselho Penitenciário quando se tratar de indulto coletivo.

3- Ordem parcialmente conhecida e, nesta extensão, concedida” (STJ, 5ª Turma, habeas corpus nº 65308/SP (2006/0187678-1), Relatora Ministra Jane Silva, julgado em 25/09/2007, DJ 15/10/2007 p. 309 – grifamos).

Vale registrar, por fim, que o entendimento segundo o qual é dispensável o parecer do Conselho Penitenciário no caso do indulto e da comutação coletivos já vem sendo adotado pelo Superior Tribunal de Justiça há muito tempo[3].

Isso porque, embora fosse tradição nos Decretos anteriores que se determinasse a colheita de parecer do Conselho Penitenciário antes da decisão acerca do cabimento do indulto e da comutação, desde que os requisitos para o deferimento tornaram-se puramente objetivos, referida exigência deixou de ter qualquer sentido (e acabou por ser suprimida no Decreto 8.172/13 justamente por carecer de sentido).

Assim, entendemos não ser exigível o parecer do Conselho Penitenciário antes da declaração do direito ao indulto coletivo ou à comutação previstos no Decreto 8.172/13.


[1] RIBEIRO, Rodrigo de Oliveira, Falta de parecer do Conselho Penitenciário é inconstitucional, Revista Consultor Jurídico, 5 de janeiro de 2014, artigo disponível no endereço eletrônico: http://www.conjur.com.br/2014-jan-05/rodrigo-ribeiro-dispensa-parecer-conselho-penitenciario-inconstitucional

[2] Os artigos 188 a 192 da Lei de Execução Penal repetem o teor dos artigos 734 a 738 do Código de Processo Penal – mencionados pelo autor do artigo referido como justificativa para seu posicionamento – e tratam da participação do Conselho Penitenciário no procedimento para a concessão de graça (total ou parcial), e não para a declaração do direito ao indulto coletivo, trazido anualmente nos Decretos presidenciais.

Nem a Lei de Execução Penal, nem o Código de Processo Penal disciplinam o procedimento para o indulto coletivo e tampouco trazem a exigência de que o Conselho Penitenciário se manifeste previamente em casos de indulto coletivo e comutação de penas. A única menção que tais leis fazem ao Conselho Penitenciário ao tratar do indulto coletivo diz respeito à possibilidade de o órgão requerer a extinção da pena após a concessão do indulto (artigo 193 da LEP e artigo 741 do CPC).

[3] A esse respeito, importante a leitura do voto do Ministro Felix Fischer, proferido no Recurso Especial nº 819.744/SP (2006/0018496-0) e acolhido por unanimidade pela 5ª Turma daquele Tribunal (julgado em 03/04/2007, DJ 04/06/2007 p. 418).

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