Gestão criticada

USP encerra 2014 dividida, acuada e sem esperança

Autor

  • João Grandino Rodas

    é sócio do Grandino Rodas Advogados ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP) professor titular da Faculdade de Direito da USP mestre em Direito pela Harvard Law School e presidente do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (Cedes).

29 de dezembro de 2014, 10h26

[* Artigo originalmente publicado na coluna Tendências e Debates, da Folha de S.Paulo, na edição de 29/12/2014]

A nova gestão da Reitoria da USP completa seu primeiro ano. Foram 24 dias de transição e o restante, de mandato. Nesse período, o que ocorreu na universidade mais conceituada do país?

Figurativamente, o transatlântico que é a universidade foi bruscamente parado por seus gestores centrais, sob a alegação de estar falida. Acusaram a gestão anterior de ter levado a universidade à bancarrota, pela imprensa e durante visitas a autoridades, antes da conclusão de verificações. Caçaram bruxas e buscaram o bode expiatório.

Embora partícipes da anterior gestão — com mandato —, alegavam, candidamente, nada saber, em uma demonstração flagrante de incúria ou de falta de ética. Procederam ao desmonte da universidade, anunciando vendas e cessões. Intolerância perdulária foi gastar dinheiro para desfazer as salas de recepção da Reitoria, empacotando e armazenando quadros, móveis e obras de arte doadas à universidade!

Uma das tônicas foi dividir a universidade. Após tratar como inimigos os que não militaram com eles na campanha, demonizando-os, passaram a minimizar o funcionalismo técnico-administrativo (que não apoiou o atual reitor na prévia), dizendo que o plano de carreira adotado na gestão anterior havia sido uma maneira de apaziguar o sindicato e acabar com greves.

Isso apesar de os dirigentes saberem se tratar de um direito e eles próprios terem votado a favor no Conselho Universitário.

Sabem eles, ademais, que o fato de alguns funcionários ganharem mais do que alguns professores se deve à conjuntura de os professores da USP receberem menos que seus congêneres das federais — mais cedo ou mais tarde, o Cruesp (Conselho dos Reitores das Universidades Estaduais Paulistas) fará essa necessária correção.

Negaram-se a corrigir pela inflação os salários na data base (período anual de renegociação do contrato de trabalho) como ocorreu com os demais trabalhadores brasileiros. Na universidade, em que a tônica deve ser a diversidade, bem como o respeito a ela, o lema passou a ser quem não está comigo está contra mim e deve ser destruído.

O resultado disso vem sendo dolorosamente colhido pela USP, que está dividida, acuada e desesperançada! Enfrentou histórica greve de quatro meses, a maior de seus 80 anos, patrocinada por todos os segmentos: alunos, funcionários e professores. Viu a Justiça do Trabalho obrigá-la a pagar a correção salarial, inclusive no tempo da paralisação. Perdeu o lugar de primeira universidade latino-americana para a Universidade Católica do Chile.

E, para coroar, houve diminuição substancial do número de inscritos na Fuvest, revertendo a tendência de subida dos anos anteriores. Enquanto isso, nesse ano, a Unicamp e a Unesp tiveram aumento nos inscritos em seus vestibulares.

O intuito dessas minhas palavras não é corrigir mentiras ou completar meias verdades. Até porque já é do conhecimento público que a falência da USP nunca existiu, pois havia reservas orçamentárias no valor de cerca de R$ 3 bilhões e meio, dos quais R$ 1, 5 bilhão totalmente descompromissado.

Sindicância realizada comprovou que tais reservas eram muito superiores aos encargos presentes e futuros a pagar (sobrando até para pagar, os salários corrigidos durante a greve, além dos quatrocentos milhões de reais do famigerado e inútil plano de demissão voluntária). Comprovou também que o atual reitor, terminada a eleição, desclassificou a "falência" para "crise econômica" e afirmou ter sido ela resolvida (embora sem novos aportes recebidos pela USP).

Exorto que a USP tome medidas administrativas necessárias para enfrentar a recessão econômica, presente e comum a todas as instituições públicas e privadas do Brasil, de forma lógica e coerente.

Da mesma forma como vêm fazendo a Unicamp e a Unesp, que possuem problemas similares inclusive no tocante ao Tribunal de Contas do Estado, sem apelar para inexistente "herança maldita" e clamor excessivo, que pôs abaixo a credibilidade da universidade.

Em suma, os paulistas, que financiam a Universidade, esperam que a atual gestão comece a pôr em prática o slogan de sua campanha: "Todos pela USP". Assim, nossa Universidade poderá sair da deriva e almejar um feliz 2015.

Autores

  • é decano dos professores titulares da Faculdade de Direito da USP, juiz do Tribunal Administrativo do Sistema Econômico Latino-Americano e do Caribe (SELA) e sócio do escritório Grandino Rodas Advogados.

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