Ironman lawyer

Advogado cego se torna ministro do Tribunal Superior de Michigan

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29 de dezembro de 2014, 13h22

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No dia 1º de janeiro de 2015, tomará posse no cargo de ministro do Tribunal Superior de Michigan o advogado Richard Bernstein (foto), 41, que nasceu cego. Ele cursou advocacia, teve uma bem-sucedida carreira e, em novembro, venceu a eleição para o tribunal superior, depois de uma campanha que lhe custou 1,8 milhão de dólares e que se sustentou no slogan “A Justiça é Cega”.

Desde que venceu as eleições com 1,29 milhão de votos (29% dos votos), ele recebeu da corte dez casos para estudar, o que ele faz de uma maneira extraordinária: memoriza todos os pontos importantes de cada petição, que é lida a ele por um auxiliar, de acordo com o jornal San Jose Mercury News.

“Seria muito mais fácil para mim se eu pudesse ler como todo mundo, mas não foi assim que fui criado”, ele disse aos jornais. “Não há dúvidas de que isso requer muito mais trabalho, mas há uma compensação: isso obriga você a operar no mais alto nível de preparação. E isso é o que tenho feito toda minha vida, desde meu primeiro ano na escola”, afirmou.

Existem dois juízes cegos nos EUA. Em Missouri, o ministro Richard Teitelman se tornou legalmente cego aos 13 anos de idade. E o juiz David Tatel, que também nasceu cego, é ministro em um tribunal de recursos de Washington, D.C.

O presidente do Tribunal Superior de Michigan, ministro Robert Young Jr., disse que o novo colega é aguardado com ansiedade na mais alta corte do estado. “Todo novo ministro passa por uma transição da vida que teve anteriormente para o novo cargo. Ele será diferente, mas é extraordinariamente bem-sucedido e muito determinado. Você não entra em uma competição de Ironman sem ter uma espinha dorsal de aço”, declarou.

O presidente da corte se refere à participação de Bernstein, em 2008, na competição de “Ironman Triathlon”, com 3,9 km de natação, 180 km de ciclismo e 42,195 km de corrida. Ao todo, o advogado cego participou de 18 maratonas em Nova York, Detroit (sua cidade), Miami, Los Angeles e Jerusalém, quase sempre orientado por alunos-atletas de faculdades de Direito. Antes de participar da 18ª, ele foi atropelado por um ciclista no Central Park de Nova York, ficou gravemente ferido e passou algumas semanas em um hospital.

Luta desde o início
A primeira batalha do advogado foi com o Conselho de Admissões em Faculdades de Direito, que lhe negou inscrição no Teste de Admissão em Faculdade de Direito, o que ele qualificou como “preconceito visual”. Alegou que o teste discriminava contra cegos por sua “exigência de interpretar material visual”. Quatro grandes universidades concordaram com ele. Enfim, ele se matriculou na Universidade Northwestern.

Em seus estudos, Bernstein desenvolveu uma memória considerada extraordinária, porque tinha de decorar tudo, incluindo documentos de até cinco páginas que seriam discutidos nas provas. Ele estudava 13 horas por dia, sete dias por semana. Formado, foi trabalhar no escritório de advocacia da família, que se especializa em indenizações por danos físicos.

Iniciou a profissão fazendo muito trabalho pro bono em defesa dos direitos de deficientes físicos. Entre outras, ele ganhou uma ação contra a cidade de Detroit, outra contra a Universidade de Michigan e mais uma contra o Condado de Oakland, em Michigan, todas por discriminação contra deficientes físicos e por violação da Lei da Deficiência.

“Ninguém nessa corte entende mais sobre direitos de deficientes físicos e mentais do que o professor Bernstein, disse a ministra Bridget McCormack, que foi professora de Direito, assim como Bernstein, antes de ser eleita para o tribunal superior, em 2012.

Em novembro de 2002, aos 28 anos, Bernstein foi eleito para o Conselho de Governadores da Universidade Estadual Wayne. Em 2009, se tornou presidente do conselho. Nesse ano, o colegiado passou uma resolução contra a adoção pelas universidades do dispositivo de leitura Kindle, da Amazon. Com base nessa resolução, duas grandes entidades que representam cegos moveram uma ação bem-sucedida contra a Universidade do Arizona, que já estava pronta para adotar o Kindle. Finalmente, chegou-se a um acordo com a Amazon: o aparelho (chamado de e-reader) só será adotado quando tiver uma versão amigável a cegos.

A primeira sessão da corte com a participação do novo ministro será dia 13 de janeiro, em um caso em que o uso de maconha para fins medicinais será discutido. Ele já está preparado para esse debate e também para o próximo, em que será discutida uma disputa trabalhista que envolve milhares de funcionários do estado.

“Eu faço isso absorvendo o caso palavra por palavra, registrando todas as informações em minha memória”, explicou. “Peço a meu auxiliar para dar destaque a certos pontos, ler notas de rodapé e os registros legislativos.” Na corte, Bernstein provavelmente empregará a maior parte do seu tempo discutindo com seus colegas se o tribunal deve ou não aceitar os mais de 2 mil casos que recebe por ano.

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