Sandálias Melissa

Sem perícia em produto, não há como provar concorrência desleal, julga TJ-RS

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31 de dezembro de 2014, 13h01

Na Justiça, o ônus da prova incumbe ao autor da ação. Se não provar os fatos constitutivos do seu direito, como exige o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, a ação deve ser julgada improcedente. Por isso, a maioria dos integrantes da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não aceitou apelação de um dos maiores grupos calçadistas do país, que não conseguiu provar que foi alvo de concorrência desleal. Segundo a empresa, um concorrente estava copiando o sapato que é seu carro-chefe de vendas.

O relator do recurso, desembargador Sylvio da Silva Tavares, se alinhou totalmente às razões do juízo de origem, que indeferiu a inicial por não vislumbrar nenhuma prova por parte da empresa autora —  e especialmente a pericial. E nem se sensibilizou com as razões que levaram à concessão da liminar, que determinou a apreensão de calçados e matrizes usados na sua confecção por parte do concorrente.

O desembargador Ney Wiedeman Neto ficou vencido no colegiado, mas fundamentou sua posição. ‘‘A liminar foi concedida com base no exame físico dos calçados depositados em cartório, o que não necessitou de perícia para perceber que se tratava de cópia. O TJ-RS, no julgamento do AI 7.003.787.298, chegou a mesma conclusão. O parecer de fls. 284-285 confirma a contrafação, bem como as fotos anexadas. Tais condutas caracterizam concorrência desleal’’, escreveu, convicto, no voto.

Como a decisão se deu por maioria, cabem Embargos Infringentes. O acórdão de apelação foi lavrado na sessão de julgamento realizada no dia 10 de dezembro.

O caso
Criadora e dona das famosas sandálias Melissa, tradicional no mercado brasileiro, a Grendene foi à Justiça para barrar a venda de sandálias ''La Fera'', que apresenta  as mesmas características de sua linha, fabricadas por N. A. Indústria e Comércio de Calçados e comercializadas por Comércio de Confecções Speguem (Talismã). No curso do processo, esta última fez um acordo e ficou fora do polo passivo da ação.

A primeira, no entanto, apresentou contestação. Argumentou que a Grendene não tem registro do seu desenho industrial no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Alegou, também, que o desenho da Melissa tem mais de 20 anos de mercado, caindo em domínio público. Por fim, sustentou que seu produto é diferente do fabricado pela Grendene.

No ajuizamento da ação, a 2ª Vara da Comarca de Farroupilha deferiu a antecipação de tutela, pois a julgadora da época ficou convencida de que a sandália apresentada nos autos era cópia e imitação do design da original. Assim, em dezembro de 2001, deferiu liminar para apreender, na linha de produção da N. A., pares de sandálias e as matrizes utilizadas para sua confecção, posteriormente devolvidas.

Em função dos prejuízos experimentados, a concorrente ajuizou reconvenção — pretensão contra o autor da ação original. Alegou que a concessão da liminar lhe causou vários prejuízos: teve de suspender as entregas, não pôde pagar compromissos financeiros, colocou funcionários em férias etc. Além dos danos materiais, pediu a condenação da Grendene em danos morais, no valor de R$ 50 mil para cada dia em que a liminar vigorou.

Sentença improcedente
Em 12 de agosto de 2008, analisando o mérito da lide, o juiz Mario Romano Maggioni julgou improcedente a ação principal, bem como os pedidos da reconvenção. Entendeu que as partes litigantes, simplesmente, não demonstraram os fatos constitutivos do seu direito.

O juiz observou que a parte reconvinte apenas alegou prejuízos, sem comprová-los. ‘‘Não basta alegar os fatos, necessário demonstrá-los. Por ocasião da perícia contábil, a reconvinte sequer juntou as notas fiscais que poderiam, de alguma forma, albergar a sua pretensão. Bem como quedou-se inerte apesar de ser intimada para a juntada das notas fiscais’’, escreveu na sentença.

Quanto à ação principal, a percepção do julgador foi a mesma. A Grendene não produziu prova testemunhal ou pericial que comprovasse o fabrico de calçados com as mesmas características do modelo da Melissa. E mais: as provas documentais e periciais juntadas aos autos dizem respeito a outros processos. Em decorrência, não podem ser utilizadas no presente caso.

‘‘Acresço que o pedido inicial se funda na concorrência desleal, que não tem como pressuposto o registro da marca industrial, mas sim a fabricação de produto idêntico. Assim, sem razão a demandada ao pretender que a ausência de registro do produto conduz à improcedência da ação, pois não é esta a alegação inicial. No presente caso, a improcedência se funda na ausência de provas quanto à fabricação de produto idêntico — fato este que não foi demonstrado pela autora’’, arrematou.

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