Herança da ditadura

Para pesquisador, desvincular IML da polícia deixa perícia mais eficiente

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26 de dezembro de 2014, 13h37

Desvincular os institutos médico-legais (IMLs) das polícias e das Secretarias de Segurança Pública (SSPs) aumenta a eficiência das perícias criminais. Essa é a conclusão da dissertação de mestrado de Daniel de Menezes Pereira, Aspectos históricos e atuais da perícia médico legal e suas possibilidades de evolução, defendida no ano passado na Faculdade de Direito da USP.

“A desvinculação [dos IMLs das polícias e secretarias] poderia representar uma fase de grande evolução da perícia no Brasil, além de afastar um sentimento de suspeição que ainda impera em parte da população. Tal desvinculação, inclusive, já era parte do Primeiro Programa Nacional de Direitos Humanos, criado em 1996”, argumenta Pereira.

No seu trabalho, o pesquisador afirma que essa estrutura também faz com que os IMLs concorram com a polícia por recursos. Nessa disputa, aponta, os dois lados saem perdendo: os institutos deixam de investir em equipamentos e treinamento de seu pessoal, e as polícias diminuem seu efetivo em locais que exigem mais agentes.

A subordinação dos IMLs às estruturas de segurança é uma herança do regime militar, que vigorou no Brasil de 1964 a 1985. Pereira diz que controlar essas entidades nesse período era fundamental para encobertar as torturas e assassinatos cometidos pelo aparato estatal de repressão contra “subversivos”.

“Nessa fase obscura, a medicina legal esteve sob rígido controle, principalmente nas áreas de antropologia forense e identificação humana, pois, recorrentemente, não era de interesse do regime ditatorial que ocorresse a determinação da causa mortis bem como a identidade de alguns procurados (ou, em melhor acepção, desaparecidos) políticos. Por conta disso, o ensino, a pesquisa e o investimento na área foram afetados durante anos, o que tem reflexo até os dias atuais”, explica o pesquisador.

Outra sugestão para melhorar o estado da perícia médico-legal no país é a adoção de um “teste de controle de confiabilidade da prova científica para sua admissibilidade”. Esse procedimento estabelece regras para aumentar o nível de certeza dos laudos produzidos pelos peritos e inibir a utilização de “ciências de lixo”.

Pereira ainda recomenda instituir a possibilidade de as partes de um processo nomearem um expert para acompanhar os trabalhos. Outra alternativa é a perícia ser feita por profissionais não vinculados ao Estados em casos de alta complexidade quando os servidores não tiverem capacidade técnica para lidar a questão. No entanto, ele ressalva que essas alterações dependem de reformas no Código Penal e no Código de Processo Penal.

Comissão da Verdade
Em seu relatório final, apresentado em 10 de dezembro, a Comissão Nacional da Verdade recomendou a desvinculação dos institutos médicos legais e dos órgãos de perícia criminal das secretarias de segurança pública e das polícias civis.

De acordo com o documento, perícias feitas com independência perante esses órgãos e a criação de centros estaduais avançados de antropologia forense iriam “conferir maior qualidade na produção de provas técnicas, inclusive no diagnóstico de tortura”.

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