Organização criminosa

Denúncias da "lava jato" apontam, em 2004, crime que foi tipificado em 2012

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19 de dezembro de 2014, 14h06

Advogados que atuam na chamada operação “lava jato” já têm um trunfo na manga para questionar acusações do Ministério Público Federal. Executivos e outros personagens investigados viraram réus por supostamente integrar uma organização criminosa criada há cerca de dez anos para praticar “delitos no seio e em desfavor da Petrobras”. O problema é que o conceito de organização criminosa somente entrou na legislação brasileira em 2012.

Neste ano, aliás, o Superior Tribunal de Justiça trancou uma Ação Penal por julgar “inviável” reconhecer esse tipo de crime antes das leis 12.694/2012 e 12.850/2013, que colocaram os pingos nos “is”. A primeira norma definiu o delito como a reunião de três ou mais pessoas com o objetivo de conseguir vantagem mediante crimes, enquanto a segunda, mais específica sobre o tema, aumentou o número mínimo de membros para quatro.

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Cinco denúncias oferecidas neste mês à Justiça Federal dizem 301 vezes, somadas, que uma grande “organização criminosa” foi montada na Petrobras para fraudar contratos e desviar dinheiro, sendo formada por três núcleos: dirigentes de empreiteiras como Camargo Corrêa, Mendes Júnior, Queiroz Galvão e OAS; agentes públicos, como o ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa; e operadores, entre eles o doleiro Alberto Youssef (foto).

De acordo com três dessas denúncias, o funcionamento do esquema ocorreu a partir de 2004. Outras duas apontam a origem em 2006. Com exceção dessa divergência temporal, as acusações seguem forma e conteúdo semelhantes, apontando ainda os crimes de corrupção (ativa e passiva), lavagem de dinheiro, formação de cartel e fraude a licitações, entre outros.

“A legislação penal não retroage [contra o réu]”, afirma o criminalista Marcelo Leonardo, que defende Sérgio Cunha Mendes, vice-presidente da Mendes Júnior. Outros dois advogados confirmaram à revista Consultor Jurídico que vão questionar o mesmo ponto: José Luís Oliveira Lima, responsável pela defesa do Grupo Galvão, e Antonio Figueiredo Basto, defensor de Youssef.

Ao aceitar as denúncias, o juiz federal Sergio Fernando Moro afirmou que só depois da instrução será analisado o enquadramento jurídico dos fatos, “com a configuração ou não, por exemplo, de crime de organização criminosa”.

Para o procurador da República Orlando Martello Junior, que atua na força-tarefa da "lava jato", não houve falha. Ele avalia que a tipificação pode ser aplicada a partir de 2012 e, no período anterior, os réus sejam responsabilizados por formação de quadrilha.

Novo entendimento
Ministros do STJ costumavam reconhecer a organização criminosa antes das leis específicas com base na Convenção de Palermo, da qual o Brasil é signatário, mas um precedente foi aberto neste ano com o julgamento do RHC 38.674. Em maio, o advogado Antonio Pitombo disse à ConJur que a nova tese faz sentido. “Se houve uma nova lei para apresentar o conceito, isso significa que no passado não existia”, afirmou ele, que fez trabalho de doutorado sobre o assunto.

“Aquela interpretação do STJ de que a Convenção de Palermo poderia caracterizar o crime no Direito brasileiro era uma ‘ajeitada’, sem pé nem cabeça. Só vira crime no Direito brasileiro aquilo que passa por lei ordinária no Congresso, não por decreto nem por convenção internacional.” Procurado novamente pela reportagem, ele preferiu não se manifestar quando ouviu as palavras “lava jato”. Estava justamente em Curitiba, para integrar o time de criminalistas renomados que passaram a atuar no caso.

Clique para ler as denúncias relacionadas a cada empresa:
Galvão Engenharia
Engevix
Mendes Junior
OAS
Camargo Corrêa/UTC

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