Abusos no julgamento

O impedimento do juiz no novo Código de Processo Civil

Autor

  • Randolfe Rodrigues

    é senador pela Rede (Amapá) bacharel em História e em Direito mestre em Políticas Públicas (UECE) e Professor de Processo Constitucional do Centro de Ensino Superior do Amapá (CEAP)

20 de dezembro de 2014, 5h01

Aprovado no Plenário do Senado Federal na última quinta-feira (17/12) o substitutivo da Câmara dos Deputados ao novo Código de Processo Civil (SCD 166/2010) representa um avanço no direito processual civil brasileiro. O novo CPC concatena o trâmite das ações no judiciário aos ditames da Constituição Federal de 1988, que sequer existia quando da promulgação do atual CPC, de 1973.

Uma importante mudança se deu na redação do Artigo 144 do novo Código, que trata das condições de impedimento do magistrado. Além das hipóteses já consagradas, presentes no Artigo 134 do atual codex, foi incluída nova possibilidade de impedimento quando da representação de alguma das partes por escritório de advocacia de parente do juiz, até terceiro grau.

Inscrita no inciso VIII do projeto que segue à sanção presidencial, a nova regra prevê uma maior rigidez a casos infelizmente frequentes de relação, digamos, promíscua entre alguns magistrados e escritórios de advocacia.

Embora minoritários em suas respectivas categorias, esses maus profissionais atentam contra a justiça e contra a ordem pública ao praticarem tráfico de influência e patrocínio de interesses privados em ações de terceiros. Ao tratar dos casos de parentesco, sem dúvidas abre-se a possibilidade de impedir a atuação profissional de parente que teria atuação profissional proba e correta. No entanto, assim como ocorre com o impedimento ao nepotismo no serviço público, é necessário estabelecer um justo critério, observado por todos, para se garantir isonomia.

Nesse diapasão, o texto oriundo da Câmara, em substituição ao PLS 166/2010, chegou ao Senado com uma redação rígida na medida certa, no nosso entender. Assim dispunha:

“Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo: (…) VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;”

A parte final do texto foi, porém, suprimida no relatório final do senador Vital do Rêgo (PMDB-PA), apresentado em plenário. A intenção do relator era evitar possíveis excessos com o termo “mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório”.

Tivemos oportunidade, então, de oferecer um destaque de manutenção do texto da Câmara, para que a parte final não fosse suprimida.

Argumentamos que o simples impedimento de atuação de escritório de advocacia na causa de juiz parente de sócio ou associado do escritório não bastava, era necessário impedir, ainda, a contratação “terceirizada”, “transversa” dessa mesma sociedade.

Ao proibir somente a atuação naquele processo, o novo CPC permitiria que determinado cliente contratasse, seja para atuação em outro caso, seja para uma assessoria extrajudicial, um escritório advocatício de parente de um magistrado que atue em sua causa, sem que houvesse meios para arguir o impedimento desse juiz.

Em plenário do Senado Federal, no dia 17 de dezembro de 2014, pude apresentar as razões de nosso destaque e tive a felicidade de ser atendido pelo relator, senador Vital do Rêgo, que mesmo com parecer contrário, opinou ao final da discussão pela aprovação de nosso destaque. Ocorreu, assim, uma vitória do debate democrático, do convencimento por argumentação, algo raro nos dias de hoje.

Essa nova hipótese de impedimento, consagrada no texto final do projeto, dará mais meios para se evitar abuso no julgamento de processos. Infelizmente, é forçoso reconhecer que a entrada de alguns poucos na carreira da magistratura se dá, assim como ocorre na política e em outras funções públicas, não para a efetivação do interesse público, mas para a promoção de negócios privados, de interesses obscuros.

É evidente que isso não encerra a corrupção no judiciário. Mas aponta para um caminho importante a ser seguido tanto pela legislação quanto pela jurisprudência. Com base em princípios consagrados pela nossa Constituição e, agora, pelo novo Código de Processo Civil, haverá maiores condições de se coibir favorecimento e privilégios, em detrimento do Direito.

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  • Brave

    é senador pelo Psol/AP, bacharel em História e em Direito, mestre em Políticas Públicas (UECE) e Professor de Processo Constitucional do Centro de Ensino Superior do Amapá (CEAP)

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